Muros e pontes

Publicado em ÍNTEGRA

VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Congresso Nacional. Foto: EBC

 

Fazer política é construir pontes e não dinamitar. Com base nessa ideia simples, entende-se que quem não faz acordo político acaba por implodir as pontes. Mesmo que não queira. E é aí que entra o elemento para salvar a própria contradição da política, que é a ética pública na política. Fazer política, em sua essência mais nobre, é a arte de construir pontes entre ideias, entre setores da sociedade, entre gerações e entre realidades distintas. Infelizmente, no Brasil contemporâneo, essa missão tem sido sistematicamente abandonada em nome de uma lógica de confronto contínuo, que não apenas paralisa a ação pública como dissolve a própria ideia de nação em uma espessa e estéril gosma ideológica.

No lugar do diálogo, tem-se privilegiado o embate. Em vez da negociação responsável, a retórica inflamada. Em vez da busca por soluções reais, o cálculo eleitoral imediato. O resultado é visível em todas as esferas da vida pública: políticas travadas, reformas inacabadas, projetos abandonados e uma população cada vez mais cética e desamparada. Não faltam exemplos. A condução da pandemia da Covid-19 revelou o quão letal pode ser o colapso das pontes institucionais entre ciência, governo e sociedade. O caso da vacina Covaxin, envolvendo suspeitas de corrupção na negociação de imunizantes, expôs um Estado mais preocupado com interesses obscuros do que com a saúde pública. Enquanto o país registrava recordes de mortes, a política seguia em guerra consigo mesma — e com os fatos.

Da mesma forma, a reforma tributária, debatida há décadas, é constantemente bloqueada por disputas federativas e jogos de poder que colocam o cálculo eleitoral acima da racionalidade econômica. Cada grupo protege seu feudo, cada bancada defende seu privilégio. Na área da educação, assistimos a um processo ainda mais degradante: escolas e universidades sendo transformadas em arenas de uma ideia só. Sem investir na formação crítica e científica, o país mergulha em debates moralistas, muitas vezes irrelevantes, que apenas servem para perpetuar a polarização.

Enquanto o mundo se prepara para a era da inteligência artificial e da economia verde, o Brasil insiste em discutir se o professor é inimigo da pátria. A política nacional parece aprisionada num eterno “nós contra eles”, que sufoca o bom senso e criminaliza o dissenso. É um ambiente tóxico, onde adversários são tratados como inimigos e qualquer tentativa de mediação é vista como traição.

O fenômeno das emendas do orçamento secreto, revelado em 2021, ilustra bem esse ambiente: bilhões de reais distribuídos em troca de apoio político, fora dos critérios técnicos e éticos mínimos que se exigem numa democracia funcional. Compromisso concreto com a transparência, a responsabilidade e o interesse coletivo é o que se espera nos nossos representantes. Pois a ética pública é o que impede que o poder se transforme em instrumento de abuso e a política em mero teatro de manipulações.

Passa da hora de o Brasil reencontrar o caminho do equilíbrio. Uma espécie de aggiornamento. Isso exige coragem para o diálogo, disposição para o acordo e maturidade para entender que a política vai além da guerra, na busca pela convivência. Os países que prosperaram nas últimas décadas em desenvolvimento humano, inovação, justiça social foram justamente aqueles que souberam construir pontes necessárias para unir a população. Seguir dinamitando essas pontes é escolher o atraso. E, pior, é condenar as futuras gerações a viverem num país permanentemente paralisado por suas próprias contradições.

Esse é o momento para deixar para trás a gosma ideológica e ingressar no mundo civilizado, antes que esse venha a ser interrompido por algo como o choque de um grande e devastador meteoro que pode estar se aproximando.

 

 

A frase que foi pronunciada:

“Se você for bem-sucedido, alguém ao longo da linha lhe deu alguma ajuda … Alguém ajudou a criar esse sistema americano inacreditável que temos e que permitiu que você prosperasse. Alguém investiu em estradas e pontes. Se você tem um negócio – você não o construiu. Alguém fez isso acontecer.”

Barack Obama

Barack Obama. Foto: washingtonpost.com

 

Ouvido miúdo

No cafezinho da Câmara, um recém chegado de Dublin perguntou, completamente atordoado com as notícias: “Que tarifaço é esse? Imposto de Renda, o IOF ou o imposto por Trump?” A resposta foi mais comprida, mas só deu para ouvir: “todos”.

Charge do Fraga (Gaúcha/Zero Hora)

 

História de Brasília

Como em Brasília todo o mundo viaja, um grupo de chantagistas resolveu criar o conto da mala feita. Na história de descontar “um cheque que eu vou viajar agora”. Várias autoridades e um banco caíram no conto com duzentos mil cruzeiros. (Publicada em 06.05.1962)

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