#Suspeita de bomba no Banco Central Foto: CB/D.A Press

Banco Central reforça preocupação com inflação e política fiscal

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reforçou o alerta de que as pressões inflacionárias persistem e devem demorar para se dissipar e ainda mostrou maior preocupação com a questão fiscal, na contramão do discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes, que, sempre que pode, falar que o “fiscal está forte”.

 

Os alertas fazem parte da ata do Copom, divulgada nesta terça-feira (1º/11). No documento final da reunião realizada nos últimos dias 25 e 26, quando os diretores do BC decidiram, por unanimidade, manter a taxa básica da economia (Selic) em 13,75% pelo segundo Copom consecutivo, o comitê destacou o alto grau de difusão da inflação em um ambiente “desafiador” diante de uma normalização nas cadeias de suprimento ainda “incipiente”.  “O baixo grau de ociosidade do mercado de trabalho em algumas economias, aliado a uma inflação corrente elevada e com alto grau de difusão, sugere que pressões inflacionárias no setor de serviços podem demorar a se dissipar”, informou o texto da ata.

 

Na semana passada, após o Copom, ao manter a Selic em 13,75% ao ano, o comitê deixou a janela aberta para futuras e manteve esse direcionamento na ata de hoje, diante de projeções do mercado para a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acima dos tetos da meta, tanto em 2022 quanto em 2023, de 5% e de 4,75%, respectivamente. Pelas estimativas do boletim Focus, as previsões para o IPCA estão em 5,6% e 4,9% e, para 2024. Apenas em 2025, o Copom informou que será possível ver previsões do IPCA no limite do teto, em 3,5%.

 

O colegiado também reforçou o alerta para o aumento dos riscos fiscais em 2023, que tendem a pressionar os preços e a exigir um aperto maior da política monetária.  “O comitê notou uma maior sensibilidade dos mercados a desenvolvimentos que afetem os fundamentos fiscais, inclusive em países avançados. A conjunção de taxas de juros mais altas com endividamentos soberanos em patamares historicamente elevados suscita questionamentos sobre a sustentabilidade do endividamento público em diversos países. Além disso, a menor liquidez presente nos mercados de títulos soberanos eleva a percepção de riscos e demanda monitoramento”, destacou a ata.

 

O Copom justificou a decisão de manutenção da Selic como reflexo da incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e que é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos de 2023 e de 2024”.  “O Comitê se manterá vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período suficientemente prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação”, destacou a nota que reforçou que o comitê irá perseverar “até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”. “O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, acrescentou o documento.

 

Analistas destacaram essa maior preocupação do Copom com o desequilíbrio das contas públicas. Projeções do mercado indicam um rombo fiscal bem maior do que os R$ 63,7 bilhões previstos no Orçamento do ano que vem que ainda precisa ser votado pelo Congresso. As estimativas variam de R$ 150 bilhões a R$ 430 bilhões. O consenso entre analistas é de que o futuro chefe da equipe econômica do presidente eleito precisará negociar com o Legislativo uma licença para gastar (waiver fiscal) em 2023 para poder discutir uma nova âncora fiscal, pois a credibilidade do teto de gastos, criado em 2016, está no chão depois de tantas alterações feitas pelo atual governo. 

 

“A ata mostrou uma real preocupação com a ancoragem fiscal, o que deixa no ar o fim do ciclo de juro. O Banco Central não sinaliza quando começará a reduzir a Selic, antes com o mercado sinalizando em junho, agora, não mais”, avaliou Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset. Na avaliação dele, o afrouxamento da política monetária, depreenderá de como o novo governo vai conduzir a política fiscal.  

 

“Tudo dependerá de como o governo Lula deve transitar nesta seara, o que obriga o BC a ser mais cauteloso”, disse Hegedus. Para ele, o ponto mais relevante da ata foi quando o Comitê enfatizou que a “não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”. “Diante das incertezas de um novo arcabouço fiscal, neste ciclo de poder com Lula, a dúvida é saber o timing ideal para começar a reduzir a taxa de juros. Antes, se falava muito entre março e junho. Agora, não se tem mais esta certeza”, acrescentou.

 

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, destacou que a ata não alterou a mensagem principal do comunicado emitido após o término do Copom, na semana passada. “Não houve mudança na comunicação, que indicou que o Banco Central precisa continuar cauteloso a fim de ancorar as expectativas. Isso significa que o BC deve manter os juros parados por um longo período”, afirmou. Ele ainda lembrou que, nem a ata e nem o comunicado deixaram claro até quando a Selic permanecerá no patamar atual. A expectativa de Padovani é de que uma mudança na taxa Selic deverá ocorrer somente a partir do segundo semestre de 2023. “O risco fiscal é assimétrico. Há mais chance de a Selic ficar parada do que subir. O juro real já vai subir”, acrescentou.