O sete e a falação

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“Sete e sete são catorze. Três vezes sete, vinte e um. Tenho sete namorados, mas só posso gostar de um.” A quadrinha não vale só para os corações volúveis. Vale também para a língua. O português tem mais de 5 mil vocábulos. Tanta generosidade constitui tentação para os esbanjadores verbais. Eles deitam e rolam no universo de substantivos, verbos, adjetivos, advérbios, preposições, conjunções e o que mais houver.

“Um é pouco, dois é pouco, três é pouco”, repetem os inimigos da economia. Esquecem-se de pormenor pra lá de importante. A fala e a escrita são vias de mão dupla. Numa pista, está o escritor e o falante. Na outra, o leitor e o ouvinte. Sem conquistar o destinatário da mensagem, o recado morre no nascedouro.

O corre-corre da vida moderna roubou o tempo de adultos e crianças. Quem quer ser lido e ouvido tem de pensar em quem está na ponta. Conjuga, então, o verbo cortar. Passa a tesoura nas gorduras que tornam o texto obeso e põem o leitor pra correr. Em bom português: o texto profissional precisa se adequar à era da internet. A regra: menos é mais.

Cada palavra conta

“Escrever é cortar”, definiu Marques Rebelo. A economia verbal — sem prejuízo da completa e eficaz expressão do pensamento — respeita a paciência do leitor. Conciso não significa lacônico, mas denso. Opõe-se a vago, impreciso, verborrágico. No estilo denso, cada palavra, cada frase, cada parágrafo devem estar impregnados de sentido.

William Strunk Jr, professor de altos estudos da língua inglesa, costumava dizer: “A prosa vigorosa é concisa. A frase não deve ter palavras desnecessárias nem o parágrafo frases desnecessárias, pela mesma razão que o desenho não deve ter linhas desnecessárias nem a máquina partes desnecessárias. Isso não quer dizer que o autor faça breves todas as suas frases, nem que evite todos os detalhes, nem que trate seus temas só na superfície: apenas que cada palavra conta”.

Corta, tesoura

1. Nas datas, os substantivos dia, mês e ano: em 10 de janeiro (não: no dia 10 de janeiro); em março (não: no mês de março); em 2011 (não: no ano de 2011).

2. Palavras ou expressões desnecessárias: processo de adaptação (adaptação); decisão tomada no âmbito da diretoria (decisão da diretoria); trabalho de natureza temporária (trabalho temporário); problema de ordem sexual (problema sexual); curso em nível de pós-graduação (curso de pós-graduação); lei de alcance federal (lei federal); doença de característica dermatológica (doença dermatológica); complicações de origem no coração (complicações cardíacas).

3. A locução verbo + substantivo: Fazer um discurso (discursar). Fazer música (compor). Pôr os livros em ordem (ordenar os livros). Pôr moedas em circulação (emitir moedas).

4. Artigos indefinidos: em 99% das frases, eles são dispensáveis: Houve (um) troca-troca de legendas jamais visto. O presidente quer traçar (uma) nova política externa para o Brasil. O deputado pediu (um) adiamento da votação do projeto.

5. Possessivos seu e sua. O seu constitui uma das piores pragas do texto. Além de sobrecarregar a frase, com frequência torna o enunciado ambíguo: A campanha foi equilibrada até o (seu) final. Para manter o (seu) ritmo de crescimento, o agronegócio precisa de excelentes estradas. O empresário endurece as (suas) críticas ao governo.

6. Pronome todos: O artigo definido tem íntima relação com o indefinido todos. Ao dizer “os metroviários aderiram à greve”, englobam-se todos os metalúrgicos. Não há necessidade de dizer “todos os metroviários aderiram à greve. Se não são todos, dispensa-se o artigo: “Metroviários aderiram à greve”. Mais exemplos: Estudo inglês todas as segundas e quartas-feiras. (Estudo inglês às segundas e quartas-feiras.) O governo quer todas as crianças na escola. (O governo quer as crianças na escola.) Faço plantão todos os domingos. (Faço plantão aos domingos.)

7. Advérbio: Se não for para indicar com exatidão a circunstância em que os fatos aconteceram, a criatura pode ser retirada da frase sem prejuízo. Lembre-se de que o desnecessário sobra: (Como todos sabem), os textos profissionais devem (sempre) ser escritos (literalmente) com economia verbal.