Latim, pra que te quero?

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      Expulsaram o latim da escola há meio século. Não adiantou. Teimoso, tal idioma bate à nossa porta sem cerimônia. Na televisão, o ministro diz que é “demissível ad nutum”. O jornal anuncia que “o presidente recebeu o t´tiulo de doutor honoris causa”. O advogado afirma que vai entrar com pedido de habeas corpus em favor do cliente”.   Mais: a placa do restaurante ostenta o nome Carpe Diem. O professor pede: “Escreva assim, ipsis litteris´´. O repórter considera sui generis a reação do candidato. O diplomata foi traado como pesona non grata. Dura lex, sed lex, consola o juiz.        Criaturas tão íntimas merecem tratamento respeitoso. A reverência impõe duas condições. Uma: grafá-las como manda a norma culta. A outra: dominar-lhes o significado. Vamos lá? 
Ad nutum quer dizer “à vontade”. Então, “demissível ad nutum” significa um empregado sem estabilidade que pode ser demitido segundo o humor do patrão – a qualquer momento.   Honoris causa significa “pela honra”. Para ostentar o título de doutor, a maioria dos mortais tem de ralar. Mas pessoas ilustres podem chegar lá sem exame. Tornam-se doutores honoris causa.   Habeas corpus é o nome da lei inglesa que garante a liberdade individual. Em português claro: que tenhas o corpo livre para te apresentares ao tribunal.   Carpe Diem dá o recado: aproveita o dia de hoje. A vida é curta; a morte, certa.   Ipsis litteris tem a acepção de “textualmente” – sem tirar nem pôr.   Sui generis: ímpar, sem igual.   Persona non grata: usada em linguagem diplomática para dizer que a pessoa não é bem-aceita por um governo estrangeiro. Pessoa que não é bem-vinda.   Dura lex, sed lex? Está na cara, não? É isso mesmo. A lei é dura, mas é lei.

 
 
Reparou? As expressões latinas não têm acento nem hífen. Se aparecer um ou outro, elas perdem a originalidade. Entram, então, na vala comum dos compostos. Ganham hífen. Compare: via crucis e via-crúcis, in octavo e in-oitavo.