Substituta de Deus

Publicado em Geral

 

 
Deus criou o céu e a Terra. Tudo pronto, povoou o planeta de homens, mulheres e crianças. Deu asas à imaginação. Variou a cor da pele, dos olhos e do cabelo. Não coincidiu altura nem peso. Personalidades também tiveram a marca da diferença. Introvertidos, extrovertidos, carrancudos, sorridentes, sérios, bem-humorados, mal-humorados — todos ganharam vez. O mundo se cobriu de cores, vozes e movimentos múltiplos e harmoniosos.

 
Ufa! No sétimo dia, o Senhor descansou. No oitavo, deu uma espiadinha no andar de baixo. Viu, então, o tamanho da obra. Sentiu medo. Como cuidar de tantos filhos? Pensou. Pensou. Pensou. A luz se fez. Ele inventou a mãe. A criatura desempenharia o papel divino. Estaria nos lugares onde o Criador não podia estar.

 
Ela superou as expectativas celestes. Tem o coração dessssssssssssssssste tamanho. Nele sempre cabe mais um, mais dois, mais mil. Zelosa, fica de olho nos rebentos. Emociona-se com o carinho dos outros. Quem lhe beija o filho lhe adoça a boca. A moçada corresponde. “Só existem duas opiniões”, dizem os gratos, “a da mãe e a errada.”
 

 
Mãe coruja

 
Para a mãezona, os garotões são os mais lindos, os mais perfeitos e os mais inteligentes do mundo. Por isso a chamam de mãe coruja. A designação vem da fábula “A águia e a coruja”, de La Fontaine. Conhece? As duas aves celebraram um tratado de paz. A primeira prometeu não devorar os filhotes da segunda. Como não os conhecia, pediu uma descrição segura:

— Nada mais fácil que identificá-los, disse a coruja. Basta prestar atenção na beleza. São os filhotes mais lindos, mais encantadores, mais elegantes, mais cheios de sedução entre os bichos de penas existentes na Terra.

Dias depois, a águia viu uns mostrengos no ninho. Não poderiam ser os filhos da outra, claro. Devorou-os. A coruja, desconsolada, foi tomar satisfação.

— Não culpe senão a você, respondeu a comilona. Aqueles feiosos assustavam. Longe estavam da descrição feita por você.

Moral da história: o belo, para o sapo, é a sapa.