O 25 de dezembro já era dia de festa muito anos antes do Natal ser criado. Foi o Papa Julio I, trezentos e poucos anos depois da morte de Cristo, o responsável por determinar que nesta data o mundo cristão iria comemorar o nascimento do filho de Deus. Ele aproveitou-se da data em que povos do norte europeu comemoravam o solstício, que marca a noite mais longa do ano. Para eles, era a celebração do renascimento do sol.
A data do nascimento do Salvador ninguém sabe; nem o ano, aliás. Se o rei Herodes, que teria mandado matar todos os recém-nascidos para executar o Messias, morreu quatro anos antes do ano 1, Jesus teria de quatro a seis anos mais do que a tradição marca.
E antes de tudo isso, a igreja Católica guardava o dia para homenagear Adão e Eva, festa estranha porque o casal teria sido responsável pela expulsão da humanidade do paraíso, jogando bilhões de descendentes neste vale de lágrimas. Nada disso importa muito hoje. Os séculos passaram e a festa se solidificou como uma data de esperança e reflexão.
É uma festa de luz, mas carregada de símbolos, a começar do Papai Noel, que ainda mete medo em muitas criancinhas. Os tempos modernos e carregados não permitem mais que elas fiquem sentadas no colo do bom velhinho, mas algumas ainda se aproximam e até cochicham alguma coisa nos ouvidos cercados de barba de algodão; outras choram copiosamente, como aconteceu semana passada num shopping da cidade.
Noel é uma invenção alemã, adotada e exportada para todo o planeta pelos ingleses e adotada por um refrigerante. Nem sempre teve a roupa vermelha; nos primeiros tempos circulava com as vestes de um bispo mesmo, como identidade secreta de São Nicolau, que passou para a história como um turco generoso – exemplar raro, se a lenda urbana for verdadeira –, que presenteava famílias em dificuldade.
No Brasil, integralistas dos anos 1930 tentaram substituir o Papai Noel importado pelo Vovô Índio, legitimo produto nacional, vestido com penas de passarinhos coloridos e amigo das árvores. Não colou.
Melhor sorte teve a canção Noite Feliz, que nasceu a partir de um poema do padre austríaco Joseph Mohr, musicado por Franz Gruber e que, no Brasil, ganhou versão do padre Pedro Sinzig. Centenas de canções sobre o Natal foram compostas depois e gravadas pelas maiores estrelas da música, mas nenhuma captou o espírito da festa com tanta verdade.
Mais alguns dias e é Natal de novo. Ano passado foi um tempo de angústia, quando o vírus recrudesceu e voltou a atacar com força; mas desta vez estamos diante da esperança real de que não vai ser mais uma letra grega a nos perturbar a paz. Estamos na letra “o”, de ômicron, porque a ciência resolveu pular três monossílabos – mu, nu e xi – e na torcida para vir logo o ômega e acabar logo esse alfabeto terrível.
As luzes estão pela cidade, colorindo os dias de reflexão. Mais do que nunca, o futuro depende de nós. Feliz Natal.
Publicado no Correio Braziliense em 19 de dezembro de 2022