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Taras à mesa

Publicado em Crônica

Não se faz um bom enredo sem sexo. E nessa confusão de escrever um romance brasileiro pelo twitter, onde sobram intrigas, ódios, tentativas de assassinato e diferenças, agora tem sexo – ainda que torto – para dar o tempero final. Vamos ver aonde isso vai nos levar, se é que vamos a algum lugar.

Daí, o Brasil passou a discutir indecências, se é que ainda podemos usar o substantivo para alguma coisa. Não estamos sós: no mesmo período, os norte-americanos acompanharam mais um drama da família Kardashian, especializada em escândalos, com cenas de traição e… sexo. Famílias são sempre uma complicação.

Entre banhos dourados e escatologias que a gente pouco ouvia falar – e se ouvia não acreditava que era para valer – o país, em pleno carnaval, deu para discutir taras. E como sexo é assunto popular, no botequim todos tinham alguma contribuição a partir de ouvir uma frase de Aldoux Huxley – “a castidade é a mais anormal das perversões sexuais”.

O escritor britânico – famoso pelo livro Admirável Mundo Novo – não devia estar por dentro das chamadas parafilias, que são desejos sexuais provocados por, digamos, excentricidades. Eu próprio, ex-coroinha na capela do colégio Cristo Redentor, nunca tinha ouvido falar do assunto; mas havia um psiquiatra à mesa. Ou ex, porque já se aposentou – mas não perdeu a mania de ficar olhando a gente de um jeito esquisito.

Algumas dessas parafilias nem são tão inusitadas assim, caso da aerodromofilia, que é o desejo de transar num avião e era o caso da Emanuelle Arsan, personagem literária que a holandesa Sylvia Kristel interpretou no cinema (depois da menos conhecida (Erika Blanc). A tomada do avião era uma das mais inocentes do filme, que também ficou famoso pela cena de pompoarismo, em que uma dançarina fuma um cigarrinho de modo inusitado.

Há ainda o desejo de fazer sexo em público (agorafilia), mixoscopia (que é mais para quem prefere ver do que fazer) e a erotolalia, que é a excitação de falar sem-vegonhices ao telefone. Mas o doutor nos revelou também que há pessoas que só chegam ao orgasmo quando veem o parceiro chorar, de preferência de tristeza, o que leva o nome de draclagnia, e os agalmatofílicos, que pedem para o parceiro não se mexer, como se estivessem namorando uma estátua.

Segundo o nosso psiquiatra de botequim, não há como contar o número de taras à disposição da mente humana. Há quem precise do estímulo das picadas de uma agulha (belonofilia), os flatofílicos, que são chegados num cheirinho de pum, outros que não podem ir a uma festinha e dão vexame só de espiar um balão cheio e colorido; e os praticantes de ballbusting, que têm prazer de ter os testículos chutados pela parceira. Com força.

Frazão escutava tudo com a atenção que não teve na escola, abandonada cedo, enquanto tomava uma cerveja na mesa ao lado. Mas depois de ouvir tanto nome difícil acompanhado de detalhes que ele nunca imaginou, se sentiu no direito de perguntar:

– Doutor, tem nome para quem só gosta de mulher?

Publicado no Correio Braziliense, em 15 de março de 2019