O mistério do tai chi

Publicado em Crônicas

 

Severino Francisco

 

Enquanto o mundo explode, continuo a fazer tai chi chuan há mais de 30 anos. Volto a falar no tema, pois sempre tenho a esperança de sensibilizar e de ajudar alguma pessoa. O tai chi me salvou de mim mesmo. Sempre quis acessar alguma forma de energia limpa, saudável, não destrutiva e não poluente.

 

As drogas produzem um êxtase artificial momentâneo, mas devastam o corpo, a mente e o espírito. Droga não dá luz a ninguém, dizia Glauber Rocha. Reza a sabedoria oriental que, quando você quer mesmo aprender alguma coisa, o mestre aparece.

 

E, de fato, o mestre surgiu, para mim, na forma de uma mineira baixinha, delicada, leve e bem-humorada: Tânia Carmo. Ela me iniciou no tai chi, arte marcial e terapia milenar que pratico, religiosamente ou marcialmente, há exatos 30 anos.

 

Certa vez, fui pautado para fazer uma entrevista com a mestre e pedi a ela que ilustrasse os efeitos benéficos do tai chi com um caso. Ela contou que havia um sujeito neurótico, desconectado, tenso, que se irritava com ninharias e tinha o corpo duro feito um cabide.

 

E que, depois de praticar o tai chi ninguém mais o reconhecia, pois se tornara mais leve, maleável, concentrado e pragmático. Curioso, perguntei quem era: “É você”, ela respondeu, apontando para mim. E eu copiando tudo, penosamente, com os meus garranchos, feito um palhaço.

 

Nada a ver com milagres. A prática do tai chi melhora a respiração, ativa a circulação e oxigena as células. Muda tudo. A arte de respirar é um dos segredos para uma vida saudável. Claro que o ânimo para enfrentar as guerras cotidianas melhora.

 

Algumas vezes me deparo com problemas que me parecem monstros imbatíveis. Faço o tai chi e eles tomam a verdadeira proporção. A mente fica mais clara, ágil e inspirada para tomar a decisão mais lúcida.

 

Uma colega tinha um verdadeiro pavor de ficar presa em um elevador. No entanto, logo depois de iniciada no tai chi,  se viu precisamente impedida de sair de uma dessas perigosas geringonças, que resolveu enguiçar quando ela descia do prédio com mais três pessoas. E, para sua surpresa, ela suportou o tempo de espera por socorro com uma insuspeitada tranquilidade.

 

O tai chi proporciona a síntese, aparentemente impossível, entre a serenidade e a flama. Você controla a sua energia, briga realmente quando quer e não por mero descontrole. Fazer tai chi é tomar um banho de energia e jogar para o espaço tudo que houver de ruim. É uma prática que deveria ser ensinada em todas as escolas. O mestre Woo faz tai chi ao livre na Asa Norte e formou uma legião de discípulos.

 

Estava fazendo as minhas evoluções marciais ou talvez marcianas no sítio do meu sogro, quando percebi que alguém me observava. Era o caseiro. Ele achou que eu era lutador de kung fu. Ficou tão impressionado com os movimentos que comentou com meu cunhado: “Aquele cara deve ser bom de pancada e, numa briga, para derrubar, só com um três-oitão.”

 

Em outra ocasião, um garoto atilado e bem-humorado, de 6 anos, amigo do meu filho, ficou assistindo a meu exercício matinal, atentamente, e, de repente, levantou o dedo para fazer um comentário. Eu disse que não podia me interromper, pois estava concentrado, e ele fez a seguinte observação: “Tio, eu só queria te avisar que os caras com quem você estava brigando já foram embora.”

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