Coluna Brasília-DF, por Carlos Alexandre de Souza (interino)
O surto verborrágico que acometeu o senador Marcos do Val (Podemos-ES) na madrugada, com direito até ao anúncio de renúncia de mandato, é mais um indício da trama que vinha sendo urdida entre bolsonaristas para contestar o resultado das eleições e ameaçar a democracia brasileira. Pouco importa se o parlamentar mudava a versão a cada entrevista durante o dia de ontem. O fato é um só: apoiadores do ex-presidente, de maior ou menor acesso ao Palácio do Planalto, estavam às voltas com movimentos antidemocráticos.
Seguindo-se o relato de Do Val, o quadro reconstituído em dezembro de 2022 é o seguinte: 1) bolsonaristas falavam abertamente de estratégias para atacar a Justiça Eleitoral, com a participação do chefe do Executivo; 2) O ministro da Justiça do governo Bolsonaro tinha em mãos um documento com teor golpista; 3) Centenas de golpistas estavam acampados no Quartel General do Exército, com a inaceitável benevolência dos militares; 4) O presidente Bolsonaro permanecia em silêncio, dando espaço para todo tipo de especulação e conspiração contra o resultado das urnas em outubro.
O resultado é conhecido de todos. Uma malta de criminosos promoveu o mais grave ataque à democracia brasileira desde a última ditadura militar. Os atos de 8 de janeiro foram a face mais irracional de uma trama que vinha sendo engendrada nos círculos de poder de Brasília.
Que se faça Justiça
Ante esses relatos, torna-se cada vez mais necessário esclarecer a participação de todos os envolvidos em anular a vontade popular expressa nas urnas e o Estado Democrático de Direito. É absolutamente fundamental que a sociedade brasileira tenha conhecimento de quem conspirou contra a Constituição, contra a Justiça Eleitoral, contra a democracia.
Foi ou não foi?
A investigação se faz imprescindível para interromper a troca de acusações. O presidente Lula acusa o antecessor sem meias-palavras. “Eu tenho certeza de que Bolsonaro participou ativamente disso e ainda está tentando participar”, disse o chefe do Planalto, em entrevista à Rede TV. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) respondeu o que se esperava: “Tanto não houve qualquer tentativa de golpe ou crime, que o presidente Bolsonaro deixou a presidência em 31 de dezembro”. A verdade precisa vir à tona.
O senador e ex-vice presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS) expressou claramente como o governo anterior tinha uma visão antagônica da condição indígena. Ao comentar a situação dos ianomâmis, que enfrentam uma tragédia humanitária por causa do garimpo ilegal, o general da reserva sustentou: “É lógico que tem (índio que apoia o garimpo). Você acha que o índio quer viver o resto da vida enfurnado no meio da floresta? Índio quer celular, índio quer caminhonete. Quer conforto, ar-condicionado”, declarou.
Pazuello na mira
A Controladoria-Geral da União (CGU) vai retirar o sigilo do processo administrativo instaurado pelo Exército contra o ministro da Saúde e general Eduardo Pazuello. Em 2021, a Força impôs sigilo de cem anos aos documentos relativos à presença de Pazuello, à época um militar na ativa, em um comício promovido pelo ex-presidente Bolsonaro no Rio de Janeiro. A lei proíbe a participação de militares da ativa em atos políticos.
Viva a cultura
O Supremo Tribunal Federal referendou, ontem, a decisão da ministra Cármen Lúcia de suspender a medida provisória que adiou os repasses para o setor cultural e de eventos, determinados pelas leis Paulo Gustavo, Aldir Blanc 2 e Perse. A matéria foi analisada em plenário virtual e teve uma divergência do ministro André Mendonça, acompanhada pelo ministro Nunes Marques — ambos indicados para a Corte pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Restauração
Inaugurado na última quarta-feira, durante a abertura do ano Judiciário, no Supremo Tribunal Federal, o projeto Pontos de Memória. A iniciativa tem por objetivo registrar para a posteridade toda a violência sofrida pela Suprema Corte em 8 de janeiro. Um dos itens do projeto, em exposição no STF, é o quadro Os Bandeirantes de Ontem e de Hoje, do artista plástico Massanori Uragami. A obra foi restaurada após o ataque golpista.
Glória eterna
O jornalismo perde um ícone, mas o Brasil ganha um legado extraordinário com Glória Maria. O talento, o carisma e o profissionalismo desta repórter única serão um exemplo para gerações de brasileiros, negros ou não. Obrigado, Glória.
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