Nossa Matrix

Publicado em ÍNTEGRA

VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Imagem: reprodução da internet

Matrix talvez seja a palavra que mais se tem ouvido falar nesse começo de século desde o lançamento do filme de ficção do mesmo nome em março de 1999. Para os dicionários a palavra matrix remete a ideia de uma realidade virtual criada por máquinas para aprisionar a mente humana. Nesse contexto é possível se falar em uma espécie de matrix política ou de um Estado que não é senão uma matrix a aprisionar os indivíduos dentro de um sistema que beneficia apenas aqueles que estão próximos ao poder. É possível que no Brasil exista uma verdadeira matrix política, destinada a explorar os cidadãos, enganando-os com promessas que jamais serão realizadas. É possível também que exista entre nós poderes da República que não passam de matrix.

Veja o caso atual da nossa justiça, operando de acordo com que acreditam e ditam os juízes, mesmo que isso contrarie o senso comum e a própria Constituição, relegada a uma espécie de ordenamento jurídico disfuncional. O Brasil atual nesse contexto não seria a materialização da própria matrix. Estaríamos assim imersos num autêntico e distópico “show de Trumann”? Não sabemos, mas temos muito que desconfiar. Nesse sentido, a matrix política seria um conjunto de estruturas interligadas que produzem ilusão de escolha e bloqueio de saída. O primeiro pilar pode ser observado na corrupção endêmica e na impunidade sem fim, que distorcem o jogo público de maneira desnudada. O índice de percepção da corrupção coloca o Brasil em patamar que não inspira confiança coletiva. Essa taxa de corrupção funciona como uma camada que filtra informações e decisões em favor de interesses particulares. Mesmo quando há melhora pontual, o desenho estrutural da desigualdade persiste e mantém a maioria numa espécie de periferias de poder, sem voz e sem futuro. A desigualdade e corrupção formam assim, um terreno fértil onde favores, clientelismo e captura de políticas florescem sem serem jamais interrompidos.

Há ainda entre nós, a concentração excessiva e a captura da informação pública. A censura é arma que aprisiona. Também se nota a existência de um sistema de mídia concentrado e frequentemente alinhado a grandes interesses corporativos, reduzindo o espaço público plural. É fato que quando poucas vozes moldam a agenda, o debate vira espetáculo e não deliberação. Por outro lado, a erosão da esfera digital, contribui para a desinformação e censura seletiva, corroendo a  confiança e alienando o indivíduo.

A internet, que poderia ser saída do labirinto, muitas vezes reproduz câmaras de eco e fábricas de mentiras, tornando o labirinto ainda mais perigoso.  Somando a isso o fato de termos um judiciário em posição ambivalente, para não dizer político-partidária, que ao mesmo tempo em que se faz de corretor institucional, gera e é objeto de controvérsias, muitas das quais insolúveis. Nesse ponto vemos que decisões judiciais de grande impacto político acabam se tornando em lentes que ampliam divisões e alimentam, cada vez mais, narrativas de injustiça. Todos esses fatores agem como camadas sobrepostas que criam aparência de uma normalidade, que de fato não existe.

No centro dessa matrix há um mecanismo simples que conduz a legitimação contínua do sistema. Ele opera por repetição, leis, sentenças, manchetes, que vão moldando pouco a pouco o senso comum. A legitimação transforma exceções em regras e reverbera como fato consumado. É a vontade repetida à exaustão. A lógica é a mesma da ficção: repetição é igual a realidade. Os mecanismos formais tornam-se então instrumentos de interesses, não apenas regras neutras.

As políticas públicas capturadas por clientelismo deixam a população dependente de grãos propiciatórios. A burocracia ajuda na materialização dessa matrix. O eleitor, imerso nesse oceano de faz-de-conta, vê benefícios pontuais e confunde-os com reformas estruturais. Enquanto isso, as redes de poder preservam o status quo. Exemplo concreto: contratos públicos e cadeias de favorecimento que atravessam esferas federais, estaduais e municipais.

Outro exemplo mostra que publicidade oficial direciona recursos e influencia redações locais, como tem denunciado repetidas vezes os Repórteres Sem Fronteiras. No labirinto, as poucas saídas interpretativas são bloqueadas por narrativas hegemônicas. Qualquer tentativa de desviar do roteiro é rapidamente cooptada ou demonizada. A polarização atua como um bloqueador, reduzindo o campo do debate a identidades e símbolos. Em vez de discutir políticas concretas, disputamos peças de cena. Como resultado vemos a perda de capacidade coletiva de deliberar e construir soluções complexas.

Outro elemento dessa matrix produz conscientemente a fragilidade das instituições de controle democrático. Temos assim que tribunais de contas, ministérios públicos e parlamentos sofrem tensões que limitam sua ação efetiva. É sabido que quando órgãos de controle são instrumentalizados, a matrix ganha blindagem jurídica. A blindagem jurídica torna a retórica de transparência inócua na prática. A cidadania representativa entra em choque com estruturas que atuam fora do escrutínio. O eleitor sente-se traído e impotente, reação perfeita para a perpetuação do labirinto. Há custos reais: investimentos, serviços públicos, confiança e coesão social. Uma sociedade aprisionada na matrix paga com redução de oportunidades e erosão do tecido institucional. Mas a matrix não é completa; há frestas e rupturas possíveis. A história mostra que crises e mobilizações podem abrir caminhos. Todavia, no Brasil atual, essas rupturas são frequentemente capturadas por forças políticas que se apresentam como “salvadoras”. Surgem então líderes que prometem saída fácil, mas reconstroem a mesma ordem com outros atores.

A frase que foi pronunciada:

“Emocionante ver o que o Brasil faz por essas pessoas (Venezuelanos) um daqueles senhores levantou … esse é o bom Brasil. Da paz, que acolhe as pessoas.”

Ministro Barroso emocionado com a situação dos venezuelanos

Foto: Nelson Jr./STF/Divulgação

 

História de Brasília

Seguidas vezes, oradores improvisados eram levantados nos braços, e os gritos e vaias impediam que êles falassem. Foi ordeiro, o movimento, mas se melhor organizado, renderia muito mais. (Publicada em 10.05.1962)

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