Evento serviu de vitrine dos produtos de origem e certificação brasileira

No último fim de semana de maio (28 a 31), o artesão Enoque Raposo, de 42 anos, pertencente à etnia macuxi, que vive na terra indígena Raposa Serra do Sol, na localidade Normandia em Roraima, levou duas dezenas de panelas de barro para expor numa feira em Gramado, no Rio Grande do Sul, distante 3.500 quilômetros de sua aldeia. O estoque de panelas era um dos 52 itens de agroindústria e de pequenos produtores à venda na mostra gaúcha.
Para seu espanto, no primeiro dia, chegou um empresário local, dono de restaurante, que quis comprar todas. Aí o indígena explicou: “É tudo o que eu trouxe, se eu vender para o senhor não terei mais para mostrar”, respondeu Enoque, quase tiritando do frio de 5 graus, que nunca havia sentido na vida.
O fato dá ideia do sucesso que foi a exposição realizada pelo evento Connection Terroirs do Brasil, que reuniu produtos detentores do selo IG, que significa Indicação Geográfica, destinada a valorizar produtos tradicionais vinculados a determinados territórios.
Não só as panelas do Enoque – a rigor elas têm o protagonismo feminino, uma característica da estrutura social dos Macuxis –, alimentos, como mel, queijo, arroz, banana, biscoito, doces, camarão e bebidas, como café, vinho e cachaça participaram da feira montada na Rua Coberta, conhecido ponto turístico de Gramado, segundo destino do país, que só perde para o Rio de Janeiro.
Predomina o café
Pela terceira vez, o evento é realizado pela Rossi e Zorzanello, empresa de promoção gramadense, com correalização do Sebrae presente desde a primeira edição. Para a CEO da empresa, Marta Rossi, o evento é “a principal vitrine dos produtos de origem no país”. O público visitante pode conversar, experimentar e comprar os produtos participantes, que vieram de todas as regiões brasileiras.

O café é o produto com mais regiões protegidas no Brasil, com 17 territórios reconhecidos nas regiões Sudeste, Nordeste, Norte e Sul, daí também ter garantido presença maciça na mostra Terroirs do Brasil. Quinze cafés de origem foram degustados e alguns participaram de minis cursos de degustação que ocorreram ao longo da feira.
Vinhos não só gaúchos, mas também do Sul de Minas estiveram presentes, além do vinho e espumante catarinenses feitos com a icônica uva Goethe, que só existe lá. Quase lendário, o vinho extremamente aromático e frutado guarda uma história única: Em 1930 chegou ao Palácio do Catete, sede do Governo Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, onde o vinho branco catarinense era servido também no Copacabana Palace e no Jóquei Clube. Em 2012 conquistou o primeiro selo de Indicação de Procedência (IP) do setor vitivinícola fora do Rio Grande do Sul.
Altitude e clima frio na serra catarinense são responsáveis pela excelência da maçã, cultivada a mais de 1.100 metros acima do nível do mar. O cultivar fuji recebeu o selo de IG na região que engloba os municípios de São Joaquim, Bom Jardim da Serra, Urupema, Urubici e Painel. Ainda em Santa Catarina, segundo o produtor João Tozini, Corupá produz “a banana mais doce do mundo”, também graças ao clima frio.
Já a erva-mate, com a qual o gaúcho prepara o chimarrão obteve certificação em Machadinho (RS) e em São Matheus (PR), fez sucesso usada pela primeira vez numa receita dos doces de Pelotas, outra IG do extremo Sul.
Enorme potencial
Graças ao apoio dado pelo Sebrae aos pequenos produtores rurais e artesãos, uma tônica salientada pelos promotores do Connection durante todo o evento, bons negócios foram realizados. “O mais importante não são os números, mas o legado e a possibilidade de contar novas histórias”, celebrou Eduardo Zorzanello, também CEO da empresa.

Além do queijo colonial de Lages (SC), do Serro e da Canastra (MG), afamados e conhecidos em todo o Brasil, a vitrine trouxe açafrão Mara Rosa (GO), único produto do Centro-Oeste, derivados de jabuticaba de Sabará (MG), e rendas artesanais, como filé de Jaguaribe (CE) e renda de agulha em lacê Divina Pastora, de Sergipe. Teve lugar ainda para o camarão de Acaraú (CE), meis e guaraná da Amazônia.
Todos esses produtos estão certificados pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que regula as Identificações Geográficas (IGs). Elas se dividem em Identificação de Procedência (IP), que é o nome geográfico do lugar que se tornou conhecido por ser o centro de fabricação ou extração de determinado produto ou prestação de determinado serviço, e Denominação de Origem (DO). Esta designa produto ou serviço cujas características se devem ao lugar geográfico incluindo fatores naturais e humanos.
Atualmente, existem 134 IGs no Brasil e outras 43 estão depositadas no INPI aguardando análise, afirmou Maria Fontenele Santana, coordenadora do Núcleo de Inovação Territorial do Sebrae. Integrante da equipe responsável por fazer o diagnóstico de possíveis indicações e ajudar produtores e artesãos a obterem o selo, a especialista proclamou: “O Brasil tem potencial para ter mais IGs que toda a Europa, mas ainda estamos na adolescência do processo. Temos muito a amadurecer”, concluiu.

