Só a educação pode salvar o país da corrupção

Publicado em ÍNTEGRA

VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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         Sempre se ouvia do filósofo de Mondubim: “Ladrão de tostão é também ladrão de milhão”, ou “Ladrão endinheirado não morre enforcado”. Em homilia famosa, intitulada “Sermão do Bom Ladrão”, Padre Antônio Vieira já alertava, no século XVII, para esse problema que, de alguma forma, encontraria, no Brasil Colônia, um paraíso para seu pleno desenvolvimento: “os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com mancha, já com forças roubam cidades e reinos: os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor nem perigo: os outros se furtam, são enforcados, estes furtam e enforcam.”

         Foi a partir do estabelecimento do marco civilizatório por essas bandas, em pleno período colonial, que a miscigenação das raças e etnias, necessárias para o processo de colonização dessas vastas porções de terras no novo mundo, associadas a um tipo específico de exploração intensa das riquezas, feitas por mãos escravas, num tempo em que leis e direitos só beneficiavam as classes dominantes, que a corrupção encontrou terreno fértil para prosperar.

         Da formação original do Brasil até o nosso tempo, não há período algum onde essa praga não tenha fincado suas unhas. Acreditem: há mais de cinco séculos, essa terra tem sido saqueada sem descanso. Espantoso é notar que o país tenha sobrevivido a essa rapinagem sistemática por tanto tempo, e mesmo no século XXI, quando veio à tona o maior e mais volumoso caso de corrupção de todos os tempos, ainda se avistam, pelas classes políticas, mais e mais recursos públicos que podem ser saqueados sem cerimônia, sob o olhar complacente dos tribunais.

          A solução para esse mal histórico poderia encontrar alguma saída mais segura e duradoura através de um processo intenso de educação de qualidade para todos. Haveria alguma relação visível entre o modelo de educação pública seguido pelo Brasil nos últimos tempos e o alto grau de comprometimento das grandes empresas nacionais em práticas de corrupção, mostrado pelas investigações correntes do tipo Lava Jato?

         Se, à primeira vista, estas questões parecem dissociadas umas das outras, observadas mais de perto, o que se verifica, contudo, é que, na origem dos modelos do comportamento reprováveis seguidos pelas empresas e por  suas lideranças, acham-se enraizados, também, posturas e arquétipos herdados lá trás, ainda nos primeiros anos de escola. Não que o modelo de educação tenha contribuído, de forma ativa para formar cidadãos insensíveis às boas práticas. Mas o modelo de educação, seguido em nossas escolas, de alguma forma tem sido, para usar uma expressão corrente, leniente nos assuntos relativos à formação ética, deixados de lado e suplantados por outros aspectos de natureza mais informativos.

         Em outras palavras, nossas escolas têm dado relevo e ênfase apenas aos conteúdos, relacionados na grade curricular, relegando, a segundíssimo plano, a parte formativa relacionada diretamente ao comportamento humano e baseado nos princípios da ética e das boas práticas. Ensinam matemática, mas fecham os olhos para os deslizes de comportamento dos alunos no dia a dia, e ainda acabam por estimular estas más condutas, ao não exercerem, de fato, a autoridade e a disciplina, assuntos que, nos dias correntes, transforam-se em verdadeiros tabus. A falsa crença de que liberdade sem limites serve aos propósitos de uma escola moderna, tem mostrado seus resultados. O crepúsculo paulatino da autoridade do professor, como indutor principal do processo educativo, acabou por ceder lugar a um modelo de escola onde os alunos passaram a ser considerados soberanos e únicos atores de seus destinos. A partir desse ponto, já se prenunciavam tempos difíceis à frente. As revelações trazidas à tona pela sequência de  investigações da polícia e do Ministério Público e, posteriormente, a implementação com a  Lei Anticorrupção de 2014, estão forçando agora as empresas brasileiras a se ajustarem a um novo tempo, onde a  transparência e as boas práticas, não só nas relações humanas, mas inclusive com o próprio meio ambiente, são elementos fundamentais para se manterem vivas no mercado.

         Essa adoção tardia do modelo de Compliance nas empresas, obrigando-as a agir em conformidade com as normas da ética e da transparência, reflete o descaso com que nosso sistema de educação e ensino tem tratado do assunto. É possível que o corrupto de hoje, flagrado e algemado pelas autoridades, exposto a humilhação pública, tenha sido outrora um bom aluno em matemática ou biologia. Mas é quase impossível que tenha sido educado para respeitar o próximo e o que pertence a cada um. O que operações como a Lava Jato demonstraram na prática é que nossas elites dirigentes, e todos aqueles que se vêm hoje implicados em rumorosos casos de corrupção, podem ter frequentado escolas de ponta, mas não aprenderam nada, não esqueceram nada.

         Mesmo que se acredite que a formação histórica e atípica do Brasil tenha favorecido a germinação das sementes da corrupção, o fato é que, ao longo de sua evolução, jamais houve um esforço sincero, vindo de cima da pirâmide social, capaz de colaborar para o fim dessa prática.

A frase que foi pronunciada:

“Nenhuma das principais questões que a humanidade enfrenta será resolvida sem acesso à informação.”

Christophe Deloire

Christophe Deloire. Foto: Damien Grenon / behance.net

 

História de Brasília

Como novas escolas não foram construidas, e como a necessidade de maior número de maior número de classes é evidente, as autoridades cegaram à conclusão de que o melhor aproveitamento de salas e de professôres seria solução. (Publicada em 13.03.1962)

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