Os sete pecados das pegadinhas

Publicado em Geral, Pecados da língua

 

Existem os sete pecados mortais. Eles estão à nossa volta. Tentam-nos. Nós, fracos mortais, caímos na deles. Aí, não dá outra. Marchamos rumo às chamas do inferno. Como fugir de tão forte atração? Deus, que não brinca em serviço, deu a resposta. Criou as sete virtudes. São antídotos eficazes. Contra a luxúria, a castidade. Contra a avareza, a generosidade. Contra a gula, a temperança. Contra a preguiça, a diligência. Contra a ira, a paciência. Contra a inveja, a caridade. Contra a soberba, a humildade.

  Com eles o chifrudo mete o rabinho entre as pernas e bate à porta de outra freguesia. O mesmo ocorre com a língua. O falante desavisado cai na tentação de pecar contra gêneros, números, flexão e significados. Um dia, descobre que a forma não é bem aquela. Oba! Toma o rumo certo. Deixa o desvio pra lá e faz as pazes com Deus, os homens e os imortais. Que tal acompanhá-lo? Juntando-nos aos bons, seremos um deles.

  Tempestivo, intempestivo

  Atenção, marinheiros de poucas viagens. Tempestivo e intempestivo não têm parentesco nem remoto com temperamento. Dizer que alguém é tempestivo em vez de temperamental? Nem pensar. Pega mal como andar sem cinto de segurança ou dirigir acima da velocidade da via. Xô!

  Tempestivo pertence à família de tempo. Significa no tempo certo, oportuno: O recurso foi apresentado tempestivamente (dentro do prazo).

  Intempestivo é o contrário. Quer dizer fora do prazo: A ação foi ajuizada fora do prazo previsto em lei. Foi intempestiva. 

 

Alface

  As chuvas que despencaram na serra fluminense fizeram estragos. Entre eles, o sumiço das verduras. O assunto virou notícia. Sobressaiu, então, pecado cada vez mais comum. A troca do gênero de alface. A verdinha gostosa e calmante é feminina sim, senhor: a alface, a alface americana, alface crespa.

 

Milhar, milhão

  Milhar e milhão viraram fregueses. Quando seguidos de nome feminino, não dá outra. Vestem-nos de saia. É comum ouvir “as milhares de vítimas”, “duas milhões de crianças”, “foram recebidas milhões de declarações”. Valha-nos, Deus! Xô! Xô! Xô! Milhar e milhão são machinhos da silva. Numeral, artigo e adjetivo concordam com eles: os milhares de vítimas, dois milhões de crianças, foram recebidos milhões de declarações. 

 

   Moral

  O moral? A moral? As duas formas se escrevem do mesmo jeitinho. Mas uma é macha. A outra, fêmea. Muita gente não sabe disso. Na maior ingenuidade, mistura Germano com gênero humano. O resultado é um só. Pensa que está dando um recado. Dá outro. Pior: não dá recado nenhum.

  Os jovens dificilmente falam em o moral. Preferem astral. Há pessoas que têm alto astral. Outras, baixo astral. É o mesmo que moral alto e moral baixo. No masculino, a dissílaba quer dizer estado de espírito, disposição de ânimo. Quer moral mais baixo que o do goleiro que leva frango? Nem precisa ser jogo decisivo.

  A moral significa norma de conduta, moralidade. Nessa acepção, só o feminino tem fez. Aprecie: A moral nacional depende da cultura de cada povo. Você sabe qual a moral da fábula? Ih! Lá vem lição de moral.

 

  Óculos

  Óculos joga no  time de férias, pêsames e núpcias. Só se usa no plural. Exceção? Nenhuma. É plural. Ou plural: Onde estão meus óculos? Comprei dois óculos escuros. As férias são sempre bem-vindas. 

 

Mulherezinhas

  O plural de palavras que fazem o diminutivo com o acréscimo do sufixo -zinho tem exigências. Para chegar a ele, há que percorrer três etapas. A primeira: pôr a palavra primitiva no plural. A segunda: retirar o s. A última: acrescentar o sufixo zinhos: animal, animais, animaizinhos; bar, bares, barezinhos; botão, botões, botõezinhos; cão, cães, cãezinhos; mulher, mulheres, mulherezinhas; homem, homens, homenzinhos. 

 

Seriíssimo

  Sabia? Há superlativos que dobram o i. Só cinco ou seis adjetivos têm essa manha. Quais? Os terminados em -io: frio (friíssimo), macio (maciíssimo), necessário (necessariíssimo, precário (precariíssimo), sério (seriíssimo), sumário (sumariíssimo).