A principal dúvida que paira sobre a reforma da Previdência não é quanto ao conteúdo da proposta — ninguém discute que é preciso estabelecer uma idade mínima para aposentadoria e que não é uma boa ideia tocar em pontos sensíveis, como endurecer acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e à aposentadoria rural. O que falta decidir é se o novo governo vai ressuscitar a reforma proposta em 2016 por Michel Temer, que já passou pelas comissões e está pronta para ser votada no plenário, ou se vai apresentar um texto novo. A primeira, que já foi bastante desidratada, ainda pode ser adaptada por emendas e ir direto para votação na Câmara.
Retomar o texto que já está no Congresso garantiria mais rapidez ao processo de reforma, mas parte da equipe econômica resiste. Um dos motivos é que essa ala do novo governo quer uma proposta própria, assinada por Jair Bolsonaro e que não seja associada a Temer. Além disso, ficaria estranho retomar um projeto que foi duramente atacado por boa parte do núcleo político da futura administração, inclusive pelo próprio presidente eleito, que disse que a PEC atual “mataria idosos”. O futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o senador Major Olímpio (PSL-SP), braço direito de Bolsonaro, também fizeram duras críticas durante a tramitação da proposta.
“É masoquismo” apresentar uma nova reforma, acredita o deputado Arthur Maia (DEM-BA), relator da PEC de Temer na Câmara. Ele acredita que, ao final, qualquer proposta vai chegar aos pontos que foram apresentados no parecer dele, no ano passado, sendo os principais a idade mínima, o sistema de transição e a equiparação de regras entre iniciativa privada e serviço público. “Não faz nenhum sentido refazer, e seria extremamente desgastante. A reforma que vai passar pelo Congresso vai ser muito parecida, se não for igual. Não tem como fugir desses pontos”, argumenta o deputado reeleito.
Seis meses. Esse é o atraso médio na tramitação, previsto por analistas, para que uma nova PEC da Previdência chegue ao estágio em que a de Temer está agora, pronta para ser votada no plenário da Câmara. Caso comece do zero, precisará passar novamente pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que só deve ter a composição formada depois do carnaval, e pela comissão especial. Em outras palavras, não passaria nem da primeira fase antes de março.
Outra ideia que foi ventilada por Bolsonaro, de dividir a reforma da Previdência em duas, tem sido rechaçada por boa parte dos parlamentares e até por pessoas do grupo de trabalho que trata do assunto na equipe de transição. O entendimento geral é de que seria muito difícil retomar o tema depois de passar a primeira proposta. “Já é difícil aprovar uma, imagina duas”, avalia uma fonte próxima ao presidente eleito. Cientistas políticos dizem que o capital político se esgotaria depois da primeira votação. “É melhor fazer um texto passável e votar de uma vez”, defende a mesma fonte.
O ponto positivo até agora, na avaliação de pessoas próximas ao presidente eleito, foi a escolha do próximo secretário de Previdência, Rogério Marinho. Ainda deputado pelo PSDB do Rio Grande do Norte, embora não reeleito, ele tem sido bastante elogiado nos bastidores. A expectativa é de que ele assuma a liderança do processo a partir de agora, como “porta-voz oficial” da reforma. “Ele tem uma capacidade de interlocução muito boa. Terá a mesma paixão e os mesmos resultados que teve ao relatar a reforma trabalhista”, acredita o senador eleito Major Olímpio (PSL-SP).
Embora parlamentares tenham o costume de querer se descolar da imagem de Temer, o Congresso é ainda menos popular que o presidente. Uma pesquisa da XP Investimentos com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), feita em novembro, mostra que o movimento #ficatemer rendeu frutos. Enquanto 64% dos entrevistados consideram o governo atual ruim ou péssimo, 65% têm a mesma avaliação sobre o desempenho do Congresso. Além disso, 8% avaliam o governo Temer como ótimo ou bom, enquanto só 5% disseram o mesmo da atuação dos deputados e senadores.
Causou estranhamento entre pessoas que acompanham o Senado a rapidez na recondução de Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), na semana passada. Ele é considerado “braço direito” do senador Renan Calheiros (MDB-AL). O mandato dele venceria daqui a nove meses, mas os senadores correram para aprovar a recondução na CCJ e no plenário na mesma semana. A pressa, dizem, foi para não correr o risco de ele não ser reconduzido no próximo governo.
Antes do desconvite a Cuba e a Venezuela para a cerimônia de posse presidencial, o futuro chanceler, Ernesto Araújo, já era visto com receio por diplomatas em Brasília. Eles acham que Araújo não demonstra ter autoridade sobre a área nem protagonismo nas decisões. Segundo alguns, o futuro ministro parece mais um assessor do presidente eleito do que um ministro de fato.
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