Mediúnica com Darcy Ribeiro

Publicado em Crônicas
Furo: neste momento assolado por debates e mentiras tão escancaradas, esta coluna conseguiu uma entrevista mediúnica exclusiva com Darcy Ribeiro, defensor das crianças, dos índios, dos negros e da educação. Fala, mestre!
Por que existem tantos jovens pobres fora da escola?
A escola trata o menino popular como se fosse de classe média. Ela dá exercício para fazer em casa. Supõe que em casa tem alguém que estudou. É uma escola organizada para o jovem pobre fracassar. A educação precisa ser em tempo integral. E os professores precisam trabalhar o dia inteiro e ganhar o dobro.
Alguns criticaram os Cieps, as escolas que o senhor criou, sob o argumento de que eram muito caras. O que o senhor teria a dizer?
No mundo só há Cieps, os imbecis não sabem. A escola de um turno é uma perversão brasileira. Em nenhum lugar do mundo a criança está abandonada. Por quê? Porque cada criança tem uma escola onde ela passa o dia inteiro. Ela vai às sete, oito da manhã, e sai de tarde. Então, não há criança abandonada. O Brasil, um dia, tem de fazer isso.
Quais as consequências de uma escola de um turno?
É uma necessidade, sobretudo, nos grandes centros metropolitanos. Enquanto São Paulo não puser todas as crianças numa escola em que elas passem o dia inteiro e que alguém estude com elas, é claro que vai estar cheio de meninos se matando  uns aos outros, sendo mortos, caindo na droga e na criminalidade.
Por que o Brasil é tão bárbaro com as crianças?
O Brasil parece detestar as suas crianças. A única explicação que eu encontrei até hoje é a seguinte: o Brasil é o último país do mundo que acabou com a escravidão. A escravidão condena o negro a lutar pela sua liberdade. Mas condena o dono a ser bandido, a arrebentar o escravo com o chicote para tirar dele o lucro que ele pode dar.
Qual a sua opinião sobre uma escola sem política?
Política é a atividade humana fundamental. É aquilo que move o destino humano. É aquilo que define o que vai acontecer nas comunidades. É vitalmente importante.
Então, o senhor acha que os jovens devem participar da política?
Aquilo de que o Brasil mais necessita, hoje, é de uma juventude iracunda, que se encha de indignação contra tanta dor e tanta miséria. Uma juventude que não abdique de sua missão política de cidadãos responsáveis pelo destino do Brasil.
O Brasil tem, atualmente, mais de 800 mil presos e um deficit de 240 mil vagas no sistema prisional. Que relação o senhor estabelece entra a educação ou a falta de educação e o sistema prisional?
Em 1982, eu disse: se os governantes não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir presídios. Um preso custa ao estado 13 vezes mais que um estudante. Só vamos acabar com a violência quando resolvermos a questão da educação.
Por que os políticos falam tanto em educação e nada muda?
As elites brasileiras são cruéis, elas asfixiam as massas mantendo-as na escuridão da ignorância. As escolas não cumprem com o papel de preparar  os meninos do Brasil. A crise da educação no Brasil não é uma crise: é um projeto.

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