VISTO, LIDO E OUVIDO, criada por Ari Cunha (In memoriam)
Desde 1960, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Alguns fatos ocorridos na dinâmica social e urbana brasileira iriam, no final dos anos 1970, provocar uma série de mudanças estruturais no tradicional modelo educacional do país, principalmente no ensino público, oferecido pelo Estado, sob a direção do Ministério da Educação e Cultura (MEC), como era denominada naquela época a pasta que coordenava os assuntos ligados a essa área.
Entre as mudanças sociais que acabaram por atingir em cheio a educação pública, sobretudo no quesito qualidade e eficiência, está a debandada em massa das classes média e alta dessas escolas, rumo ao ensino privado, que começava a ganhar fôlego e atrair os alunos, cujas famílias tinham melhores condições econômicas, oferecendo não apenas um currículo e uma grade e disciplinas mais elaborados, mais diversas e atrativas para os próprios alunos, aprofundando em matérias escolares que, lá no ensino público, eram vistas apenas de forma superficial. Não demorou para esse alunado começar a se sobressair nos exames e vestibulares do país, mostrando não só uma diferença de qualidade desses conteúdos programáticos, como uma nova maneira de ministrar aulas mais dinâmicas, tudo dentro de um espírito empresarial que reconhecia na educação de jovens um vasto campo a ser explorado economicamente pelos novos empresários.
Os melhores pedagogos e professores foram chamados também. As aulas consumiam uma carga horária maior. O material didático era diferenciado e mandado imprimir pelas próprias escolas, contendo textos explicativos e exercícios, relativos ao assunto, em cadernos ricamente diagramados.
Ao ser deixado de lado pelas classes médias e altas, o ensino público perderia o principal nicho social que poderia, de alguma forma, fazer pressão pela melhoria do ensino junto às autoridades, reivindicando direitos e exigindo escolas de qualidade. Com isso, muitas escolas públicas, que outrora eram reconhecidas como de excelência, passaram a conhecer a decadência.
Das poucas escolas que conseguiram sobreviver a esse esvaziamento social, oferecendo um ensino de relativa qualidade, todas elas, indistintamente, tinham em seus quadros de direção, professores abnegados e incansáveis, que passavam a maior parte do ano peregrinando pelos corredores dos ministérios em busca de auxílio e, muitas vezes, não se dobrando às humilhações impostas pela burocracia estatal e pela indiferença com o problema.
Os ministros da pasta que, antes, exibiam invejáveis currículos acadêmicos, foram substituídos por políticos profissionais dispostos a tudo, menos a atender às necessidades da área. O mesmo passou a ocorrer em âmbito estadual e municipal, com os secretários de educação, a grande maioria despreparada e avessa a esses problemas.
Deu no que deu. Nesse vácuo e nesse terreno baldio em que se transformaria o ensino público, ficaram alguns professores em fim de carreira, cansados e desiludidos da luta pela melhoria do ensino e alguns outros professores, que caso fossem submetidos a exames para medir o grau de conhecimento nas disciplinas que ministravam, seriam automaticamente reprovados. Os baixos salários cuidaram para espantar os poucos profissionais de ensino com maior preparo. Os sindicatos, como braços avançados dos partidos, cuidaram de fazer a sua parte, paralisando continuamente as aulas em busca não apenas de melhoria salarial, mas com vistas em interesses políticos e eleitoreiros.
Não surpreende que hoje o ensino público do país seja um dos mais mal avaliados nos certames internacionais como o Pisa e outros. Hoje, o ensino público é ofertado, em grande parte, para pessoas de baixa renda que não encontram outra opção. É isso ou nada. Com a pandemia prolongada esse fosso entre escola pública e privada só fez aumentar ainda mais, acentuando dramaticamente a desigualdade social.
Alunos de escolas privadas continuam tendo aulas, via computador. Os alunos do ensino público, na sua maioria, nem sabem em que escola estão matriculados e que série estão cursando. Para tornar esse quadro ainda mais surreal, agora a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados acabou de aprovar o Projeto Lei (3262/19), permitindo o chamado homeschooling, ou seja, a que os pais eduquem seus filhos em casa, retirando do Código Penal o crime de abandono intelectual. Por acaso não seria abandono intelectual o que o Estado promoveu, pensadamente, contra o ensino público? Fica a questão para um problema que nem esse nem outros governos passados conseguiram resolver minimamente.
A frase que foi pronunciada
“Minha escolaridade não só falhou em me ensinar o que professava ensinar, mas me impediu de ser educado a ponto de me enfurecer quando penso em tudo que poderia ter aprendido sozinho em casa.”
George Bernard Shaw
História de Brasília
Próximo às casas da Edel, um fazendeiro da invasão resolveu fazer um cercado e criar uma cocheira. Há uma onda de mosquitos que não deixam ninguém sossegado. (Publicado em 03/02/1962)