Categoria: consciência
Nascida em Boston, uma das cidades mais literárias dos Estados Unidos, terra de Edgar Allan Poe, Ralph Aldo Emerson e Sylvia Plath, Otessa Moshfegh ganhou da crítica literária a etiqueta de voz de uma geração, mas acha a classificação estranha. “Passei a maior parte da minha vida jovem intrigada pelo comportamento humano, enquanto meus colegas e amigos pareciam não se incomodar. Eu não os entendia, e eles não me entendiam. Então, como eu poderia acabar sendo uma voz para qualquer um além de mim mesma é algo milagroso”, pondera, embora reconheça que toda uma geração se identifique facilmente com seus personagens por conta da carga de tédio e alienação que carregam.
Confira uma seleção do blog com lançamentos recentes que valem a leitura
Romance, ciência, história e contemporaneidade: o Leio de Tudo selecionou oito publicações recentes que merecem a leitura
Ricardo Lísias começou a dar forma a Uma dor perfeita ainda no leito da UTI. Internado com covid-19 durante duas semanas entre março e abril de 2021, o escritor tinha acesso a um telefone celular por meio do qual trocava mensagens com a mulher, alguns amigos, a mãe e o editor Marcelo Ferroni. Deste último veio a sugestão de pensar em um livro. Quando teve alta da UTI e foi para o quarto, Lísias passou então a tomar notas para o relato. Graças às enfermeiras, conseguiu papel, caneta e uma pasta para dar início à escrita.
O igarapé educa para atenção, nome é uma palavra habitada, nossa língua é nosso comportamento e o tempo é uma mentira que impede de viver. Quando Valter Hugo Mãe toma a dianteira da língua portuguesa, o leitor pode sentar e se maravilhar com algumas das mais belas frases da literatura contemporânea. Como um Manoel de Barros português, ou um José Saramago brasileiro, Hugo Mãe, que nasceu em Angola, cresceu em Portugal e tem um afeto declarado pelo Brasil, consegue transformar a leitura em uma emoção só. Coloque nisso uma história brasileira, violenta como foi a colonização, trágica como foi a matança dos índios e a escravização dos africanos, e fica difícil não querer derramar uma lágrima aqui e outra ali.
Rosa Montero reedita livro sobre mulheres com 90 novos perfis de ilustres desconhecidas
Rosa Montero é viciada em biografias. Em casa, em Madri, ela guarda uma biblioteca com centenas de volumes desse gênero. Neles a escritora espanhola vislumbrou, pela primeira vez, lá pelo início dos anos 1990, a vontade de escrever um livro inteiro sobre mulheres históricas desconhecidas. “Como leitora assídua de biografias, descobri várias mulheres fascinantes que eram completas desconhecidas”, conta Rosa. “Eram absolutamente fascinantes e eu caí nelas por pura casualidade, com biografias que me levavam a outras biografias.” Na época, ela decidiu se aprofundar nas histórias dessas figuras, que renderam várias colunas para o jornal El País e o livro Nós, mulheres, publicado em 1995.
A morte de Marielle Franco, o lugar das milícias no Rio de Janeiro, o estupro como uma violência repetida a cada vez que a vítima precisa se explicar. Que tal mergulhar em leituras sobre o Brasil contemporâneo para começar 2021 com um pouco mais de informação de qualidade? O Leio de tudo separou quatro livros recém-lançados e escritos por jornalistas sobre fatos recentes da história do país.
Racismo, violência e relações familiares no terceiro romance de Jeferson Tenório
Jeferson Tenório sempre gostou de escrever, mas nunca havia pensado em entrar para a faculdade de letras até ser abordado pela polícia, aos 18 anos, quando saía do trabalho numa pizzaria de Porto Alegre. O episódio desencadeou um processo de consciência racial e literária cujo fruto é um respiro profundo para a literatura brasileira contemporânea. O avesso da pele, que acaba de ser lançado pela Companhia das Letras, deveria ser lido por brasileiros de todas as idades, cores e formações. Terceiro romance do autor, o livro fala de uma realidade conhecida por muitos brasileiros cuja cidadania é usurpada todos os dias e de várias formas, do desprezo do Estado pela educação ao descaso diante das estatísticas raciais.
O zumbi tem seu lugar no folclore brasileiro. Por aqui, ele é o corpo-seco, o unhudo, o menino respondão e malvado que, de tão ruim, não foi aceito nem no céu, nem no inferno. Ficou por aí, entre as árvores e as folhagens, zanzando meio morto, meio vivo, mais morto do que vivo. A metáfora era perfeita para a ideia do editor Marcelo Ferroni, que há anos queria fazer um livro de zumbi à brasileira. Convencido de que esse tipo de literatura tem qualidade e conteúdo, encontrou abrigo na editora Luara França, que abraçou a ideia de convidar outros autores e transformar quatro textos escritos individualmente em um romance. O resultado está em Corpos secos, lançado pela Alfaguara no finalzinho de março e que traz incrível eco contemporâneo com pandemias e mundo paralisado, apesar de ter sido pensado e escrito entre 2018 e 2019.
Consciência e inteligência artificial travam embate no novo romance de Ian McEwan
É no passado que Ian McEwan imagina o futuro do mundo. Essa pequena gracinha toma proporções proféticas em Máquinas como eu, o novo romance do autor britânico. McEwan não se interessa por ficção científica nem por fantasia, mas não há como encarar esse livro sem imaginar um mundo distópico no qual a inteligência artificial e a consciência humana travam um embate digno de Blade runner.