Wanderlei Pozzembom/CB.

Cristovam Buarque sugeriu programa semelhante ao ‘Pé de Meia’ em 2003

Publicado em Eixo Capital, Entrevistas

Por Ana Maria Campos — À QUEIMA-ROUPA: Cristovam Buarque, ex-governador do DF, ex-senador e ex-ministro da Educação

O governo Lula adotou o projeto Poupança Escola, que foi implementado originalmente na sua gestão como governador no DF. Por que só agora e não quando o senhor era ministro da Educação?

A Poupança Escola está proposta para o Brasil inteiro em meu livro “A Revolução nas Prioridades” escrito ainda no final dos anos 1980. Foi adotada no DF no primeiro ano do meu governo pelo PT. Fizemos o depósito até 1998. Em 2003, quando ministro, mandei para a Casa Civil o projeto de lei para fazer o Poupança Escola Nacional. Por alguma razão o governo preferiu não levar adiante. Só agora retomou, 20 anos depois. Coloquei a proposta no programa de minha campanha presidencial em 2006.

Qual é a diferença entre o seu programa e o adotado agora?

Uma diferença boa para a proposta atual é que o governo Lula prevê o pagamento de uma bolsa mensal, além da poupanca. A diferença ruim está na visão assistencialista no nome Pé de Meia, no lugar da ênfase na escola. O objetivo ficou sendo a poupança em dinheiro, não o acúmulo de conhecimento que o aluno adquire. O mesmo aconteceu quando mudaram o nome de Bolsa Escola para Bolsa Família.

Por que o Poupança Escola foi extinto no DF? Nenhum outro governador abraçou a ideia?

Porque eu perdi a eleição em 1998 e o eleito, governador Roriz, decidiu extinguir. Seria bom saber o que o BRB fez com o dinheiro depositado em poupança no nome de milhares de alunos. Tentei que Agnelo e Rollemberg retomassem. Não sei por que não se interessaram. Isto pode acontecer com o programa Pé de Meia.

Acredita que a ajuda financeira realmente mantém estudantes na sala de aula?

Sem dúvida que o programa do presidente Lula e do ministro Camilo terá um papel fundamental para garantir que milhões de jovens concluam o ensino médio. O Brasil precisa agradecer aos dois por ressuscitar o programa brasiliense. Mas o resultado concreto será pequeno se não melhorar a qualidade da escola. Para isto, além da Poupança será preciso que o governo federal adote o ensino médio com mais escolas federais.

Acha que sua gestão no ministério da Educação poderia ter avançado mais se houvesse apoio político?

Sim. Faltou apoio político que me deixasse ficar mais de 12 meses no cargo. Mas isso seria difícil por falha minha ao não construir este apoio e também por causa da orientação divergente entre mim e o presidente: meu compromisso era com a educação de base, e o Lula sempre teve clara preferência por investir no ensino superior. O orgulho dele sempre foi que hoje temos, graças a ele, alguns filhos de pobres no ensino superior, e o meu sempre foi que os filhos pobres tenham acesso a escolas com a mesma qualidade que as escolas dos filhos dos ricos. Esta foi minha bandeira como ministro e como candidato a presidente e como senador até perder a eleição em 2018. Sinto que Lula evoluiu: ele tem falado mais na educação de base.

O ex-ministro José Dirceu tem dado entrevistas e disse que a meta do PT é permanecer pelo menos 12 anos no poder. Ele ajuda ou atrapalha?

Fiquei preocupado: se ele pensa apenas 12 anos, deve achar que o Brasil vai acabar em 2036.