‘Não podemos deixar que o Código venha a correr o risco de perder o que foi conquistado’, afirma vice-relator do CDC

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José Geraldo Brito Filomeno

Vice-presidente e relator dos trabalhos da comissão que elaborou o anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor entre 1988 e 1990.

Correio: Como era trabalhar no projeto de um Código de Defesa do Consumidor em um país que voltava há pouco para a democracia?

Filomeno:  O biênio 1987-88 foi um período extremamente favorável para a elaboração do anteprojeto do código do consumidor: os movimentos de sua defesa acabaram por conseguir que a sua própria defesa e proteção fosse colocada como um dos direitos fundamentais da Constituição de 1988, determinando, expressamente, que ao Estado caberia a defesa do consumidor mediante uma lei específica. Os trabalhos de redação do anteprojeto começaram em junho de 1988, por meio de nossa comissão, instituída pelo extinto Conselho Nacional de Defesa do Consumidor. E todos os passos dos nossos trabalhos eram reportados ao referido conselho, de que participavam, ativamente, representantes do setor produtivo e todas as forças vivas da sociedade civil interessadas nessa revolucionária lei.

Correio:  Quais eram as principais dificuldades para fazer o anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor?  Tinha muita pressão dos setores produtivos? Na época, chegou-se a cogitar um desabastecimento por causa da lei…

Filomeno: É evidente que tenha havido debates, muitas vezes acalorados entre os diversos interessados. No início, aliás, a própria imprensa, ao ouvir setores mais radicais, sobretudo, da indústria, dizia que uma lei extremamente “perigosa” estava em gestação, por “um grupo de terroristas jurídicos!” E que isto seria “o começo do fim” da atividade produtiva. Os setores econômicos, porém, logo entenderam a importância do Código do Consumidor para eles mesmos, uma vez que ele prevê, claro, sanções para os maus fornecedores de produtos e serviços.

Correio: Na opinião do senhor, 25 anos depois, o Código de Defesa do Consumidor é exercido em sua plenitude? Ele é exercido como os senhores propuseram quando elaboraram o anteprojeto?

Filomeno: Penso que muito se caminhou nesses 25 anos: as empresas procuraram se adaptar ao novo código, esforçando-se para o atingimento de seus objetivos, ao mesmo tempo em que órgãos públicos e entidades civis se prepararam para os novos desafios. Ainda há uma longa marcha a demandar maior informação aos próprios consumidores sobre os seus direitos e, sobretudo, uma maior atenção da parte dos fornecedores, no sentido de diminuírem seus “passivos”, ou seja, pendências e reclamações não atendidas ou mal atendidas, o mesmo acontecendo com os órgãos do Judiciário, dos quais se espera maior celeridade na condução dos feitos relativos às relações de consumo. Parece-me igualmente de vital importância a educação formal do consumidor, desde tenra idade, até os bancos universitários, e a informação, pelos múltiplos meios de comunicação social.

Correio: O que o senhor espera para os próximos 25 anos? A atualização que está no Senado é um bom começo?

Filomeno: O que se espera é que o código funcione, efetivamente, e cada vez mais. Com relação a modificações, não acho as propostas feitas nem convenientes, muito menos oportunas. O que posso afirmar é que, trabalhando nessa área há 32 anos e à luz da experiência, não podemos deixar que o Código venha a correr o risco de perder o que já foi arduamente conquistado, e sim ser cada vez mais implementado para o bem do consumidor … e do fornecedor, também.