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Maior parte dos casos de violência sexual contra crianças ocorre na primeira infância, o que chama a atenção para a importância de prevenir e combater esse crime

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Entre janeiro de junho de 2018, o Ministério dos Direitos Humanos registrou 8,5 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes em todo o país por meio do Disque 100 . Em 2017, em todo o ano, foram mais de 20 mil ocorrências. No Distrito Federal, o sistema computou 133 agressões até junho de 2018 e 319 durante o ano de 2017.

Como nem todos os crimes sexuais contra a população de 0 a 17 anos chegam a ser denunciados, o número total de casos deve ser muito maior. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que apenas 10% dos casos são notificados no país . E, em 71% dos casos, o agressor é um familiar ou alguma pessoa próxima da vítima.

Entre os 8.581 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes registrados na primeira metade do ano passado, 47,99% foram praticados contra meninas; e 40,70% contra meninos — em 11,31%, o gênero não foi informado. A maior quantidade de agressões foi registrada contra crianças de 4 a 7 anos, que correspondem a 21,47% das vítimas. Em 17,76% dos crimes, as crianças tinham até 3 anos.

O que acende o alerta para a importância de combater e prevenir esse tipo de violência na primeira infância, fase em que meninos e meninas são mais vulneráveis e têm menos possibilidades de denunciar. Os casos diminuem à medida que as crianças crescem: 20,01% das vítimas têm de 8 a 11 anos; 17,43% de 12 a 14 anos; 11,69% de 15 a 17 anos. A exploração sexual, quando se paga para ter sexo com a pessoa com menos de 18 anos, é responsável por 16,08% dos casos.

Em seguida, aparecem pornografia infantil (15,52%), sexting — divulgação de conteúdos eróticos por meio de celulares — (1,26%), grooming — sedução virtual — (1,13%) e exploração sexual do turismo (0,09%). Com relação à essa última modalidade, a Polícia Rodoviária Federal publica todos os anos um balanço de pontos vulneráveis nas rodovias brasileiras. Em 2018, foram constatados 2.487 pontos vulneráveis.

Dia de luta: 18 de maio

Legenda: Campanha do Governo de Alagoas contra esse crime

Maio é o mês-símbolo dessa luta. Em 18 de maio, celebra-se o Dia Nacional do Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data, instituída pela Lei Federal nº 9.970/2000 , é uma homenagem à jovem Araceli, menina de 8 anos que foi vítima de um crime que chocou o país em 1973. Em Vitória, no Espírito Santo, ela foi raptada, estuprada e morta por jovens de classe média alta daquela cidade. O crime, apesar da natureza hedionda, segue até hoje impune.

Faça Bonito!

O Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes promove a campanha Faça Bonito! para demarcar essa luta. Qualquer pessoa pode aderir, participar e divulgar. Saiba mais no site.

Na legislação

A Fundação Abrinq lançou recentemente o estudo Caderno legislativo da criança e do adolescente 2019 . A publicação apresenta quais são as proposições prioritárias para a infância e adolescência em tramitação no Congresso Nacional e faz um apanhado histórico das legislações já existentes. Uma das conclusões, no que diz respeito à violência sexual, é que a legislação sozinha não basta para garantir direitos. É preciso ter políticas públicas mais eficazes, tanto de combate, quanto de prevenção.

Entre os acordos e compromissos internacionais relativos à infância e à adolescência, está a Declaração de Estocolmo , resultante do Congresso Mundial sobre Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1996. O documento tem como objetivo combater o fenômeno da exploração sexual comercial de crianças, mediante uma ação integrada em todos os níveis, local, nacional e internacional.

Estudo da Fundação Abrinq mapeou a legislação que impacta crianças e adolescentes no Brasil, assim como projetos de lei em tramitação

A publicação da Fundação Abrinq conclui que “o cenário da infância e adolescência era aterrorizante nos anos que antecederam à Constituição Federal  de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) , em 1990”. Isso “pois crianças e adolescentes estavam submetidos a condições de vida sub-humanas, sofrendo de desnutrição crônica, sendo submetidos a trabalho forçado e precoce, sem acesso à educação e sofrendo todos os tipos de violência: abandono, violência, exploração sexual e demais situações que os colocavam em alta situação de risco”.

Com relação à violência sexual, a Constituição Federal brasileira resguarda crianças e adolescentes nesse sentido, nos artigos 5º e 227º. O ECA também é fundamental nesse sentido. No entanto, só a legislação é insuficiente para proteger as pessoas de até 17 anos desse tipo de crime, que, infelizmente, ainda é comum: a publicação da Abrinq cita que, entre os casos de violência sexual notificados no sistema de saúde, em 2011, mais de 70% dos estupros foram cometidos contra crianças e adolescentes no Brasil.

Por isso, a fundação recomenda a criação de programas efetivos: “a partir deste cenário, entendemos que é fundamental discutir e implementar políticas públicas voltadas à prevenção e redução da violência contra crianças e adolescentes, efetivando a doutrina da proteção integral prevista na Constituição Federal.” Na 55ª Legislatura (2015-2019) do Congresso Nacional, foram apresentadas e tramitaram 337 proposições que se relacionam, direta ou indiretamente, à violência contra a criança e o adolescente.

Dessas, 70 tratam de violência sexual, a maioria na lógica de agravar a punição do agressor após a violência. O estudo da Abrinq cita que, desde 2009, o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) mostra que o número de casos notificados de violência sexual contra crianças e adolescentes é bem alto, por isso, exigem ação. “As alterações consecutivas na legislação penal, com vistas a agravar as penas para os agressores, são importantíssimas, mas, sozinhas, não vão reduzir esses terríveis indicadores — o que aponta para a necessidade de urgentes medidas de prevenção à violência”, defende o estudo.

Projetos de lei

Desde 2012, a Fundação Abrinq mapeia proposições legislativas que se referem, direta ou indiretamente, a direitos da criança e do adolescente e que tramitam nas duas Casas Legislativas. Até 7 de dezembro de 2018, foram identificadas 4.334 proposições, das quais ainda estão ativas 3.849. Desse total, 2.328 foram apresentadas e tramitaram durante a 55ª Legislatura (período de 2015 a 2018), e somente 193 delas chegaram ao fim do processo legislativo (arquivadas, devolvidas ou retiradas pelo autor e transformadas em norma jurídica). Ou seja, até dezembro de 2018, 2.135 proposições ainda tramitavam.

Confira propostas consideradas prioritárias pela Fundação Abrinq que envolvem a temática:

PL nº 4.018/2004, do Senado Federal , de Edison Lobão (PFL/MA): altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), para combater a prostituição e a exploração sexual de crianças e adolescentes. Exige autorização judicial para que o adolescente possa viajar desacompanhado e aumenta para 30 dias o período de fechamento de estabelecimento que hospede criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsável.

PL nº 6.831/2010 , da Câmara Federal, de Paes de Lira (PTC/SP): altera os arts. 213, 217-A e 225 do Decreto-Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, dispõe sobre o crime de estupro e dá outras providências. A proposta foi desarquivada este ano.

A youtuber Fabiola Melo aborda a própria experiência em livro para ajudar vítimas

Relato de uma vítima

Youtuber , palestrante e digital influencer cristã, Fabiola Melo foi vítima de abuso por uma pessoa de confiança da família aos 9 anos.

Na época, ela não entendeu a violência que havia sofrido, e sem denunciar, seguiu com as marcas dessa violação. Já adulta, motivada pela própria dor e pelos pedidos de socorro que recebe diariamente nas redes sociais, ela lança o escreveu o livro A culpa não é sua.

A obra é publicada pela editora Mundo Cristão e tem o objetivo de ajudar a todos que passam ou passaram pela mesma situação. Além da própria experiência, na obra, a autora revela relatos marcantes de diversas mulheres que também sofreram com a agressão, seja na infância, seja na vida adulta.

A publicação traz ainda uma série de complementos, como explicações acerca dos mitos e realidades relacionados ao abuso sexual de crianças e adolescentes, informações sobre os meios de denunciar o crime e dados sobre abuso no Brasil.

Leia!

A culpa não é sua

Autora: Fabiola Melo

144 páginas

R$ 29,90

 

 

 

 

 

Tema chega às telonas

A edição do Festival Varilux de Cinema Francês deste ano, entre 6 a 19 de junho, traz duas produções sobre abuso e exploração infantil. O longa Graças a Deus (Califórnia Filmes), de François Ozon, retrata o caso de um padre acusado de molestar dezenas de meninos entre os anos 1980 e 1990.

Na história, Alexandre (Melvil Poupaud) vive em Lyon com a esposa e os filhos quando descobre que o padre que abusou dele quando era escoteiro ainda trabalha com crianças. Por causa disso, ele inicia um movimento ao qual se juntam François e Emmanuel, outras vítimas do padre, para vir a público e buscar justiça. Mas eles terão que enfrentar todo o poder da cúpula da Igreja nessa batalha.

O outro filme que aborda a temática é Inocência Roubada (A2 Filmes), dirigido por Andrea Bescond e Eric Metayer. Adaptação de um espetáculo de dança da bailarina, atriz e diretora Bescond, a produção é baseada em uma história real. A dança foi a forma encontrada por ela para se libertar dos traumas sofridos na infância.

Ainda não há previsão de quando os filmes vão estrear.

Para estudiosos e outros interessados

A Universidade Federal de São Carlo (UFSCar) vai sediar evento internacional sobre crianças e adolescentes em situação de risco entre 20 e 30 de maio. O ciclo da Escola de Altos Estudos (EAE) – Crianças e Adolescentes em Situação de Risco: Dimensões Éticas, Intervenção e Inovação Científica tem como objetivo principal disseminar conhecimento científico de ponta sobre o impacto de experiências de adversidade e negligência no desenvolvimento humano, bem como discutir possibilidades de intervenção, mantendo um olhar atento para as questões éticas envolvidas.

Entre os palestrantes do primeiro ciclo, está Linda Liebenberg, professora da Dalhousie University, no Canadá. Podem se inscrever estudantes de graduação dos últimos anos, em especial, nas áreas de psicologia, psiquiatria, neurociências do desenvolvimento e educação especial, pesquisadores e alunos de pós-graduação da UFSCar e de outras instituições e pesquisa. Interessados devem se inscrever gratuitamente no site do evento:

A UFSCar ainda promoverá ainda um segundo e um terceiro ciclos. O convidado do segundo ciclo, em agosto, será Charles Nelson, da Universidade Harvard. No terceiro ciclo, em outubro, será a vez de Ilina Singh, da Universidade Oxford.