Magne Cristine Cabral da Silva*
A divulgação na quinta-feira, 6, de que Direção Geral da Polícia Federal resolveu pôr fim ao grupo de trabalho da Operação Lava Jato em Curitiba provocou um grande choque na sociedade, inclusive nos próprios policiais federais.
O grupo de trabalho da Lava Jato é formado pela integração da Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal. Essa integração permite o trabalho conjunto, articulado, célere e eficiente das investigações. No âmbito da PF, a estrutura em grupo de trabalho permite que os policiais federais atuem com dedicação integral à operação Lava Jato.
Em investigações que envolvem organizações criminosas, a formação de grupo de trabalho é praxe adotada na PF. Além de permitir a exclusividade do efetivo, aproxima a PF das instituições relacionadas às apurações – Ministério Público e Justiça Federal -, evitando a burocracia excessiva e a morosidade na tramitação do inquérito policial.
Os inquéritos que apuram crimes financeiros e organizações criminosas são extensos e volumosos, pois envolvem acervo de provas em documentos escritos – como extratos bancários e contratos -, além de dados de interceptações telefônicas e telemáticas (e-mails), demandando muita dedicação e aprofundamento nas investigações.
Na medida em que foi sendo revelada a magnitude da organização criminosa – em complexidade e número de pessoas envolvidas -, o grupo de trabalho da Operação Lava Jato foi se ampliando em quantidade de investigadores e recursos tecnológicos. E a cada nova etapa das investigações surgem novos alvos e articulações, implicando nova cadeia criminosa a ser investigada, como em uma progressão geométrica.
A Lava Jato gerou novas operações que se expandiram até para outros Estados e cada vez mais demanda ser ampliada, inclusive na força tarefa em Curitiba. Atualmente há muito material apreendido a ser analisado, resultado das buscas e apreensões realizadas, o que implica que novos indícios e provas irão precisar ser analisados, assim como outros suspeitos vão precisar ser investigados, especialmente diante das novas delações premiadas.
A Lava Jato tornou-se um patrimônio nacional, sendo sinônimo de combate à corrupção e de esperança para a sociedade brasileira. A preocupação geral passou a proteção das pessoas e instituições encarregadas das investigações – Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal, tudo para blindar a Lava Jato.
A permanência do Diretor-Geral da PF vem sendo cobrada como forma de proteger a Lava Jato de interferências que poderiam resultar da indicação de um novo Diretor-Geral da escolha do Ministro da Justiça. Leandro Daiello passou a ser pessoa intocável pelo governo e vem sobrevivendo à passagem de seis ministros da Justiça, de partidos e governos diferentes, no intervalo de um ano e meio.
Por isso, o que não se esperava era que as mudanças na Lava Jato ocorressem por decisão da própria PF, do Diretor-Geral Leandro Daiello. Em nota à imprensa, a PF afirmou que o Grupo de Trabalho da Lava Jato passou a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (DELECOR). Ou seja, acabou a exclusividade das investigações da Lava Jato pela PF e acabou a eficiência do Grupo de Trabalho.
Quem conhece a PF e a burocracia excessiva dos trâmites cartorários de uma delegacia, sabe do prejuízo da mudança para as investigações da Lava Jato. Os policiais federais irão participar de várias investigações simultaneamente e ainda concorrer às escalas de serviços extraordinários da superintendência. Assim, poderão ser convocados para atuar em prisões em flagrante durante o expediente ou fora dele, o que implica em folgas e compensação orgânica, provocando interrupções nos trabalhos de investigação.
A Operação Lava Jato está mais vulnerável. Ao passar a ser tocada em conjunto com outras da delegacia, não há mais vinculação dos policiais investigadores à Lava Jato, o que vai possibilitar a livre substituição e até a retirada da equipe, sob o argumento de ser uma medida de organização interna da PF. A Lava Jato agora está nas mãos do superintendente da PF em Curitiba.
Com os impactos da operação Lava Jato no cenário nacional e diante dos diversos planos revelados para paralisar as investigações, não se pode supor que o fim da força tarefa da PF é mero procedimento de organização administrativa da PF. Como em um jogo de xadrez, as peças do tabuleiro parecem caminhar para um xeque-mate na maior investigação contra a corrupção e o crime organizado do país.
*Magne Cristine Cabral da Silva é advogada, escrivã da Polícia Federal aposentada e diretora de Comunicação da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) e da Ordem dos Policiais do Brasil (OPB). É pós-graduada em Direito Público, especialista em Execução de Políticas de Segurança Pública e bacharel em Direito e Administração de Empresas.