Entrevista: Viviane Leal | Conheça a mulher que está à frente da empresa de Ronaldo Fenômeno

Publicado em Esporte
Viviane Leal trabalha com Ronaldo Fenômeno desde 2003. Fotos: Kin Saito/R9 Gestão

 

O time dela tem talento para transformar pesadelo em sono dos justos. Na semana do Dia Internacional da Mulher, minha personagem é Viviane Leal, CEO da R9 Gestão Patrimonial & Financeira. Quer uma dimensão do lugar ocupado por essa executiva? A firma é de Ronaldo “Fenômeno” e tem como sócio Gabriel Jesus, atacante titular do Manchester City e da Seleção Brasileira.

Em entrevista ao Correio, Viviane conta como driblou o preconceito para se consolidar em um mercado ainda machista como o futebol. Colaboradora do escritório pessoal de Ronaldo desde 2003, ela adquiriu experiência na área de gestão familiar. Em 2017, propôs ao jogador eleito três vezes melhor do mundo transformar seu family office em modelo de negócio. A tabelinha deu origem à R9 Gestão Patrimonial & Financeira, com linhas de serviço variadas e bem segmentadas para construir novas trajetórias econômicas de sucesso com outros jogadores.

Ela conta um “case” divertido que explica a missão da firma. Certo dia, um jogador chegou ao escritório relatando uma noite atribulada. Teve um pesadelo e sonhou que ficava pobre. A equipe de Viviane entrou em campo. Formatou o planejamento financeiro da família e organizou as contas. “Hoje em dia ele conta que não tem mais esses sonhos e o ambiente familiar está leve, como deve ser”.

O serviço também ajuda profissionais do futebol a perder o medo da linguagem financeira e administrar conquistas pessoais, esportivas e financeiras em série. O que fazer com a grana das premiações, o popular bicho, em séries de conquistas como a do Flamengo, campeão sete veze em duas temporadas? Viviane Leal dá dicas neste bate-papo.

 

Finanças e esporte ainda fazem parte de um mundo muito machista. Como é a vida de uma mulher à frente de uma empresa que trabalha nesses dois segmentos? Você enfrenta algum tipo de preconceito?

De fato, eu transito entre esses dois segmentos e vejo grandes transformações ao longo do tempo, de forma expressiva no mercado financeiro e com avanços no futebol. Não passa despercebido o preconceito velado, mas cada vez mais mulheres estão ocupando cargos de liderança. É um caminho natural e extremamente motivador ter essas referências no mercado.

 

Como é o seu trabalho na questão de assessoramento e planejamento financeiro? Os atletas de hoje têm mais consciência do cuidado com o patrimônio, principalmente, visando à aposentadoria?

É um trabalho em equipe, que envolve, primeiramente, o planejamento financeiro do atleta e da família. A partir das estratégias, expectativas, objetivos, necessidades e realidades específicas, o acompanhamento se torna uma prioridade. E aqui estamos falando em gestão financeira, patrimonial, de ativos, assessoria jurídica, fiscal, tributária e concierge. O pensamento para o desenvolvimento das ações é sempre o de longo prazo, levando em consideração as receitas e as despesas, para projetar os caminhos de uma vida financeira saudável na aposentadoria. E durante esse processo, a educação financeira também entra como um pilar, que dá para o cliente cada vez mais conhecimento, tranquilidade e confiança para tomar decisões.

 

Que tipo de aconselhamento você pode dar?

Vejo atletas, hoje em dia, com um pouco mais consciência, até mesmo pelos casos de insucesso do mercado. É preciso ter em mente que a parcela de jogadores que chega ao topo da pirâmide é pequena, e a carreira de um jogador de futebol, com geração de receita e tempo de trabalho é relativamente curta. Então, a preocupação com o longo prazo, gestão profissional e o planejamento financeiro, individual e familiar, são fundamentais.

 

Falando mais especificamente do trabalho com mulheres, sejam elas atletas ou esposas de atletas, existe algum tratamento à parte para atuar no “mundo feminino”? Quais são as particularidades e/ou atenções especiais com esse nicho?

Existe o tratamento igualitário sobre os serviços oferecidos e profissionais à disposição e existe o entendimento sobre as necessidades à parte. No R9 Gestão, 56% dos funcionários são mulheres, então, naturalmente, há uma identificação. No caso de esposas, é importante que estejam envolvidas no processo, com conhecimento das informações de forma organizada, para que também possam tomar decisões assertivas no planejamento financeiro familiar. Sobre clientes mulheres, o trabalho segue as mesmas áreas de atuação e o objetivo final passa pela busca de criar um volume maior e oferecer as mesmas condições e oportunidades que fazem parte da realidade do futebol masculino.

 

Transito entre esses dois segmentos (finanças e esporte) e vejo grandes transformações ao longo do tempo. Não passa despercebido o preconceito velado, mas cada vez mais mulheres estão ocupando cargos de liderança. É um caminho natural e motivador ter essas referências

 

Leila Pereira, patrocinadora do Palmeiras, pode terminar a temporada com três títulos. Edina Alves é a melhor árbitra do Brasil. Você administra os bens de um jogador eleito três vezes melhor do mundo. A Seleção feminina é comandada por uma mulher. Temos mulheres comentaristas. O futebol deixou de ser esporte machista ou ainda falta muito? Que conselhos pode dar a quem vislumbra entrar nesse mercado?

O futebol é um reflexo da sociedade, então, infelizmente, ainda temos essa e outras formas de preconceito presentes. Mas, como diz a Aline Pellegrino, uma de nossas clientes e referência em gestão do futebol feminino, vamos dar um passo de cada vez, e cada um será feito de forma sólida.

 

Ronaldo é um cara vitorioso dentro de campo e no mundo dos negócios. É correto dizer que ele é o maior “case” da sua carreira? O que aprendeu e o que ensinou a ele?

Ronaldo é um case do Brasil e do futebol mundial. Com ele, houve o entendimento, desde o início, que era necessário ter uma estrutura extracampo para o foco dele estar no campo. Um projeto de gestão construído por um time, para atender de forma 360º, tanto atleta, quanto família.

 

Você trabalha com o Ronaldo, um nome consagrado, mas também ajuda a cuidar dos negócios do Gabriel Jesus, um jogador de outra geração. Como é trabalhar com duas cabeças distintas no que diz respeito a investimentos?

Mesmo sendo de gerações diferentes, eu sempre brinco que Ronaldo e Gabriel possuem muitas semelhanças. Percebo que eles pensam de forma muito parecida. A forma como lidam com a família, o peso que dão para o ambiente familiar, a importância que dão para a gestão financeira, ter uma equipe todo dia, o entendimento que têm do longo prazo, inclusive, os dois iniciaram esse trabalho extracampo no início da carreira. Além disso, também vejo o Gabriel interessado na pluralidade dos negócios, muito participativo, e, apesar de novo, com uma cabeça empreendedora.

 

Sobre a nova geração, a tecnologia e o grande volume de dinheiro tornam desejos muito mais realizáveis. As oportunidades aparecem com urgência. É importante o acompanhamento. São nesses momentos de imediatismo que eles (jogadores) podem perder

 

Antigamente, os sonhos de consumo imediatos na Era Ronaldo eram comprar uma casa para a mãe e um carro do ano. Hoje, a nova geração tem outros desejos, muitas vezes bem mais imediatos…

Sobre a nova geração, a tecnologia e o grande volume de dinheiro no mercado do futebol tornam desejos muito mais realizáveis. E, da mesma forma, as oportunidades aparecem com urgência. Por isso é tão importante o planejamento e o acompanhamento, pois são nesses momentos de imediatismo que eles podem se perder.

 

Qual é o “case” mais curioso que você pode contar no trato com atletas?
Um cliente, que nos procurou há algum tempo, contou que sonhava, com frequência, que estava pobre. Tinha problemas familiares e precisava de ajuda. Então, fizemos o planejamento financeiro da família e organizamos todas as finanças. Hoje em dia, ele conta que não tem mais esses sonhos e o ambiente familiar está leve, como deve ser.

 

Algum outro? São sempre boas histórias…

Outro caso curioso é o do medo do linguajar financeiro. Existe essa crença de que é um assunto de difícil compreensão, até o momento em que estamos em reunião com o cliente para falar da gestão de ativos, por exemplo. A partir daí, ele entende, na prática, que existe todo o suporte para traduzir, explicar, tirar dúvidas, compartilhar informações, dividir conhecimento, enfim, realmente detalhar o plano de jogo na linguagem que faz sentido para ele.

 

O Flamengo acaba de conquistar sete títulos em duas temporadas. Consequentemente, há premiações, renovações de contrato, ganhos financeiros que vão além do salário e dos direitos de imagem. Que cuidados um jogador que participa de tantos títulos em tão pouco tempo deve tomar na projeção do futuro, já que a carreira de um jogador é curta e, muitas vezes, uma série de conquistas como essas não se repete?

Depende do planejamento financeiro do jogador. Tem atletas que conseguem guardar uma fatia maior do salário, por ter uma despesa menor. Para esses casos de jogadores que fazem um aporte mensal mais expressivo em investimentos, as premiações e os ganhos financeiros extras podem ser usados para uma aquisição, como fazer uma viagem, comprar uma casa, trocar o carro… Para jogadores que ainda estão em construção patrimonial, as premiações devem ser pensadas como aportes para investimentos.

 

*Entrevista publicada em 8.3.2021 na edição impressa do Correio Braziliense.

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