Os servidores preparam um arsenal contra o governo para impedir que a equipe econômica leve adiante a ideia de cortar despesas unicamente com a folha de salários. Além de um dia nacional de paralisação, na quarta-feira, 30 de agosto, com atos de protestos em todo o país – em Brasília a partir das 9 horas, em frente ao Ministério do Planejamento -, estão programadas campanhas publicitárias em jornais, emissoras de rádio e de televisão e em mídias sociais, veiculadas por no mínimo um mês, ao custo de aproximadamente R$ 100 mil – rateado entre as 27 carreiras que compõem o Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate).
“O montante é ínfimo se comparado aos mais de R$ 4 bilhões desperdiçados em emendas parlamentares para apoio político do governo no Congresso Nacional”, destacou Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate). O dia de paralisação coincide com a data na qual o Ministério do Planejamento marcou com os servidores para explicar como colocará no papel a nova meta fiscal com rombo de R$ 159 bilhões em 2017 e em 2018. “Falta coerência. O governo perdoou multas e juros de dívidas rurais que superaram os R$ 7 bilhões. E a desoneração da folha de pagamento gerou prejuízo de mais de R$ 94 bilhões nos últimos cinco anos”.
Marques lembrou que os gastos de pessoal da União estão sob controle. Em 2002, representavam 4,8% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas do país) e caiu para 4,1% em 2016. Além disso, a suspensão dos reajustes pode sair caro para o governo. A jurisprudência dos tribunais superiores, do STJ (em casos de CE e MA) e do STF (em caso de TO), reconhece o direito ao reajuste, uma vez que tenha sido publicada a lei que o concedeu. “Após dois de negociação, com inúmeros dias de protesto e paralisações, não se admite que as leis de reajuste sejam descumpridas pelo mesmo governo que as sancionou. Por isso, os servidores dão início a mobilizações em todo o país, a primeira delas marcada para o dia 30 de agosto”.
Vladimir Nepomuceno, ex-assessor do Planejamento, lembrou que as leis foram aprovadas e sancionadas já com previsão orçamentária e com manifestação favorável da Secretaria de Orçamento Federal (SOF). “No Congresso também passou pelas comissões de Finanças e Tributação na Câmara e de Assuntos Econômicos, no Senado. Significa que tanto o Executivo quanto as duas casas legislativas deram o aval. Isso vai ensejar ações judiciais que poderiam resultar em gastos ainda maiores para os cofres públicos”, reforçou.
Para Achilles Frias, presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz), “o objetivo do protesto é impedir o avanço da campanha de desinformação do governo, para dar a sensação de austeridade”. Até mesmo os analistas do mercado financeiro discordam da estratégia da equipe econômica. O economista José Matias-Pereira, especialista em contas públicas, destacou que “é perigoso escolher um setor, de direita ou de esquerda, para inimigo”. “Essa reação dos servidores é natural em um ambiente democrático. Afinal, as carreiras de Estado, se bem gerenciadas, dão excelente retorno e alta produtividade”, criticou.
Histórico
Os servidores entendem que as negociações plurianuais têm sido vantajosas para o governo. Por isso, não aceitam sequer abrir um precedente com a frustração dos acordos firmados. Em 2012, as remunerações foram reajustadas em 15,8%, no somatório de 2013 a 2015. No entanto, a inflação oficial acumulada, medida pelo IPCA no período foi de 24,72% (10,67%, 6,41% e 5,91%, respectivamente). “Tanto é assim, que 90% dos servidores ativos optaram por apenas dois anos, pois temiam, novamente, amargar perdas inflacionárias. Acordos plurianuais respeitados garantem a normalidade dos serviços públicos. Quando as negociações iniciaram, em 20 de março de 2015, a situação econômico-fiscal já era conhecida. Logo, o governo fez propostas menores e os servidores reduziram suas expectativas de recomposição de perdas”, destacou Rudinei Marques.
O presidente do Fonacate lembrou, ainda, que do ponto de vista meramente do desenvolvimento, os gastos com pessoal e os benefícios sociais são multiplicadores positivos e exercem uma função importante na recuperação do país, porque os trabalhadores consomem e movimentam a economia. O aviltamento da remuneração de ingresso nas carreiras de Estado pode comprometer o grau de excelência dos serviços prestados em áreas estratégicas, disse. As carreiras de Estado estão de olho nos projetos no Congresso que prejudicam servidores, a exemplo do Projeto de Lei do Senado (PLS) 116/2017, que estabelece a demissão por insuficiência de desempenho, e as emendas a Medida Provisória (MP) 792/2017, que institui o Programa de Desligamento Voluntário (PDV).
Na semana passada, técnicos de dentro do governo denunciaram a incoerência fiscal da equipe econômica. No estudo “Equilíbrio e Coerência Fiscal”, da Comissão de Representantes da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), servidores fizeram um “exercício simplificado” e chegaram à conclusão de que “a economia com a postergação do reajuste é menos da metade se for feita apenas no Executivo”. Isso porque a despesa média com servidores ativos do Executivo é de R$ 9.940 e com os inativos, de R$ 7.620. Enquanto que, os militares custam, respectivamente, R$ 4,321 e R$ 9.664. A fatura cresce quando se considera o Legislativo (R$ 16.207 e R$ 28.593) e o Judiciário (R$ 17.246 e R$ 22.245).
O pretexto para poupar da tesoura o Legislativo e o Judiciário é a alegada independência dos poderes, usada como desculpa apenas na hora de aprovar medidas que desagradam a base do Executivo. “Quando o Executivo tem interesse, ele utiliza todos os meios disponíveis para influenciar os demais poderes. Isso é coerente?”, questionou o estudo técnico, ao relembrar que de junho a 11 de agosto de 2017 foram liberados R$ 4,3 bilhões para emendas parlamentares. No ano anterior, de junho a agosto de 2016, o valor foi de R$ 860,1 milhões para o mesmo objetivo e de janeiro a maio de 2017 o valor liberado foi de R$ 102,5 milhões.