“Sempre há um risco de casos isolados de empresas que usam a norma para se beneficiar unilateralmente. Esses casos, enquadrados nos termos da retirada de direitos, devem ser repudiados e denunciados pelos trabalhadores e seus sindicatos”
João Carlos Juruna
A Portaria 16.655/2020, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, veio possibilitar a recontratação de trabalhadores demitidos antes de 90 dias da data da dispensa no período da pandemia do Covid19.
Em tempos de normalidade, tal prática é proibida, considerada fraude, conforme a Portaria MTb 384/1992.
É bom que fique claro que a nova portaria, que flexibiliza a anterior, vale no contexto excepcional da pandemia. Portanto, se neste contexto, a empresa que demitiu um empregado e queira recontratá-lo, com os mesmos direitos e salário, em menos de três meses, ela torna isso possível.
Desta forma, a nova Portaria (16.655) não apenas facilita, como incentiva a recontratação de trabalhador dispensado.
Nestes termos, a Portaria pode ser entendida como a retirada temporária de uma trava à recontratação de trabalhadores.
A polêmica está no fato de que ela apresenta também a possibilidade de recontratação com alteração a menor dos termos diversos do contrato rescindido, desde que este seja um resultado de norma coletiva fixada pelo sindicato representativo da categoria.
Ou seja, o trabalhador pode ser recontratado por um salário menor, desde que isso seja negociado com o sindicato, via acordo ou convenção coletiva.
Neste caso, o sindicato pode negociar coletivamente uma situação diferenciada para a recontratação.
Mas isso não é novidade, e está previsto na Constituição de 1988 em seus artigos:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
…
VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
{…}
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
…
III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
…..
VI – é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;
{…}
Sempre há um risco de casos isolados de empresas que usam a norma para se beneficiar unilateralmente. Esses casos, enquadrados nos termos da retirada de direitos, devem ser repudiados e denunciados pelos trabalhadores e seus sindicatos.
Não podemos desconsiderar, entretanto, dada a situação alarmante, que exige medidas urgentes e excepcionais, que esse tipo de medida pode garantir os empregos.
Além disso, ela reconhece o papel e a responsabilidade do sindicato, que deve avaliar com os trabalhadores a pertinência de cada acordo.
A alta rotatividade de muitas categorias obrigará os sindicatos manterem a máxima atenção para evitar práticas escusas. É contra isso que várias categorias preveem em suas convenções coletivas clausulas que impedem a contratação na mesma função por salário menor.
O que a nova portaria vem permitir prioritariamente é a recontratação em prazo inferior a 90 dias, pelo mesmo salário e direitos da convenção ou acordo coletivo vigente. E bom frisar, durante a pandemia.
*João Carlos Gonçalves (Juruna) – Secretário geral da Força Sindical