Donato EFE Donato: autor de um dos gols do título do La Coruña na temporada 1999/2000. Foto: EFE Donato: autor de um dos gols do título do La Coruña na temporada 1999/2000.

Entrevista: Donato. Ídolo do La Coruña fala sobre o zagueiro Pablo Marí, reforço do Flamengo

Publicado em Esporte

Ele começou no América-RJ, brilhou no Vasco, desembarcou na Europa vestindo a camisa do Atlético de Madrid, é ídolo do La Coruña e disputou a Eurocopa de 1996, na Inglaterra, pela seleção da Espanha. Versátil, o zagueiro e volante foi inscrito com a camisa 10 pelo técnico Javier Clemente. Aos 56 anos, o carioca Donato Gama da Silva mora na Espanha desde 1988. Reside em Coruña, onde é amado pela torcida do principal time da cidade — o Deportivo La Coruña.  

O único título do clube na história do Campeonato Espanhol tem a assinatura de Donato. Em 19 de maio de 2000, ele marcou de cabeça, aos 37 anos, o primeiro gol da vitória do La Coruña sobre o Espanyol pela última rodada de La Liga (assista ao vídeo no fim deste post). O holandês Roy Makaay completou o serviço e garantiu o inédito troféu com cinco pontos de vantagem sobre o Barcelona. Donato conquistou ainda a Copa do Rei em 1995 e 2002 e a Supercopa da Espanha em 1995, 2000 e 2002.

Atento ao que acontece no La Coruña, Donato acompanhou de perto a temporada do zagueiro espanhol Pablo Marí no clube galego. O beque foi contratado pelo Flamengo nesta semana. Com a experiência de quem conhece a posição, ele elogia o reforço e manda um recado aos clubes do futebol brasileiro na entrevista ao blog Drible de Corpo.

“Pra mim, a contratação de zagueiros europeus pelo futebol brasileiro é uma ótima ideia, sobretudo para times que queiram saída de bola. E o brasileiro não deve ficar com ciúmes ou com bobeira de que não pode ir jogador europeu para o Brasil. Hoje, tem muito jogador europeu aqui na primeira, na segunda divisão, que poderia estar jogando em times grandes do Brasil. Não tenho dúvida.”

 

Você jogou no Deportivo, mora em La Coruña e acompanha o time de perto. O que pode dizer sobre o zagueiro espanhol Pablo Marí?

Ele fez uma boa temporada. O time (Deportivo La Coruña) não subiu para a primeira divisão da Espanha, mas esse Pablo Marí fez uma boa temporada jogando ao lado do Domingos, um jogador que chegou do Sporting de Lisboa.

 

Você soube do interesse do Flamengo por ele?

Na verdade, eu sabia que o Flamengo necessitava de um zagueiro e estive a ponto de indicar o Domingos. Mas o Pablo Marí é um bom jogador, fez uma boa temporada e espero que ele tenha feito a escolha certa ao ir para o Flamengo.

 

Merece a oportunidade?

Pelo que fez aqui é um bom jogador. Titular no Deportivo La Coruña, fez uma bola dupla com o Domingos e torço para que tenha uma excelente passagem pelo Flamengo. Ele não tinha concorrência aqui e jogou toda a temporada.

 

O brasileiro naturalizado espanhol Donato em ação pela Fúria na Euro-1996

 

Você foi zagueiro do América-RJ, Vasco, Atlético de Madri, La Coruña e seleção da Espanha na Eurocopa 1996. Que análise faz do Pablo Marí?

O La Coruña é um time que quase sempre sai para o jogo com toque de bola, com a bola nos pés. Ele tem boa colocação, gosta de passes longos, tem bom campo de orientação e joga do lado esquerdo, é canhoto. Gosta muito de fazer virada de jogo para explorar a subida do lateral ou de um ponta-direita. Sabe sair jogando. Aliás, qualquer jogador hoje, aqui na Europa, tem que saber sair com a bola com pressão e sem pressão. Aqui se toca bem a bola.

Acha que ele terá dificuldade na adaptação ao futebol brasileiro?

A diferença que eu vejo aqui na Europa é que, às vezes, se marca muito mais na frente. No Brasil, geralmente tem uma dupla de volantes que joga na frente dos zagueiros, então, consequentemente, os times defendem muito mais atrás. Pelo que ele fez aqui, é um jogador de boa colocação, bom na bola aérea e tem uma virtude grande, que é essa mudança de orientação. Poucos zagueiros fazem isso. Está do lado esquerdo e vira a bola para o direito quando está apertado. Isso é muito interessante no estilo dele.

 

Ele tem boa colocação, gosta de passes longos, tem bom campo de orientação e joga do lado esquerdo, é canhoto. Gosta muito de fazer virada de jogo para explorar a subida do lateral ou de um ponta-direita. Sabe sair jogando. Aliás, qualquer jogador hoje, aqui na Europa, tem que saber sair com a bola com pressão e sem pressão. Aqui se toca bem a bola.

 

Mas se você tivesse que indicar um zagueiro do La Coruña ao Flamengo…

Eu gosto mais do Domingos, mas se o Flamengo contratou o Pablo, imagino que o Flamengo necessitava de um zagueiro que jogue pelo lado esquerdo. Domingos joga do lado direito.

 

O Brasil é uma fábrica de bons zagueiros. Na sua época, por exemplo, surgiram vários. Assusta ver clubes grandes do futebol brasileiro buscando beques no exterior?

Estou na Espanha há 31 anos, desde 1988, quando vim para o Atlético de Madri. Eu do Vasco. Naquela época, a gente ganhava fácil dos gringos aqui, que era como a gente chamava os europeus na época (risos). Naquela época, o Vasco ganhou três troféus Ramon de Carranza seguidos (1987, 1988 e 1989). Daquele tempo para cá eu tenho acompanhado o futebol brasileiro, a evolução do futebol europeu. O Brasil sempre foi uma fábrica de grandes jogadores, de zagueiros, principalmente. Luis Pereira é querido aqui no Atlético de Madrid. Ricardo Gomes, Mozer atuaram na Europa, Luisinho, do Atlético-MG, sem contar Piazza, Oscar… O Brasil era uma fábrica de tudo. Os melhores zagueiros, laterais, cabeça de área, centroavantes… Só que, agora, os times brasileiros não estão conseguindo que esses jogadores fiquem no Brasil. Com menos de 20 anos estão indo embora do Brasil.

 

Donato em ação pelo Vasco contra o Flamengo de Bebeto nos anos 1980

 

Você quer dizer que ele está sendo lapidado na Europa?

O jogador brasileiro está vindo aprender aqui. Tem o tempo de adaptação, como é o caso do Vinicius (Júnior), agora vem o Rodrygo também, eu fico contente com a vinda de jogadores brasileiros para cá, mas dá pena do futebol brasileiro. Está todo mundo fora. Hoje, você pergunta o nome de um craque do Flamengo e falam o nome de um jogador estrangeiro. Você pergunta o nome do craque de um time grande e as pessoas ficam pensando quem.

 

Pra mim, a contratação de zagueiros europeus pelo futebol brasileiro é uma ótima ideia, sobretudo para times que queiram saída de bola.  E o brasileiro não deve ficar com ciúmes ou com bobeira de que não pode ir jogador europeu para o Brasil. Hoje, tem muito jogador europeu aqui na primeira, na segunda divisão, que poderia estar jogando em times grandes do Brasil. Não tenho dúvida.

 

Assusta o Flamengo buscar um zagueiro espanhol ou é sinal dos tempos?

Pra mim, não é novidade. Eu sempre pensei, estando aqui na Espanha, em trabalhar para ajudar o futebol brasileiro. Eu posso indicar grandes jogadores daqui para os times daí. Aqui tem muitos jogadores bons, muitos zagueiros bons, bem trabalhados. O futebol europeu está muito bem na formação de zagueiros. O zagueiro mais caro do mundo está hoje no Liverpool (Virgil van Dijk). Os caras estão contratando zagueiros aqui na Europa, e zagueiros bons. As coisas inverteram. O Brasil continua sendo uma fábrica, mas se não tem condição de segurar o jogador aí fica difícil.

 

O método de trabalho europeu deixou o Brasil para trás?

Estou aqui na Espanha há 31 anos. Quando vou ao Brasil, os treinamentos são praticamente os mesmos do meu tempo. Estou falando de 31 anos atrás, anos 1980. Aqui houve uma evolução tremenda entre os treinadores, preparadores físicos, no trabalho de campo com bola. É uma coisa diferente. Zagueiros aqui sabem sair jogando. Se no Brasil tem algum treinador que gosta de sair jogando com a bola, aqui na Europa está cheio de jogador, principalmente homens de defesa, que sabem sair jogando. É assim na primeira divisão, na segunda, na segunda B…  Você vê jogo da segunda B e fica impressionado com a facilidade que o pessoal toca a bola e sai jogando. São influenciados pelo Barcelona e pela seleção da Espanha. Goleiros e zagueiros são obrigados a sair jogando, a fugir da pressão que se faz hoje aqui na Europa.

 

Estou aqui na Espanha há 31 anos. Quando vou ao Brasil, os treinamentos são praticamente os mesmos do meu tempo. Estou falando de 31 anos atrás, anos 1980. Aqui houve uma evolução tremenda entre os treinadores, preparadores físicos, no trabalho de campo com bola. É uma coisa diferente. Zagueiros aqui sabem sair jogando. Se no Brasil tem algum treinador que gosta de sair jogando com a bola, aqui na Europa está cheio de jogador, principalmente homens de defesa, que sabem sair jogando.

 

O Flamengo agiu certo então ao buscar Pablo Marí?

Pra mim, a contratação de zagueiros europeus pelo futebol brasileiro é uma ótima ideia, sobretudo para times que queiram saída de bola.  E o brasileiro não deve ficar com ciúmes ou com bobeira de que não pode ir jogador europeu para o Brasil. Hoje, tem muito jogador europeu aqui na primeira, na segunda divisão, que poderia estar jogando em times grandes do Brasil. Não tenho dúvida. Estou contente que o Flamengo tenha contratado o Pablo Marí, um jogador da segunda divisão, acho até aqui tem mais. Eu acredito que o Domingos teria muita condição de trabalhar aí no Brasil. Assim com ele e o Marí, tem muitos zagueiros que poderiam estar aí no Brasil. Não estou menosprezando os zagueiros daí, é a situação do Brasil. Hoje, um jogador brasileiro que vem pra cá tem necessidade de três meses de adaptação.

 

 

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