Publicado em 13/2/2015 no Correio
Anexo IV da Câmara dos Deputados. Nono andar. No gabinete nº 939, está o homem que se programou para suceder Ricardo Teixeira na presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), mas substituiu o sonho por um mandato legislativo no partido dos companheiros Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva. De terno cinza, camisa branca, gravata e sapato social preto, Andrés Navarro Sanchez surge sentado atrás da mesa. Acaba de fumar. Enquanto esmaga o último toco no cinzeiro, o paulista de Limeira, ex-presidente do Corinthians e dono de 169.834 votos pondera: “Não bebo cerveja, só uísque, mas isso aqui é um maço e meio por dia. Tenho que parar, cheguei aos 50 anos”.
Empossado no último dia 1º, o novo morador da capital está em Brasília de segunda a quinta-feira para inflamar a bancada da bola. O principal alvo do mandato de quatro anos tem nome: Marco Polo Del Nero. “Não sou de briga, sou de conversa, de diálogo. Mas, no que depender de mim, não passa nada dele aqui”, diz o mais novo aliado de outro inimigo declarado do presidente eleito da CBF. “Eu encontro sempre com o Romário (senador). Temos uma amizade muito grande”, conta.
Andrés Sanchez vive um período de aprendizado. Aplicado, estima que em, no máximo, 90 dias dominará a rotina de um deputado. Fôlderes e apostilas não faltam. Telefones, também não. O fixo toca durante a entrevista. Do outro lado da linha, está um amigo chamado carinhosamente de “Robertinho”. Provavelmente, Roberto de Andrade, recém-eleito presidente do Corinthians. Em uma demonstração de que ainda é o homem de ferro do clube, pede a reserva de dois ingressos. Serão destinados ao vice-presidente de um banco. Na tarde da última quarta-feira, o Corinthians anunciou a renovação do contrato de patrocínio máster com uma instituição financeira no valor de R$ 30 milhões. Vai saber…
Aparentemente feliz com a nova rotina, Andrés jura que não deixa o Congresso em troca de cargo no governo. “Fui eleito para ser deputado federal e vou ficar aqui até o fim do mandato, nem que seja sangrando”, promete. Uma das primeiras batalhas pessoais é a aprovação do refinanciamento das dívidas dos clubes de futebol. Afinado com a presidente Dilma e com o Ministério do Esporte, exige contrapartida. “Quem não cumprir o que for definido tem que cair para a segunda divisão.”
Pontual, Andrés Sanchez deixa o gabinete em direção ao plenário. Pega uma bolsa de couro e pede autorização via interfone para descer pelo elevador privativo. Na saída do Anexo IV, a primeira prova de popularidade. Enquanto abre a porta do carro para um cliente, um taxista — provavelmente corintiano — fica hipnotizado. No trajeto para o encontro com a liderança do PT, pedidos de fotos e autógrafos. “Hoje, até que está tranquilo. Quando cheguei, eram uns 50 pedidos por dia”, conta. Com a mesma marra dos tempos de cartola, ele sente orgulho da fama. “Qual presidente de clube do futebol tira foto com torcedor?”, diz.
1. Renegociação das dívidas dos clubes
Esse país é hipócrita. Tem Programa de Recuperação Fiscal para todo mundo. Montadora, banco, empresário, bilionário… A cada dois anos, sai um Refis. Por que, quando o assunto é futebol, é essa confusão? O futebol tem que ter também, mas com punição técnica. Entra no Refis. Se, no fim do ano, não mostrar a CND, tem que cair de divisão. Tem que ter contrapartida, até para que o problema não se repita daqui a dois, três anos.
2. Marco Polo Del NeroA minha expectativa em relação a ele como presidente da CBF é péssima. Basta ver o que é a Federação Paulista de Futebol para saber o que vai ser a CBF. Muita gente vai sentir saudade do Ricardo Teixeira.
3. DungaEle não deveria nem ter saído da Seleção. Eu queria muito que tivesse ficado no cargo depois da Copa de 2010, quando eu era o diretor de seleções. Mas o presidente Ricardo Teixeira preferiu demiti-lo.
4. Saída da CBF
O presidente e o vice-presidente têm o direito de colocar e tirar quem eles quiserem, só precisam tratar as pessoas como seres humanos, profissionais. Contrataram o Felipão, em setembro (de 2012), sem comunicar a mim e muito menos ao Mano Menezes. Ele se sentiu traído e saiu, foi mandado embora. Como contrataram um treinador sem eu saber, eu também pulei fora.
5. Violência no futebol
Quantas pessoas morreram, no mesmo fim de semana do clássico entre Palmeiras e Corinthians, por causa de assalto, de atropelamento? A violência no país está em todos os segmentos da sociedade. Acontece que o futebol tem mídia, tem tudo.
6. Naming rights da Arena CorinthiansNem o meu filho sabe, mas uma hora vamos fechar. Conversei com quatro empresas. Agora é a hora do sim ou não. É um negócio novo no Brasil, não temos a cultura de batizar arena. Isso acontece há décadas na Europa.
7. Roberto de Andrade
Aposto todas as minhas fichas no novo presidente do Corinthians. Eu tenho certeza de que ele vai dar uma grande guinada no Corinthians, vai colocar o clube em um patamar que não deveria ter saído mais. É óbvio que temos altos e baixos. Mas o Roberto de Andrade é um administrador, foi meu vice durante três anos.
8. Ódios no futebol
Em primeiro lugar, detesto a imprensa. Vocês não veem o trabalho, só enxergam resultado. A imprensa nunca erra, sempre está certa. Quando vai falar em contratação, fala em seis, sete nomes de jogadores. Como é que não vai acertar? Em segundo lugar, coloco a arbitragem. Está terrível. Em terceiro, as federações e as confederações. Querem mandar demais. Além disso, o Ministério Público, a polícia, o Judiciário. Eles se metem demais no futebol sem saber o que é futebol. E, por último, os próprios jogadores. Eles são terríveis.