Ops! Caiu na cilada dos pronomes de tratamento

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Arnaldo Jabor faz comentários apaixonados na CBN. Política, economia, comportamento, nada escapa da língua afiada. O assunto de ontem foi a entrada da Venezuela no Mercosul. O Senado se pronunciará hoje sobre o tema. Jabor é contra a inclusão do país no clube sul-americano. Dirigiu, então, apelo ao presidente José Sarney para que atue com engenho e arte contra a pretensão de Hugo Chávez. Em texto solene, tratou Sarney de Vossa Excelência. Acertou. “Foi brilhante vosso discurso”, disse em seguida. “Por isso vos peço que não caia na lábia de Romero Jucá.” Bobeou. Caiu na cilada dos pronomes de tratamento.

Qual é a deles?

Vossa Excelência, Vossa Senhoria, Vossa Santidade & cia. respeitosa têm um ponto comum. Exigem o verbo na 3ª pessoa. Os pronomes que a eles se referem vão atrás: Vossa Excelência se manifestou a respeito do tema. Foi brilhante seu discurso. Por isso lhe peço que não caia na lábia de Romero Jucá.

E o adjetivo? Não deveria concordar com excelência, substantivo feminino? Sim. Mas quem ousaria chamar o mandachuva de poderosa, divina, caridosa? Valha-nos, Deus. Vem, jeitinho! Criou-se a silepse. A figura permite que a concordância seja feita com a ideia, não com a palavra. O adjetivo concorda com o sexo da pessoa, não com o substantivo: Vossa Excelência, senhor presidente, é culto. Vossa Excelência, senhora presidenta, é culta.

A história vem de longe

Dizem que tudo começou quando Portugal se tornou reino independente, lá pelo século 12. Afonso Henriques, o primeiro coroado, sentia-se tão poderoso que dizia “Deus sou eu”. Os mortais não podiam se dirigir a ele. Quem ousasse, perdia a cabeça. Daí, bem antes da guilhotina, surgiu o verbo decapitar, que significa cortar a cabeça. Se, no auge da paixão, a amada dizia ao rei “te amo”, a cabeça dela rolava. Se o médico perguntava ao soberano o que estava sentindo, não recebia resposta. A degola vinha antes. E o ministro da Fazenda? Como saber se prorrogava o IPI de fogões e máquinas de lavar roupas?

O Conselho de Sábios se reuniu. Nasceu aí o jeitinho brasileiro. Eis a mágica: ninguém falaria ao rei, mas à majestade do rei. (Daí a 3ª pessoa). Chamá-lo-iam de Vossa Majestade. As pessoas se dirigiriam ao rei sem se dirigirem a ele. O rei ficou feliz. Os puxa-sacos, que existiam desde então, começaram a inventar pronomes. Ufa! Precisamos memorizá-los até hoje.