Coluna no Correio: Alta ansiedade

Publicado em Economia

Ainda não será a notícia dos sonhos, mas o governo poderá respirar aliviado com a inflação de agosto que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga hoje. Se as contas dos analistas estiverem corretas, a alta do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficará em torno de 0,43%, mostrando um novo ciclo de refresco da carestia. Em julho, o indicador deu um susto, cravando elevação de 0,54%, puxado, sobretudo, pelos alimentos, que, agora, perdem força. É possível que, em setembro, a taxa fique entre 0,20% e 0,25%, pavimentando definitivamente o espaço para que o Banco Central possa cortar a taxa básica de juros (Selic), de 14,25%.

 

Tudo o que o presidente Michel Temer precisa neste momento é de boas notícias na economia. É com a melhora nas condições de vida da população que ele pretende combater as vaias que tanto o têm incomodado. Os analistas acreditam, porém, que o peemedebista terá que esperar um bom período para que a rejeição a ele diminua. Talvez isso só aconteça em 2018, quando, ao que tudo indica, haverá uma combinação de retomada do crescimento econômico, alívio no desemprego, inflação abaixo do centro da meta, de 4,5%, e juros menores. São condições necessárias para que as famílias possam ver melhora no seu dia a dia.

 

No Palácio do Planalto, porém, a pressa é grande. “Sabemos que ainda é cedo para falar em alívio. A situação da economia continua muito difícil e levará tempo para que a crise seja deixada de vez para trás”, diz um assessor de Temer. “Mas, de notícia em notícia boa, daqui a pouco teremos um conjunto de coisas favoráveis para mostrar”, acrescenta. A urgência se torna maior porque o governo já se deu conta de que as medidas de ajuste fiscal que dependem do Congresso tendem a andar mais devagar que o desejado. “Esse atraso terá que ser compensado de alguma forma. Que seja com inflação mais baixa e, se possível, com queda dos juros”, assinala.

 

Certeza do Planalto

 

O Planalto já está convencido de que o BC cortará a Selic ainda neste ano. A torcida é para que a taxa caia em outubro. Mas a certeza é de que o movimento de baixa começará em novembro, quando a autoridade monetária terá números mais precisos da inflação e poderá identificar até onde andou a votação de medidas do ajuste fiscal, em especial, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à inflação do ano anterior. “Nas avaliações internas que temos feito, acreditamos que, para o BC, é importante que as projeções de inflação para 2017 estejam bem próximas de 4,5% e que pelo menos a PEC dos gastos tenha passado pela Câmara dos Deputados”, afirma um ministro muito próximo de Temer.

 

O governo reconhece, porém, que, no cenário traçado até agora, de ligeira melhora da economia, não pode haver imprevistos na economia. O problema, destaca um auxiliar do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, é que entrou no radar a Operação Greenfield, que investiga corrupção nos quatro maiores fundos de pensão de estatais, a Funcef, a Previ, a Petros e o Postalis. Essas fundações têm, por tradição, investirem pesado em projetos de infraestrutura. Mas como foram obrigadas a paralisarem todas as atividades por precaução, podem ficar ausentes da primeira fase do programa de privatização e de concessões que o Planalto quer lançar na próxima semana.

 

“Ainda estamos analisando qual o real tamanho da Operação Greenfield. Sabemos que não é um negócio pequeno. Muito pelo contrário. Pega os maiores investidores do país e grandes empresas. Isso pode dar um baque na economia se a aversão ao risco aumentar muito”, frisa o ministro. Ele prefere, no entanto, acreditar que o impacto da corrupção nos fundos de pensão será restrito. “Tudo, porém, é mais torcida do que certeza”, complementa. O maior temor do Planalto é que a Greenfield se entrelace com a Lava-Jato e se transforme em um mostro que ninguém sabe onde vai parar.

 

Inteligência emocional

 

Economista-chefe da A2A INVX Partners, Eduardo Velho diz que o governo deve se concentrar em levar o ajuste fiscal adiante. É a certeza de que as medidas para a arrumação das contas públicas estão andando que garantirá o apoio dos agentes econômicos. Ele ressalta que as condições para que Temer possa respirar com maior facilidade estão dadas. A inflação vai perder força, os juros cairão e o quarto trimestre do ano mostrará que a recessão ficou para trás. “Esse quadro está praticamente dado. Mas pode ficar melhor se as medidas do ajuste avançarem no Congresso”, afirma.

 

Velho ressalta ainda que o governo não pode abrir brechas para dúvidas ou estimular ruídos em relação aos rumos da economia. Quanto menos a política interferir na atividade produtiva, melhor. O duro é segurar auxiliares de Temer que gostam de jogar lenha na fogueira, na maior parte do tempo, por pura vaidade. Paciência, na atual conjuntura, a vital. É sinal de inteligência emocional, algo raro nos dias de hoje.

 

Brasília, 05h10min