Não se faz mais macho como antigamente. Tempos atrás, qualquer problema deles era resolvido no braço, com larga irrigação de testosterona, gritos e pose. Hoje os machões estão reclamando de perseguição, especialmente esses que se arvoram de ensinar aos outros a serem machos com esses tutoriais na internet. Que papelão!
Bastou uma mocinha ironizar algumas das afirmações desses treinadores – sim, eles se intitulam coaches, em inglês, que é língua de macho – que ficaram melindrados, veja só. Como machões que acreditam ser, reagiram com bravatas, mas não conseguem explicar porque homens precisam ser treinados para serem machos. Sei não, nos meus tempos de ginásio isso daria o que falar.
Saudade do Movimento Machão Mineiro, quando um engenheiro conhecido como Jacaré espalhava gaiatices, inclusive publicadas em cinco opúsculos, mostrando que é possível brincar com a tal “diferença” sem ninguém se sentir ofendido.
Os atuais treinadores de machos são pessoas esquisitas. Para eles, macho só pode se relacionar com macho (êpa!, diriam os leitores de O Pasquim), como mostram os quatro principais conselhos distribuídos aos alunos: 1, não casar com uma mulher; 2, não coabitar com uma mulher; 3, não engravidar uma mulher; 4, não se relacionar com uma mulher que tenha filhos. O meu favorito é o terceiro.
Se existem machos, como dita a tão desprestigiada ciência biológica, existem fêmeas. E se são opostos, como demonstra outra ciência, a física, são polos que se atraem. Ou seja: fica difícil explicar como é que opostos que se encaixam tão bem precisam manter distância. E ainda tem uma terceira ciência nesse meio de caminho, que não explica muito mas funciona que é uma beleza: a química.
O que esses treinadores de macho estão fazendo, na verdade, é contribuir para o que o guitarrista Frank Zappa, raro caso de inteligência a serviço do rock, chamava de elemento básico do universo. “Alguns cientistas acreditam que o hidrogênio, por ser tão abundante, é o elemento básico do universo. Eu questiono. Existe mais estupidez que hidrogênio. A estupidez é o elemento básico do universo”, disse.
No altíssimo conselho arbitral do botequim, onde se delibera sobre tudo, o assunto é galhofa. Quem precisa dizer que é macho em voz tão alta precisa mesmo é de uma terapia que lhe dê alguma segurança, vaticina o nosso psicólogo de plantão permanente, um prático, que pode não ter estudado a alma humana, mas vive entre pessoas há mais de 80 anos.
Antunes veio de Portugal, mas está em Brasília há décadas, sem perder o sotaque e aquela deliciosa rispidez lusa, que muitas vezes é confundida com grossura pura e simples. Ele nunca tinha ouvido falar desse movimento de defesa do machismo chamado blue pill, que não tem nada a ver com as pílulas de Viagra, mas com os comprimidos oferecidos por Morpheus a Neo, no filme Matrix, para definir o grau de conformismo.
Depois de ouvir a curta explicação sobre os neo-machistas ele deu seu diagnóstico, sem disfarçar o olhar saudoso.
– No meu tempo éramos machos e fêmeas. E como a gente se dava bem…
Publicado no Correio Braziliense em 17 de março de 2023