VISTO, LIDO E OUVIDO, criada por Ari Cunha (In memoriam)
Desde 1960, com Circe Cunha e Mamfil
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Nossa imagem e o que pensam da gente aqueles que nos observam de fora e de longe, quase sempre não coincide com aquilo que pensamos de nós próprios. O motivo, dentre vários, é que acreditamos ser o que gostaríamos de ser e quase nunca o que somos de fato. No espelho do ego, nos vemos como nosso ego nos enxerga e não com as diversas fantasias que exibimos para parecermos um personagem aceitável perante a plateia. Assim acontece com o Brasil.
Observado do exterior, ainda é visto como um país tropical, exótico e violento, cheio de contradições, exibindo uma imagem que parece andar na contramão do mundo civilizado. Um país que, desafiando regras e impondo outras que parecem modernas, tenta, desesperadamente, esconder o medo de se mostrar ridículo aos olhos de todos. Também não parece ser exagero, já que muitos reconhecem que possuímos a classe política e dirigente mais cara e corrupta de todo o planeta, ao mesmo tempo em que mantemos os professores mais baratos do mundo e um alunado que dia após dia mantem e confirma sua posição na rabeira dos rankings internacionais que medem a qualidade do ensino público.
Para qualquer setor da vida pública do país que miramos nossa atenção, as contradições e o exotismo estão presentes. Condenamos e prendemos em nossas masmorras indivíduos envolvidos com rinha de animais, mas deixamos à solta criminosos de alta periculosidade. Editamos leis que protegem, dão abrigo e até planos de saúde para cachorros e gatos e desprezamos e condenamos nossos idosos e nossos cidadãos a morrerem nas salas de espera dos hospitais.
Do mesmo modo colocamos na cadeia quem corta uma árvore enquanto deixamos livres conhecidos personagens, madeireiros, garimpeiros e outros profissionais da terra arrasada, ao mesmo tempo em que concedemos a liberdade e o passe livre àqueles que derrubam e incendeiam florestas inteiras, contaminam as águas brasileiras, exterminam nossos rios ou matam nossos indígenas. Nas cidades, multam e prendem quem apresenta carros fora do padrão exigido, enquanto, deixamos de lado quem mata no trânsito. Proibisse fumar em lugar fechado, enquanto o consumo de drogas rola solto em cada esquina. Cracolândias são permitidas, intocadas, onde a cada dia um miserável morre sob os olhos da sociedade, tudo isso em pleno centro de nossas principais cidades. Enquanto isso, quem busca saúde, obrigação constitucional do Estado, morre nas filas e sofre com o mais alto grau de descaso. É justamente nas altas esferas que essas contradições se mostram mais surpreendentes, revelando nosso pendor pelo ridículo, pelo perigoso, pelo incorreto e pelo inusitado.
Os tribunais não se avexam em condenar a anos de prisão quem furta um tubo de pasta de dentes, mas encontra o mesmo argumento jurídico para colocar em liberdade aqueles que desviam bilhões dos cofres públicos. No quesito discriminação, somos imbatíveis.
Aceitamos que se condene ao ridículo, enxovalhe a honra com cusparadas de desprezo, figuras avaliadas como sagradas e veneradas pela maioria dos brasileiros, enquanto repreendemos com falso moralismo, quem ousa fazer pilhérias sobre as ditas minorias. É justamente esse Brasil que é visto e notado do exterior.
Um país em que o comerciante trabalha protegido por grades para não ser assaltado mais uma vez, e em que os criminosos, quando apanhados, passam a receber dos contribuintes um soldo mensal maior do que o salário mínimo. Quem desejar ter uma pálida noção sobre o que os estrangeiros pensam de nós, basta ler a última cartilha distribuída pela Embaixada dos Estados Unidos aos seus cidadãos, alertando para os perigos do Brasil inzoneiro.
Primeiro de tudo, é preciso manter a discrição, permanecer em alerta sobre o entorno, principalmente em locais frequentados por turistas. Para tanto, é preciso que os americanos, que ousem vir para o Brasil, revejam seus planos de segurança. Todo o cuidado é pouco.
A frase que foi pronunciada:
“Viva o Brasil
Onde o ano inteiro
É primeiro de abril.”
Millôr Fernandes, escritor, jornalista, cartunista, humorista brasileiro.
Sem comunicação
Sobre o inexistente número telefônico do HRAN, nosso assíduo leitor Renato Prestes esclarece que os telefones dos Centros de Saúde de Brasília não recebem ligações há um ano e meio. Verdadeiro descaso e desrespeito com a população.
Coincidência
Enquanto ouvia a notícia de que havia planos para resgatar Marcola da cadeia em Brasília, e que o PCC comprou várias residências de luxo pelo DF, nosso leitor foi ultrapassado por um carro com a placa PCC0001 em direção aos Jardins Mangueiral, na saída da ponte JK.
HISTÓRIA DE BRASÍLIA
Realizou-se a passeata da fome à porta da Câmara dos Deputados. A chuva não atrapalhou. Sabe-se que em Brasília há fome, há desemprego, para os empregados, e há dificuldades para os empreiteiros. (Publicado em 14/12/1961)