A dívida mudou, os problemas aumentam

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Empresas de telefonia, de cartão de crédito e bancos cedem as carteiras de dívidas de seus clientes para cobradoras especializadas. Embora a ação esteja prevista em lei, ela tem causado muita dor de cabeça ao cliente devedor, uma vez que, o repasse dos débitos nem sempre cumpre os procedimentos legais. Dessa forma, o consumidor acaba perdido sem saber para quem deve, com quem negociar e como pode quitar a dívida.

A cessão de crédito é prevista no Código Civil e o credor tem direito de cobrar. Porém, o que vem ocorrendo é que as empresas vendem as dívidas dos clientes, não os comunica e eles acabam sem orientação do que fazer e a quem pagar. Esse é só o início das dúvidas. Entre os principais problemas enfrentados pelo consumidor além da falta de aviso prévio da mudança do cobrador, estão a dúvida sobre a manutenção do contrato firmado com o credor primário, a data de prescrição da dívida e a dificuldade na renegociação. No meio dessa situação complicada, o consumidor não sabe o que fazer e o seu nome pode ir parar nos os órgãos de proteção ao crédito, o que gera uma série de transtornos.

Quando o débito em aberto de um cliente é vendido, o devedor não deve mais àquela empresa que ele contraiu a dívida, mas sim, a outra. Para que ocorra o repasse do débito, existe uma série de critérios que devem ser seguidos. O primeiro deles é o anúncio formal da cessão. Por mais que o consumidor não possa impedir o repasse da dívida, porque o processo é permitido por lei, ele deve ser informado.

Porém, como boa parte das empresas não comunica ao consumidor da mudança, quando ele recebe o boleto da nova empresa e as ligações de cobrança, começa a confusão. “Muitas empresas alegam que mandaram a carta comunicando das modificações, mas não encontram o consumidor e por isso ele não foi avisado. O que é uma mentira. Porque o boleto de cobrança chega e no mesmo endereço”, alerta Tatiana Viola de Queiroz, advogada da Associação de Consumidores Proteste.

Ildecer Amorim, presidente da Comissão de Direitos do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, seção DF, explique que, caso o devedor não seja comunicado da cessão de crédito, ela não é válida. “O consumidor precisa estar ciente porque o contrato não pode ser modificado. O que vale é o documento assinado na contratação do serviço que culminou na dívida”, explica. Dessa forma, o prazo, o percentual de juros e o valor da parcela será sempre o firmado entre o consumidor e a empresa onde ele adquiriu o bem ou o empréstimo e não quitou.

Contrato

Muitas cobradoras têm o hábito de fazer outro contrato ou então não cumprir o que foi acordado no passado com a primeira empresa. Aí a vida do consumidor vira uma confusão. Ele não sabe com quem negociar, quais são as condições de negociação e quando a dívida prescreve. Foi o que ocorreu com o professor José Roberto dos Anjos, 57 anos. Ele fez um empréstimo pessoa física com o Banco do Brasil em 2011. Em setembro de 2012, não conseguiu pagar o valor da parcela e ficou inadimplente com a instituição financeira.

De acordo com José Roberto, ele foi três vezes à agência do Banco do Brasil, tentou renegociar e não conseguiu. Para surpresa do professor, um dia recebeu uma ligação da MRL Cobradora comunicando que havia uma quantia em aberto. “Eu só soube que se tratava da dívida com o Banco do Brasil porque a atendente mencionou algo por alto. A partir daí começou o tormento. Me ligavam várias vezes por dia. Para piorar, a atendente que me ligava quase todos os dias era muito má educada”, conta.

                               

José Roberto foi novamente ao Banco do Brasil para renegociar porque precisava do nome limpo, já que tinha sido contemplado pelo programa do governo Morar Mais. Lá foi informado que deveria negociar com a MRL, que não aceitou aumentar o prazo, nem diminuir a parcela. “Como eu precisava do nome limpo, aceitei. Mas não consegui pagar e agora estou devendo de novo. Eu quero pagar e não consigo”, reclama.

Por meio de nota, o Banco do Brasil comunicou que “o serviço de cobrança do BB é pensado para a conveniência do cliente. Mas o mesmo pode realizar um acordo tanto pelas empresas terceirizadas, quanto nas agências do Banco. No caso específico do cliente, as informações estão protegidas por sigilo bancário.”

Cobrança vexatória

 Como as empresas cobradoras precisam receber para ter caixa, algumas costumam ser agressivas na maneira de cobrar o consumidor. Dependendo da forma em que a abordagem for feita, ela pode ser considera vexatória, o que é proibido pelo Código de Defesa do Consumidor. Apesar de a lei não especificar o que pode ser considerado vexatório, associações de defesa do consumidor e a OAB têm alguns entendimentos a respeito.

Para as entidades de defesa, a partir do momento em que o consumidor se sentir incomodado com a abordagem, ele pode reclamar do tratamento à empresa e, dependendo da gravidade, até recorrer à Justiça pedindo dano moral. Entre as situações constrangedoras estão os inúmeros telefonemas à casa, ou então, os recados deixados pelos atendentes no trabalho e na residência citando a dívida em aberto.

O que diz a lei:

A cessão de crédito está prevista nos artigos 286 a 298 do Código Civil e é regulada pelo Banco Central do Brasil. Essa modalidade é o negócio jurídico pelo qual o credor transfere a um terceiro, chamado cessionário, sua posição ativa no recebimento do débito. Essa transação ocorre independente da autorização do devedor, porém, ele deve ser comunicado da mudança. A transferência pode ser onerosa ou gratuita.

>> Tira dúvidas sobre a cessão de crédito:

1. Terceirização de dívida

A prática não é ilegal. Uma empresa pode vender ou ceder os direitos de um débito para outra, desde que siga os procedimentos legais.

2. Empresas que costumam terceirizar débitos

Bancos, instituições financeiras,operadoras de telefonia, companhias de cartão de crédito, etc.

3.Comunicado

O devedor deve ser avisado de que a cobrança da dívida foi repassada para outra empresa via documento oficial.

4.Contrato

O contrato entre o devedor e o credor não pode ser modificado. Deve permanecer o mesmo acordado na data da contratação do serviço, isso inclui mesma porcentagem de juros, valor da multa, prazo para pagamento, etc. Se isso não ocorrer, o consumidor pode discordar e questionar na justiça.


5. Negociação

A partir do momento em que a dívida foi terceirizada, as negociações de valores, prazos e juros, devem ser feitas com a nova empresa. Sempre seguindo o contrato assinado na época da contratação do serviço.

6. Cobrança vexatória

O credor tem direito de cobrar a dívida. Porém, não deve fazê-la de forma vexatória, como deixar recados comunicando do débito em aberto com parentes, vizinhos ou colegas de trabalho. Essa situação pode caracterizar dano moral e pode gerar indenização para o consumidor. Cobranças nos fins de semana ou prática de telefonar várias vezes no mesmo dia, também pode gerar indenizações.


7. Prescrição da dívida

A maior parte das dívidas diárias, como boletos bancários, cartões de crédito e convênio médico, por exemplo, prescreve em cinco anos. Outros tipos de dívidas possuem prazo maior, mas nunca ultrapassa 10 anos. No caso da terceirização da dívida, o cálculo da prescrição é feito a partir da data do vencimento do débito, não a partir da aquisição da dívida por outra empresa.