Entre Passarinhos, Árvores e o Alzheimer

Publicado em Alzheimer

Ana Castro & Cosette Castro

Brasília – Em uma tarde de domingo repleta de pássaros, borboletas, rãs, peixes e árvores, a Cia. de Teatro Mapati nos mostrou uma outra maneira de conhecer e lidar com o Alzheimer.

O espetáculo “Avô Árvore, Menino Pássaro”, que estreou no domingo (03/04), apresentou várias homenagens no decorrer da apresentação. Aos poetas (Salve, Ligia Fagundes Teles, que nos deixou no domingo para virar estrela!), à poesia em si, à natureza e à relação lúdica entre avós-netas/netos.

Durante uma hora,  recordamos a importância de brincar. De desconstruir as palavras, como tão bem o fez o poeta Manoel de Barros (1916-2014) e ouvimos novas palavras. Um novo universo, com construções que não obedecem a formalidade da língua portuguesa. Mas principalmente, tivemos a oportunidade de saber como se transformar em uma borboleta para observar o mundo de outro lugar.

No pequeno e aconchegante teatro da Asa Norte, a diretora Tereza  Padilha vai revelando a demência aos poucos. Ao mesmo tempo em que novas palavras aparecem obrigando a um deslocamento dos saberes, as palavras e a memória se perdem. Há um constante jogo de perdas, onde aprendemos que é possível ganhar e renomear.

A relação entre neto e avô é quase mágica, levada pela narrativa de  Manoel de Barros, onde as palavras seguem se diluindo para acolher a arte e a natureza. Mesmo nesse espaço lúdico, a demência vai ocupando espaço. Os brancos e esquecimentos aparecem entremeados pelas brincadeiras entre avô e neto.

O espetáculo passeia pelo exagero do teatro circense para enfatizar a rigidez  da vida adulta com suas regras e obrigações, nos traz a infância de volta com o teatro de sombras e oferta arte intergeracional, com uma trupe em reluzente aprendizagem.

O filho nervoso às vezes lembra o coelho de Alice, que vivia atrasado. Mas quantos de nós, ao cuidar de um familiar com demência não nos transformamos em coelhas e coelhos, presos na armadilha da doença e do cuidado automatizado, sem saber o que fazer ou para onde ir? O espetáculo nos lembra que a arte salva.

A música é um dos pontos altos de “Avô Arvore Menino Pássaro”. As soluções cênicas também. E o que dizer da interpretação do avô (Chico Sant’Anna) e do neto (Reinaldo Vieira)?  Só assistindo para viver os momentos de emoção que a obra proporciona.  Com entrada gratuita, o espetáculo estará em cartaz nos dias 10, 17 e 24 de abril, 01 e 08 de maio, sempre às 17h.

Outras obras

Nos últimos anos as informações sobre demências, que até agora não são pauta de políticas públicas no Brasil, estão aparecendo nos espaços de arte. Essenciais para reduzir o medo e o preconceito, essas informações são temas de livros  adultos e infantis, peças de teatro, filmes,  séries e aparecem nas novelas.

Entre os livros adultos, vale citar “Para Sempre Alice”(2014), de Lisa Genova, transformado no premiado filme, que mostra o caso de demência precoce em uma brilhante professora de Harvard que vai perdendo o controle sobre a sua vida. Interpretado pela atriz Julianne Moore, que recebeu o Oscar em 2015, ajuda a romper os preconceitos sobre demência e desempenho intelectual . (Disponível no HBO Max e You Tube).

Os livros infantis estão presentes em “Vovó tem Alzheimer… O Que?”, de Veronique Van den Abele), “Guilherme Augusto Araujo Fernandes”, de Mem Fox e Julie Vivas ou “Blusa Listrada com Calça Florida”, de Barbara Schnurbush, entre outros.

No teatro, em 2018, a peça “Relicário” foi escrita para bebês e apresentada em uma creche pública no Guará (DF). Antes disso, circularam pelo Brasil “Que Acontece com Vô Quim? (2016), “Um Minuto Pra Dizer Que Te Amo” (2019), “O Lugar no Escuro” (2013), entre outras.

Em 2021, a série sul coreana “Navillera”, dirigida por Lee Eun-Mi  (disponível no Netflix) emocionou públicos de diferentes países ao mostrar o desejo de aprender balé por um carteiro aposentado diagnosticado com Alzheimer e a sua relação com um jovem bailarino, com a família e os vizinhos.

Também em 2021, quem não se assustou com a profundidade e crueza dos danos do Alzheimer no premiado filme “Meu Pai” (2021), dirigido por Florian Zeller, onde Anthony Hopkins recebeu o Oscar de melhor ator? (Disponível no Netflix).

Mais recentemente, em março deste ano,  a Rede Globo trouxe pela primeira vez um teste de memória  para avaliar demências às telas. Um momento marcante da personagem Elenice (Ana Beatriz Nogueira), na novela Um Lugar ao Sol, da Rede Globo.

Independente da obra, independente da rede social digital ou da mídia utilizada, precisamos falar e informar sobre demências e Alzheimer.

PS: Assistir uma obra em grupo e depois conversar sobre ela tem sabor especial. Gratidão, Maria Emilia Veras, Toshiko Araki e Jamila Moraes.

#avoarvoremeninopassaro #mapati @mapati

 

 

 

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