É como diz aquele velho iê-iê-iê do Roberto: daqui pra frente, tudo vai ser diferente. É esta pelo menos a posição de nove e meio entre dez especialistas em crise, coronavírus, veleidades e cascatas em geral. E o que não falta hoje em dia é especialista, muitos – talvez a maioria – sem nome, sujeito indeterminado, quase sempre no plural..
Todo mundo parece ter uma opinião sobre tudo nessa pandemia e, pior, a expõe, contribuindo para fazer a maior confusão de informação jamais vista e mostrando que, como dizia o Einstein do botequim, tudo é relativo. Tem até comentarista político mirim cheio de opinião, desde que seja para defender mitos.
A verdade é que ninguém sabe o que é verdade nessa história toda, ainda mais no Brasil, onde até a água tônica de quinino virou receita de pauta política. Mais um pouco, recuperam aquela velha garrafa de Ferro Quina que, como se sabe em todo boteco pé-sujo, tem propriedades medicinais – quem sabe não é mais eficaz que os comprimidos oficiais?
Mas é inegável que a crise tem ensinado muito. Um amigo comemorou o isolamento, ao conseguir resolver um problema que o vinha atormentando há tempos e que vai ser muito útil quando tudo terminar – ou seja, aproveitou a crise para reinventar o próprio negócio.
Gente de mais idade também tem aprendido que a tecnologia digital não é bicho de sete cabeças. Aniversários são comemorados em grupos virtuais, reuniões de trabalho que levavam horas são resolvidas em minutos diante das câmeras dos computadores e, por mais que não se possa abraçar, beijar e fazer um cafuné, as relações interpessoais estão sendo alimentadas via internet, mantendo a sanidade dos mais gregários e dependentes.
O vírus está mudando hábitos, a começar pela higiene. Nunca se lavou tanto as mãos, nunca se deu tanta importância ao sabonete; álcool em gel, antes usado apenas para acender o churrasco, agora ascendeu, ganhou prestígio. Os tais especialistas acham que isso é uma mudança de paradigma, uma forma de educação na base do trauma que, como sabe quem já enfrentou uma vara de marmelo ou um cinturão de couro, tem sua serventia.
Garante-se que o mundo será um lugar melhor, mas duvido. Não sou especialista em nada, mas tenho minha implicância com o tal do ser humano – é só ver essa guerra ideológica para saber que continuaremos tão estúpidos como antes, cada um a defender seu idiota de estimação.
Mas certamente há uma mudança estética que vai mexer nos conceitos de beleza e que vai nos acompanhar por algum tempo. Com máscaras nos rostos, as clínicas de aplicação de botox vão ter menos espaço para trabalhar e as fábricas de batom vão ter que se dedicar um pouquinho mais ao rímel e sombras, porque olhos serão bem mais valorizados que bocas.
Como diz o filósofo Fábio Lino, que aproveita o período de recolhimento para terminar sua tese “porque odeio os ipês, principalmente os amarelos”, neste período em que as pessoas estiverem saindo de máscara o jogo fica mais equilibrado: “não tem mais ninguém feio”.
Publicado no Correio Braziliense em 26 de abril de 2020