As investidas sobre o serviço público, com o discurso orquestrado de autoridades do Executivo e do Legislativo sobre reforma administrativa, provocaram reações distintas. Os servidores estão perdidos diante da falta de proposta concreta do governo. Parte das categorias do funcionalismo federal quer diálogo e parte, o enfrentamento. Todos concordam, no entanto, que houve equivocada correção de rumos: o governo percebeu que teria dificuldade em concretizar a reforma tributária e decidiu cortar despesas a qualquer preço, afirmam.
O Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate) vai se encontrar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda esse mês (data a ser definida), e levar propostas sobre o assunto. A Confederação Nacional dos Trabalhadores Federais (Condsef, representa 80% do funcionalismo), com as centrais sindicais, fará um ato no dia 30, em frente ao Ministério da Economia, “para dar um duro recado a Guedes de que não será admitida retirada de direitos”.
Para Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Condsef, há muita especulação e pouca informação. “O governo joga notícias em várias frentes para ver a reação. Diante da situação, estamos nos preparando para alertar a sociedade sobre as mentiras. A estabilidade do servidor é um patrimônio do país e a máquina não é cara. A despesa com o servidor deveria ser de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL). Está em 40%. Vamos reagir ao desmonte do Estado”, avisou.
Por outro lado, a repentina convergência de pensamento entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o presidente Jair Bolsonaro, “tem toda cara de retaliação”, disse George Alex Lima de Souza, diretor-adjunto de Assuntos Parlamentares do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco). “Talvez querendo dar resposta a uma carreira específica que fez busca e apreensão em gabinetes. A reforma tributária deveria ser prioridade, para tirar o peso do Estado e salvar o empresariado”, disse.
Alternativas
No próximo dia 15, a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público vai lançar o documento “Reforma Administrativa do Governo Federal: contornos, mitos e alternativas”, no salão nobre da Câmara. “Se depender do servidor, vai ter diálogo e não beligerância. A nossa arma será o debate técnico”, destacou Rudinei Marques, presidente do Fonacate. Um dos principais mitos é o de que a estabilidade do funcionalismo é privilégio.
“Falso. A estabilidade é prerrogativa do cargo público para preservar a continuidade das políticas que atendem a população e para coibir a subjetividade do político na gestão da força de trabalho. E a administração já conta com instrumentos para dispensar o mau servidor. Entre 2003 e 2018 foram demitidos 7.500 servidores federais”, aponta o documento que também pretende mostrar, com números, que as reformas da previdência e administrativa não vão restaurar o crescimento econômico e o investimento público.
O governo já garantiu no passado que o desenvolvimento viria com a reforma trabalhista. E não aconteceu. “Com base nos anúncios do governo, medidas já tomadas, documentos do Banco Mundial e de consultorias privadas (dos economistas Armínio Fraga, Ana Carla Abrão Costa e Carlos Ari Sundfield), quatro diretrizes foram identificadas para controlar despesas e incrementar a produtividade no serviço público, todas elas falsas”, aponta a Frente, pois afirmam que as despesas com pessoal na União são muito altas e descontroladas.
“Hoje, em percentual do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas do país), as despesas são menores do que em 2002: 4,4% contra 4,8%. O crescimento recente se deve à estagnação do PIB”.Em 2014, antes da crise, as despesas chegaram a 3,8% do PIB. “Não há descontrole”, afirma o Fonacate. O Regime de Previdência (RPPS) também já está equacionado após 2013, com a instituição da previdência complementar. E por fim, não se sustentam as declarações que o Estado é intrinsecamente ineficiente. “Hoje fazemos mais do que no passado com o mesmo número de servidores, como mostram os dados de atendimento no SUS, concessão de benefícios a aposentados, alunos em universidades públicas, entre outros”.