De concursos, concurseiros e redações

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  O que 99% dos brasileiros mais querem? Passar em concurso público. Não em qualquer um. Mas no concurso. Além do salário alto, o cargo garante estabilidade, horário definido e aposentadoria integral. Tantas vantagens cobram preço alto. O candidato não só tem de se sair bem. Tem de se sair melhor que os outros. É aí que mora o desafio.
  Como chegar lá? A receita se resume a três verbos. Um: estudar, estudar e estudar. Quantas horas? Não menos de 10h por dia. O outro: renunciar, renunciar, renunciar. Abrir mão do chopinho, das viagens de férias, das navegações vadias na internet, das novelas e Faustãos da vida. O último: persistir, persistir, persistir. Poucos têm a sorte de passar na primeira, na segunda ou na terceira tentativa. Mas, mantido o ritmo de trabalho, a experiência falará alto. Viva!
 
  É profissão
  Fazer concurso exige anos de preparo. Tornou-se, por isso, profissão. A língua, que não dorme em serviço, criou a palavra concurseiro. No Aurélio 2000, o polissílabo era ilustre desconhecido. No de 2010, aparece glorioso. Recorre ao sufixo -eiro, que figura em ferreiro, pedreiro, marceneiro. Reparou? As quatro letrinhas indicam profissão.
 
  A prova de fogo
  Em disputas concorridas, a maior parte dos concorrentes está pra lá de preparada nas matérias gerais. É a redação que faz a diferença. Os examinadores, por isso, leem o texto com lupa. O desafio: selecionar os melhores.
A 1ª leitura foca o tema. O candidato precisa obedecer tim-tim por tim-tim à ordem dada. Se bobear, cai fora. Não há piedade — mesmo que ele tenha escrito uma redação primorosa, sem erro de qualquer natureza. Ultrapassado o 1º crivo, entram os demais — ortografia, morfologia, sintaxe, estilo. 
 
  70% de reprovação
  No concurso do Ministério Público da União, a redação reprovou 70% das 756 mil pessoas. É muito? É. A moçada esperneou. O que houve? A resposta: fuga ao tema. Em bom português: a prova pediu alhos, o candidato deu bugalhos. A bobeira tem explicação. Às vezes, nervosismo. Outras, ignorância. Não raro, esperteza.
  Vale exemplo de um tema proposto: “A importância do planejamento estratégico, tático e operacional para o sucesso da Copa do Mundo de 2014”. Não há como escapar. O texto, de 30 linhas, poderia ter cinco parágrafos de mais ou menos seis linhas cada um. Todos amarrados na ideia central — o planejamento da Copa de 2014. A introdução (1º§), o desenvolvimento (2º, 3º e 4º§), a conclusão (5º§). 
 
  Diga-diga-diga
  Ao escrever uma redação, pense nos três digas. Na introdução, diga o que você vai dizer. No desenvolvimento, diga que você disse que vai dizer. Na conclusão, diga o que você disse. Aristóteles definiu assim as três partes. “A introdução”, disse ele, é “o que não pede nada antes, mas exige algo depois. O desenvolvimento é o algo depois exigido pela introdução. A conclusão exige algo antes, mas não pede nada depois.” 
 
Vaca fria
  O tema da prova está amarrado. Não permite devaneios. Ao candidato só resta segui-lo. No 1º parágrafo, apresentar o assunto. No 2º, falar do planejamento estratégico. No 3º, do tático. No 4º, do operacional. No último, concluir o papo.
 
E daí?
  Você fez o concurso? Avalie sua redação. Ela seguiu tim-tim por tim-tim o tema proposto? O texto tem começo, meio e fim? As ideias estão claras? O português correto? Parabéns. Ops! Com tudo isso, você engrossou a fila dos eliminados? Recorra.