O cérebro reptiliano e o absurdo equacionamento do PPSP

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“É sob o comando desse cérebro reptiliano que se elabora um plano de equacionamento de déficit, que eleva em 30% a contribuição de cada participante para o plano PPSP (Plano Petros do Sistema Petrobras), cujos integrantes não tiveram a menor chance de se defender. Assim, se coloca em risco a saúde e até a vida de 76.000 participantes que fizeram da Petrobrás uma das maiores empresas do mundo e, no final de suas vidas, quando mais precisam de amparo, vêm seus contratos serem desrespeitados e seus direitos vilipendiados”

Fernando Siqueira*

O médico psiquiatra e neurocientista americano Paul D. MacLean, em 1952, propôs a teoria evolucionista do cérebro triúnico para explicar os processos emocionais e suas mudanças ao longo da nossa evolução como espécie. Segundo o neurocientista, o ser humano continua preservando até hoje essas três estruturas básicas: um cérebro reptiliano, o sistema límbico e um cérebro mais novo e complexo responsável pelas funções superiores, o neocórtex.

Assim, o cérebro reptiliano (o Complexo-R) é a parte mais instintiva do cérebro. Muitas das decisões inconscientes são tomadas com objetivo de satisfazer as nossas necessidades básicas como respiração ou sensação de fome e de sede, que estão sob seu controle, assim como as emoções mais primitivas como o desejo, o sexo, o poder, ou mesmo a violência como meio de sobrevivência.

O cérebro paleomamífero ou sistema límbico: É a parte do cérebro responsável pelos sentimentos e por experimentarmos emoções. Segundo MacLean, é uma parte presente tanto em mamíferos quanto em aves. Para o sistema límbico só existe uma classificação binária para as coisas: agradável ou desagradável.

O Cérebro neomamífero ou neocórtex: é a parte lógica, racional e também recreativa. Ela está especialmente desenvolvida na espécie humana.

O cérebro reptiliano não é um mero conceito. Ele é fato, está sempre com medo, raiva e tensão. Sua preocupação principal é a segurança, pois aprendeu há muito tempo que é bem mais fácil entrar na zona de conforto do que lutar por um lugar ao sol.

O aumento da competitividade no mundo em que vivemos favoreceu a prevalência do cérebro reptiliano. É possível distinguir claramente quando utilizamos o nosso processo evolutivo (razão) e quando utilizamos o processo irracional (emoção), fruto do domínio reptiliano.

Todos temos nossas peculiaridades. Uns valorizam mais os relacionamentos, outros buscam conseguir determinadas benesses e outros só têm uma única obsessão: exercer o poder no máximo que lhe seja possível. Para estes últimos, quanto maior a necessidade de poder, menor o controle emocional; portanto, maior é a influência do cérebro reptiliano.

São incapazes de ser receptivos ou preocupados com as necessidades alheias, porque esta estrutura do cérebro carece de coerência emocional, de equilíbrio e de solução para diferenciar os instintos da razão. É um estado defensivo, que contrasta com o cérebro emocional e o racional.

É sob o comando desse cérebro reptiliano que se elabora um plano de equacionamento de déficit, que eleva em 30% a contribuição de cada participante para o plano PPSP, cujos integrantes não tiveram a menor chance de se defender.

Assim, se coloca em risco a saúde e até a vida de 76.000 participantes que fizeram da Petrobrás uma das maiores empresas do mundo e, no final de suas vidas, quando mais precisam de amparo, vêm seus contratos serem desrespeitados e seus direitos vilipendiados.

Cérebros reptilianos que criaram um plano de equacionamento que não levou em consideração fatos que expomos abaixo:

1) O cadastro dos participantes, base de todos os cálculos atuariais, estava tão falho, que, a pedido do Conselho Fiscal, a Diretoria Executiva está promovendo um recadastramento, que, todavia, só ficará pronto e validado em julho de 2018. Sobre esse cadastro não confiável se calculou um déficit referente à família real de R$ 5,2 bilhões.

2) O passivo atuarial do plano é duvidoso, pois, há 15 anos, sendo os quatro últimos por unanimidade, o CF vem rejeitando as demonstrações contábeis e exigindo a contratação de auditoria independente para reavaliar esse passivo sem ser atendido.

3) A Petrobrás tem várias dívidas não cobradas pela Petros. Por exemplo: em 2001, uma Ação Civil Pública promovida pelas entidades dos petroleiros para cobrar dívidas da Petrobrás teve reconhecida por perícia judicial uma dívida da ordem de R$ 9 bilhões. Em 2008, a Petrobrás reconheceu metade da dívida, R$ 4,7 bilhões, e contratou pagá-la em 2028. Ocorre que a outra metade continua tramitando na justiça e tem valores irrefutáveis, totalizando R$ 11,2 bilhões.

4) Um desses valores: na década de 90, a Petrobrás resolveu dar um incentivo à aposentadoria de pessoas com até 30 anos de serviço. Ela calculou que, em cerca de três anos, passaria a lucrar com essa medida, pois deixaria de pagar os salários desse contingente. Isto resultou num prejuízo para o plano Petros de cerca de R$ 2,5 bilhões (cálculo de 2005 – hoje, este valor é da ordem de R$ 8 bilhões de reais), pois os atuários do plano previram aposentadoria com 32 anos de serviço e a Petros teve que arcar com o pagamento antecipado de dois anos de benefícios. A Petrobrás se beneficiou, mas não ressarciu o Plano Petros como era de sua obrigação legal. Ou seja, locupletou-se à custa do PPSP.

5) A Lei complementar 108/2001, em seu artigo 6º, diz que “as patrocinadoras e os participantes são responsáveis pelo custeio do Plano”. Como o déficit do Plano tem sido causado atos da patrocinadora (RMNR, por exemplo) ela tem assumir o custeio do Plano.

Como mencionado no item 3, a Petrobrás tem dívidas reconhecidas por perícia judicial e que constam da Ação Civil Pública em andamento. Existe a possibilidade de se fazer um novo Acordo no sentido de a Petrobrás assumir o restante da dívida e se comprometer em pagá-la em 20 anos, o que não implicaria em qualquer desembolso, no momento, nem por parte dela e nem por parte dos participantes.

Concluindo, propomos que o Plano de Equacionamento decorrente do TAC assinado pela Petros e essa PREVIC seja suspenso e revisto para eliminar as irregularidades mencionadas e possam se efetivar negociações destinadas a melhorar as condições para a implementação, evitando se, assim, uma catástrofe jamais imaginada na previdência privada.

*Fernando Siqueira – Diretor da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet)