A maldição do ouro negro

Publicado em ÍNTEGRA

VISTO, LIDO E OUVIDO, criada por Ari Cunha (In memoriam)

Desde 1960, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Charge do Cazo

 

          Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, repetia o filósofo de Mondubim, ecoando o bardo quinhentista Camões. Tal observação atemporal cabe muito bem no atual manequim da estatal dos combustíveis, a Petrobras. Criada para dar autonomia e independência ao país com relação aos derivados de petróleo, essa estatal tem tido muitos papeis ao longo das décadas. Alguns de importância estratégica, outros de interesse meramente político.

         Hoje, essa estatal parece ter se transformado numa autêntica dor de cabeça para o governo e para os brasileiros. O que essa empresa entrega com uma mão, por meio de impostos e dividendos, arranca com a outra, na forma de uma paridade injusta de preços dos seus produtos. Felizes com o desempenho econômico dessa empresa, estão apenas os acionistas e os diretores que gerenciam os negócios bilionários do ouro negro.

         Com o último reajuste, vindo na crista de inúmeros outros, elevando a gasolina em mais de 5% e o diesel em 14,26%, a política de preços da Petrobras conseguiu uma unanimidade contra si, ao se colocar entre o principal fator do crescimento da inflação.

         A gritaria tem sido geral, com todos acusando a empresa de praticar preços abusivos de olho apenas nos lucros e na rentabilidade dos acionistas e da cúpula dirigente. As discussões sobre a conduta gananciosa da Petrobras, já extrapolaram as salas de sua sede, no Rio de Janeiro, e passaram a ecoar por todo o país, principalmente em Brasília, onde, às vésperas das eleições gerais, o tema atingiu alta temperatura política.

         As ameaças vêm de todos os lados. O presidente da República, que até hoje parece não ter acertado um nome para a direção da estatal, depois de várias mudanças e de inúmeros apelos para que a empresa encontrasse uma fórmula de preços razoáveis, dentro da realidade nacional, perdeu a timidez e agora acusa a petroleira de traição.

         Na Câmara, seu presidente, Arthur Lira, promete não se opor à instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), mesmo que essa Comissão venha a se transformar num palanque privilegiado para as campanhas políticas. No meio dessa confusão, que vem se estendendo por anos, a oposição parece ter encontrado um gancho para pendurar seus argumentos contra o governo, esquecendo-se do que fez com a estatal, e que resultou na Operação Lava Jato e no chamado Petrolão.

          Há ainda ameaças, vindas de diversas partes, para que a taxação dos lucros da empresa seja revista para cima. Outras ameaças também são verbalizadas, como aquela que pretende entregar, ao alvitre da Agência Nacional do Petróleo (ANP), toda a política de preços referente à Petrobras. A crise dos preços dos derivados do petróleo, transformado em comodities e cotado, no mercado internacional, pela variação do preço do barril em dólar, encontrou internamente um país em séria crise, com o aumento da inflação e do número de famílias vivendo na pobreza.

         Há uma disparidade enorme entre os preços praticados internamente e o preço contado no exterior. Para um país continental e que tem, desde os anos cinquenta, calcado seu modelo de transporte por rodovias, o aumento do diesel é um tiro de morte na movimentação de cargas. Os caminhoneiros já estão acertando os ponteiros para deflagrar uma paralisação monstro, levando um complicador a mais em todo esse processo.

         A verdade é que o governo não possui todos os instrumentos legais para modificar a política de preços da empresa, mesmo sendo grande acionista. O pior é que qualquer intervenção mais brusca nessa empresa pode ocasionar, além de mais inflação, um risco de desabastecimento generalizado, elevando o termômetro da crise.

         A proximidade das eleições é ainda um fato de risco para toda essa crise de paridade de preços da Petrobras, já que induz, nos candidatos, a formulação de programas do tipo demagógico e populista que podem agravar ainda mais a relação dessa empresa no mercado interno. Sem concorrentes diretos internamente e dominando mais de oitenta por cento do mercado interno, a Petrobras continua fazendo ouvidos moucos a toda essa crise, indiferente ao que ocorre hoje no Brasil.

         Amparada por seus estatutos e movimentando-se ao sabor dos elevados preços desse produto no mercado internacional, a Petrobras enxerga ainda mais lucros com a aquisição de novas plataformas que virão, com as perspectivas do prolongamento da guerra no Leste europeu e outros fatores, todos eles distantes da realidade cotidiana do país.

         Trata-se aqui de uma empresa que cresceu, graças aos brasileiros, mas que hoje se mostra indiferente e até hostil àqueles que lhe deram vida. Como a principal fornecedora de combustível ao país, a Petrobras não se movimenta com base em conceitos como patriotismo, cidadania ou outros apelos do tipo sentimental. Seu objetivo é o lucro, não importando como obtê-lo. A maldição do ouro negro, que já atingiu muitos países mundo afora, parece ter encontrado agora um novo país para pôr de fora suas garras.

 

 

A frase que foi pronunciada:

“A Petrobras não será responsável ou obrigada pela transmissão ou acessibilidade de informações exatas, úteis ou disponíveis através do Portal e não será, também, responsável ou obrigada por qualquer transação ou decisões de investimentos feitas com base em tais informações.”

Retirada da página investidorpetrobras.com.br/politicas-e-termos-de-uso

Foto: André Motta de Souza/Agência Petrobras

 

História de Brasília

Termina fevereiro, e o ministério da Saúde não traz a vacina Sabin para Brasília. Vamos apelar agora para o dr. Fabio Rabelo. (Publicada em 01.03.1962)

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