Porto Alegre — O que mais mudou naquela cidade, desde os meus tempos de estudante, foi a gastronomia. Antigos bairros residenciais como Santana, cuja fileira de casas abrigavam tão somente famílias, ganham novos donos que tocam negócios. Como na rua Venâncio Aires (onde antigamente passava o bonde), que tinha duas mãos — agora as duas pistas são na mesma direção. No número 639, havia uma padaria bem-sucedida até que foi vendida.
Em julho de 2016, o empresário Tiago Leite decidiu investir no local e começou a pensar “o que eu poderia trazer de novo para Porto Alegre?” Daí nasceu a concepção da Leiteria 639, um mix de padaria, confeitaria, restaurante, minimercado com destaque para os produtos coloniais certificados, como queijo, salame e pão de milho. Esse formato ainda não existia na cidade.
Em se tratando de solo gaúcho, carne é uma das melhores coisas que brota. Por isso, o destaque do menu do almoço, servido de terça a sexta-feira, por R$ 25, é o entrecôte com batata baby sauté, arroz e feijão. Outras opções são um parmegiana de frango, polenta frita com ervas e parmesão, legumes assados e arroz; carreteiro de carne e linguiça com ovo, acompanhado de minissalada caesar; e peito de frango ao molho de vinho tinto com penne caprese. Ainda há uma carne de panela desfiada servida com talharim e parmesão ralado.
Além do menu executivo, que varia toda a semana, há um cardápio fixo no qual sobressai o assado de tiras (R$ 69) acompanhado de mandioca frita (aipim no sul) ou polenta com parmesão e ervas, pimentões vermelho e amarelo, cogumelo paris, cebola roxa assada, pães torrados e chimichurri da casa.
No jantar, o carro-chefe são os assados, como prime rib e picanha (ambos por R$ 85 servem duas pessoas). Provavelmente quando o leitor for lá, já vai encontrar um cardápio renovado que Tiago está elaborando. O serviço começa pela manhã com bule de café passado e de leite com refil. Funciona de terça a domingo, das 9h às 21h. Telefone: (51) 3279-0759.
Antiga barbearia
Outro point imperdível fica no Centro Histórico, na Rua Jerônimo Coelho 188, onde por muitos anos funcionou uma barbearia. O dono era farmacêutico e, por quatro anos, juntou os dois negócios. Depois de cursar gastronomia na Unisinos, Marcelo Schambeck, filho do farmacêutico, ocupou o espaço transformando-o num bistrô, que funciona há 11 anos como Del Barbiere.
Um dos nomes mais importantes de gastronomia gaúcha, Schambeck procura sempre valorizar o que é regional, orgânico e produzido perto. Aconchegante, com pinta de restaurante francês, a casa também serve café da manhã com torradas de queijo, presunto e ovo.
Mas é no almoço que o chef exibe toda criatividade em pratos lindos, que vigoram por apenas um mês. O cardápio da semana pode ser conferido em quadros negros presos na parede. No dia que estive lá, numa sexta-feira, serviram brusqueta de tomate confitado, berinjela defumada e creme de ricota e agrião bem molhada no azeite; peixe galo grelhado, feijões, farofa, purê de cenoura numa deliciosa combinação da leguminosa com o pescado hidratado por vinagrete de feijões.
De sobremesa, brigadeiro de cacau com calda de caqui, castanha-de-caju e crumble. De terça a sexta, o almoço sai por R$ 55, mas “no sábado, sirvo um menu de feira com
couvert, duas entradas, principal e sobremesa por R$ 106”, informa o chef. Telefone: (51) 3019-4202.
Casado com a jornalista Flavia Mu, Marcelo administra um site identidaders.com.br que pesquisa a história e origem dos produtos. Os avós de Flávia, que vieram da China, foram donos do Lokun, primeiro restaurante chinês da cidade, que funcionava na rua Venâncio Aires.
Sim, nós temos cogumelos!
São Francisco de Paula — Não é mais novidade para ninguém que o Brasil tem cogumelos. Já se encontrou na Amazônia e agora, começa-se a colher tanto na Serra Gaúcha como na Serra Catarinense. Outono é o tempo ideal que eles surgem, de preferência depois das chuvas. O tipo mais comum são os cogumelos silvestres porcini, os mais apreciados na França e na Itália, que crescem aos pés da araucária, árvore símbolo da região Sul.
A busca pelos cogumelos silvestres foi um dos destaques do Food Safari Sul, expedição de gastronomia realizada semana passada na Serra Gaúcha, sob a liderança do chef sul matogrossense Paulo Machado, que desde 2015 promove programas desse tipo no Brasil e no exterior. Ele já levou grupos ao Peru e à Espanha, região da Catalunha e o próximo será à Paraíba, entre os dias 13 e 17 de junho.
A caça ao porcino foi conduzida por dois especialistas: Marcelo Sulzbacher, da Universidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e o pesquisador esloveno Tine Grebenc, que também se especializou em trufas e diz que naquela região elas existem. Andando sobre os gravetos que cobrem o solo do bosque de araucárias, ninguém imagina que debaixo há uma preciosidade capaz de encantar o paladar.
Cozinha rústica
Com a cesta que não chegou a se encher, o grupo voltou à base para processar o achado. Além do chef Paulo Machado, dono de um instituto de pesquisa que leva o seu nome, meteu a mão na massa outro chef, o gaúcho Fabricio Goulart, que recentemente participou da quarta temporada do The Taste Brasil, do GNT. Fabricio, que já fez estágio no D.O.M., de Alex Atala, também é pesquisador gastronômico e se tornou o idealizador de um molho à base de banana na startup Feitosa Gourmet.
A base do grupo foi o histórico Parador Hampel, fundado por alemães em 1899, em São Francisco de Paula, com o nome de Veraneio Hampel, que teve outros donos até vir parar nas mãos de um filho da terra: o chef gaúcho Marcos Livi. Dono de sete casas de sucesso em São Paulo — Quintana, Veríssimo, Botica, pizzaria Napoli Centrale, Hamburgueria C6 (esses dois em parceria com Gil Guimarães), o box Bioma Pampa e a deli Officina — Livi deu início a um projeto de revitalização da hospedaria e de integração do meio ambiente.
Os resultados já podem ser vistos durante a atração dominical chamada A ferro e fogo, marca registrada, em que o chef apresenta com materiais simples como a grelha, o espeto, a panela de ferro, a lenha e o carvão um resgate da rústica cozinha do sul. Passam pelas trempes caldinho de moranga cabotiã, choripan (linguiça artesanal, chimichurri, tomate, cebola, cheiro verde servidos numa baguete caseira), costelão bovino e leitão, assados lentamente na lenha por oito horas, cordeiro orgânico e galeto al primo canto, além de saladas e acompanhamentos como arroz carreteiro e feijão campeiro, um deleite para o gosto. Tudo por R$ 80.
A diária do parador varia entre R$ 200 e R$ 500, de acordo com a temporada e as instalações. Confira no site www.paradorhampel.com ou na reserva: (54) 3244-1363.