Quase metade dos consumidores de carros chamados para recall não vão

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Mais de seis milhões de veículos no Brasil foram convocados para algum tipo de recall nos últimos 10 anos e quase a metade dos consumidores afetados – 44,72% – não procurou as montadoras ou importadoras para trocar a peça defeituosa. O que significa que 2,7 milhões de automóveis entre carros, motos, caminhões e ônibus podem estar circulando nas pistas brasileiras com algum tipo de defeito. Entre as peças que teriam que ser trocadas estão importantes itens de segurança como o sistema de freios, de rodas, cinto de segurança e airbag.

De acordo com relatório da Fundação Procon de São Paulo, de 2002 a 2012, 82 campanhas para troca de alguma peça do sistema de freios foram realizadas, afetando 604.589 veículos. Porém, 35,48% dos consumidores convocados não procuraram a fabricante para trocar o item defeituoso. No caso do sistema de airbag, o índice é ainda mais preocupante. Apenas 15,78% dos donos de veículos participaram das 16 campanhas feitas.

O descuido preocupa autoridades e especialistas de trânsito. “Essa situação é muito perigosa porque um veículo defeituoso oferece risco para todo mundo, não só para o condutor do carro como para todos os que estão no trânsito”, afirma Paulo César Marques, professor de engenharia de tráfego da Universidade de Brasília.

Para que mais consumidores participem das campanhas de recall e acidentes sejam evitados, desde março de 2011 está em vigor uma portaria do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) que obriga as montadoras a enviar relatórios com a quantidade de atendimentos realizados. A informação recebida é processada pelo Denatran e incluída no sistema do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam).

Se passar um ano do início da campanha de recall e o proprietário do veículo não fizer a troca da peça, a informação de que o recall não foi feito naquele carro ficará registrada no Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo. O documento é substituído a cada ano, após o pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Dessa forma, um futuro comprador do carro usado saberá que o automóvel que está adquirindo passou por recall e se ele foi feito ou não pelo antigo proprietário.

Caso o veículo seja posteriormente levado para reparo, a informação sobre o recall será atualizada na documentação. Lembrando que o consumidor deve receber um documento que comprove o comparecimento ao recall, com detalhes do conserto e dados do atendimento.

 Motivos

A falta de informação e a dificuldade para fazer o recall são dois fatores apontados por especialistas para justificar a ausência de parte dos consumidores nos recalls. Muitas vezes os proprietários dos veículos nem ficam sabendo da campanha, seja porque a montadora fez um anúncio pequeno, seja porque o comunicado circulou em horários que o consumidor não costuma assistir televisão ou ouvir rádio, por exemplo.

Outro problema que desestimula o consumidor é a dificuldade logística que as montadoras têm para fazer o recall. Isso ocorre porque boa parte do parque industrial automotivo está concentrado em São Paulo e nem sempre as montadoras conseguem repassar a toda a rede de concessionárias a quantidade de peças necessárias em pouco tempo. A demora para chegar a peça em determinada cidade também contribui para o desestímulo do consumidor em fazer o recall.

A arquiteta Lea Tiemi Justiniano, 42 anos, por exemplo, só conseguiu fazer o recall depois de três meses do comunicado da campanha. Ela viu pela TV que o carro dela, um Sentra Nissan automático precisaria trocar o conector de bateria devido a um problema de fábrica. Logo em seguida, a arquiteta entrou em contato com a concessionária local, conforme orientação do anúncio. A concessionária informou então que entraria em contato com a proprietária para agendar a troca da peça.

Passados quase três meses do contato de Lea com a concessionária, ela recebeu uma ligação da Nissan de São Paulo avisando que a peça chegaria a Brasília dentro de poucos dias, portanto, ela já poderia ligar para marcar o conserto na concessionária. “Foi o que eu fiz e aconteceu. Assim que eu soube do recall fiquei um pouco preocupada porque eu viajo com as crianças. Além disso, nunca tinha tido um carro automático e não sabia quais seriam as possíves consequências de manter a peça defeituosa”, conta.

Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) a falta de informação é a principal causa da ausência dos consumidores nas campanhas de recall. A associação acredita que falta ação mais enérgica dos governos em alertar a população. “Os anúncios oferecidos pelas empresas não são suficientes para abranger todos os consumidores e o Código de Defesa do Consumidor determina que os estados, os municípios e a União também ajudem a informar”, afirma Daniel Mendes, advogado do Idec. Ele argumenta que não há negligência do consumidor. “O consumidor não vai arriscar sofrer um acidente sabendo que tem como trocar a peça ou a mercadoria”, analisa Daniel.

O diretor geral do Procon-DF, Oswaldo Morais, defende que a parte do governo e dos Procons estão sendo bem executadas. “O que a lei obriga está sendo cumprido pelo estado e pelas empresas. O que está faltando é o interesse do consumidor em buscar a execução do serviço”, argumenta. Oswaldo explica que o consumidor que tiver dificuldades para realizar o recall pode procurar o Procon e fazer a reclamação.

Para saber mais

A palavra recall, de origem inglesa, é utilizada no Brasil para indicar o procedimento, previsto em lei, de chamar de volta os consumidores em razão de defeitos verificados em produtos ou serviços colocados no mercado, evitando, assim, a ocorrência de acidentes de consumo. O chamamento (recall), ou Aviso de Risco, tem por objetivo proteger e preservar a vida, saúde, integridade e segurança do consumidor, bem como evitar prejuízos materiais e morais.

O que diz a lei

O recall está previsto no artigo 10 do Código de Defesa do Consumidor. A lei determina que a empresa “não poderá colocar no mercado produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde e segurança”. Caso a empresa coloque um produto no mercado e depois perceba que ele pode colocar a saúde do consumidor em risco, ela deve comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores por meio de anúncios publicitários. Esses anúncios devem ser veiculados na imprensa, rádio e televisão. União, estados, municípios e o Distrito Federal deverão também informar os consumidores sobre o recall.

Numerária

6.258.946

Total de veículos que passaram por campanha de recall no Brasil nos últimos 10 anos

440

Campanhas de recall  de veículos nos últimos 10 anos

77,6%

Das campanhas de recall dos últimos 10 anos foram de veículos

2.799.141

Quantidade de consumidores que não fizeram o recall de veículos no Brasil nos últimos 10 anos

44,72%

Dos consumidores não fizeram os recalls nos últimos 10 anos

358.895

Total de veículos que passaram por campanha de recall no Brasil em 2012

87,7% dos recalls realizados em 2012 eram de veículos

Defeito        % de afetados que não fizeram o recall

Freios        35,48%

Projeto / fabricação/ montagem do veículo    95,53%

Sistema de combustível        32,42%

Sistema de direção    46,56%

Suspensão e amortecedores    48,13%

Itens elétricos  (adaptador, bateria, interruptor, transformador)    78,56%

Tração (câmbio, embreagem, eixo)    32,07%

Motor        78,82%

Rodas        35,71%

Cinto de segurança    47,41%

Sistema de fechamento (de portas, vidros, capô, capota, teto solar, etc)        75,2%

Airbag        84,22%

Aceleração    21,46%

Arrefecimento        33,49%

Limpador de pára-brisa        15,88%

Chassi        43,27%

Piloto Automático    78,91%

* Fonte: Procon-SP // A porcentagem refere-se ao período de 01/01/2002 a 30/01/2013