De Quantas Despedidas Somos Feitas?

Publicado em cuidado, Sem categoria

Ana Castro & Cosette Castro

Brasília – Ainda estamos comemorando o lançamento do “Guia de Ações e Serviços Públicos para Pessoas Idosas com Demências e para Cuidadoras” que ocorreu na quinta-feira, 20, na Capital Federal, no IPE-DF.

O Guia, que é o primeiro do gênero no Brasil, está disponível  online (link aqui).  Ele mostra os serviços públicos disponíveis no Distrito Federal em diferentes instituições. E aponta para a urgência da implementação da Lei 6926/2021, que dispõe sobre a política distrital para tratamento das pessoas com Alzheimer, entre outras demências e para prevenção de saúde para cuidadoras e demais familiares.

O Guia de Ações e Serviços também desnuda o quanto falta e o quanto precisamos avançar para construir uma Sociedade do Cuidado. Uma sociedade onde o Estado seja co-responsável pelo cuidado e pare de sobrecarregar física e emocionalmente as mulheres.

Pensando no tema, hoje Cosette Castro traz a análise do filme “As Horas Contigo”, um filme sobre cuidado e sobre despedidas.

Cosette Castro – “Assisti o filme “As Horas Contigo” no domingo, 16, a noite. Uma indicação da Ana  Castro. O filme, disponível no Netflix,  esperava há dois dias para  ser  visto e saber se realmente valia a pena escrever a respeito.

Logo de cara gostei da simplicidade da obra dirigida pela  escritora e roteirista mexicana Catalina Aguilar.

Gostei da casa rodeada por verde. Da menina, da avó. Impossível não lembrar da minha própria avó materna, braba como  ela só, rígida, mas com mãos de fada ao pentear meus cabelos.

Trata-se de um filme de mulheres. De cuidadoras familiares e profissionais, em uma relação onde tudo se mistura. Como as fotos de diferentes gerações.

Se os homens estão ausentes na vida da mãe de Ema e da cuidadora da avó, mãe solo que precisou cuidar da filha sozinha, no filme eles aparecem nas bordas.

Ali estão o namorado de Ema, impedido de participar da despedida familiar, o tio que aparece com a família por alguns dias. Ou o padre, repelido pela avó.

É um filme de pouca ação e muita espera. E aí reside sua grandiosidade. Das pequenas coisas. Dos pequenos momentos.

Um filme de dentro de casa. Com poucas cenas externas. O roteiro nos permite conhecer a casa e seus diferentes espaços, na  mesma medida em que vamos conhecendo mais mãe, filha e avó e a relação entre elas.

“As Horas Contigo” permite a despedida para quem não pode vivenciar essa experiência com um familiar querido. Ou recordar as despedidas a conta gotas que  vivemos, particularmente quando se tem um familiar com demência.

Não é fácil dizer adeus. Principalmente aquele último e derradeiro onde se mistura a sensação de impotência e o alívio pelo descanso.

Não é fácil esperar os últimos dias. As últimas horas. Sozinha ou acompanhada,  tudo se mistura. Ontem e hoje.

Imagens fluem. Pequenos vídeos. Recortes da infância, da adolescência, da vida adulta. Flashs fugazes, impossíveis de capturar.

O tempo, esse tempo da espera, se torna relativo. Passado e presente se mesclam em uma atemporalidade que só a eminência da morte permite.

E é a presença da morte que nos coloca em momentos de stand by. Desejamos parar o tempo como se, com isso,  a morte não pudesse se aproximar. E lá vamos nós para o campo dos desejos, esse espaço quase infantil onde gostaríamos que tudo fosse possível. Não é.

Como no filme, enquanto esperamos, conversamos, sonhamos, quase deliramos junto com a pessoa querida.

São diferentes as formas de se despedir. Tem quem chore escondido no banheiro. Tem quem chore escancaradamente, como se fosse a única pessoa a sofrer. Tem quem chore estoicamente, pra dentro. Tem quem não chore. Como se não sentisse nada.

O filme é recheado de pequenas delicadezas.

Uma delas é a passagem dos dias contados através dos desenhos da neta caçula. Há as pequenas alegrias pensadas para a avó, Mari. E os tons dos dias que refletem carinho, alegria, esperança e dor.

Sim, é um filme de despedidas. Mas também é um filme de (re) encontros. E talvez aí resida a sua principal força”.

Nós, do Coletivo Filhas da Mãe, acreditamos que a vida é composta de pequenas e grandes despedidas. E de novos recomeços.

PS: No domingo, 23, a partir das 8h, o grupo Caminhantes do Coletivo Filhas da Mãe vai participar da 9a. Edição da Caminhada nos Parques de Brasília. Vamos fazer a trilha do Jardim Botânico. Quer participar? Envie uma mensagem para o nosso Instagram: @blocofilhasdamãe.

 

3 thoughts on “De Quantas Despedidas Somos Feitas?

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*