Não é nossa responsabilidade pagar a conta do INSS

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Há uma infeliz coincidência entre a necessidade de rever o sistema de seguridade social, a falência do principio atuarial e a tentativa de fazer que essa, e as outras gerações, paguem a conta pelo mau planejamento na aplicação e enriquecimento do dinheiro de quem contribuiu a vida inteira

Alexandre Damásio*

Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial/ IBRE/ FGV, o comércio informal movimentou em 2015, R$ 957 bi; algo em torno de 16% do PIB; pesquisas do IBGE apontam que o desemprego no primeiro trimestre de 2016 aumentou 11,2% e foram fechados, no mesmo período, aproximadamente 14 mil empresas só no setor de supermercados, alimentos e bebidas. Também segundo o IBGE a expectativa de vida em Santa Catarina beira os 80 anos, no Acre é de 73,6 anos e no Maranhão em torno de 70 anos. O número de consumidores brasileiros com contas em atraso chegou 58,7 milhões em todo o país e entre fevereiro e março de 2016 cerca de 700 mil devedores foram negativados – isso representa 39,64% da população entre 18 e 75 anos, segundo dados do SPCBrasil/CNDL.

Dados colhidos no Boletim Estatístico da Previdência Social nos mostra que no Acre foram solicitados, percentualmente, 0,13% do total de benefícios de aposentadoria enquanto São Paulo concentra 24,05% dos pedidos só em 2016.

Mas, ninguém lembrou que a Previdência Social é “o seguro social para a pessoa que contribui”. É uma instituição pública que tem como objetivo reconhecer e conceder direitos aos seus segurados e que a renda transferida pela Previdência Social é utilizada para substituir a renda do trabalhador contribuinte, quando ele perde a capacidade de trabalho, seja pela doença, invalidez, idade avançada, morte e desemprego involuntário, ou mesmo a maternidade e a reclusão.” Nasceu da fusão, lá nos idos de 1960, dos IAP’s- Institutos de Aposentadoria e Previdência das classes profissionais e que o Sistema de seguridade, resultante dos IAP’s deveria ser um sistema atuarial: o contribuinte efetua um depósito para o INSS, e o sistema de seguridade aplica o dinheiro devolvendo-o atualizado na aposentadoria.

E então, desconhecendo tudo isso, o Governo envia uma reforma da Previdência Social ao Congresso que objetivamente demonstra o seguinte: o Estado recolheu direta e indiretamente uma contribuição obrigatória de quem trabalha para devolvê-la quando ele (contribuinte do INSS) parasse de trabalhar; gastou o dinheiro do contribuinte com outras coisas e agora tem que entregar para quem contribuiu o valor corrigido e atualizado de tudo que ele já recebeu: não tem o dinheiro porque gastou e precisa que as próximas gerações paguem quem já parou de trabalhar.

É a descaracterização do instituto de seguridade social e a instituição de um regime de Assunção de Dívida da Previdência Social, ou seja, o terceiro (contribuinte do INSS) se obriga perante o credor (aposentado) a efetuar a prestação devida por outrem (INSS) sem direito de regresso (contra o INSS) e no caso brasileiro, sem qualquer poder de opção.

A Previdência Social é um mecanismo pouco inteligente por que parece assistencialismo, é reflexo de uma política pública concentradora em um governo central: a União, a qual por ser o grande ente arrecadador justifica sua parte de arrecadação com a manutenção da “gerência” da Previdência Social, devíamos imaginar uma agência reguladora descentralizada em que a receita seja condicionada a uma arrecadação daqui por diante, com um repasse para a velha previdência somente para o pagamento dos benefícios atuais.

Discute-se um sistema que as receitas são procedentes de diversos “pagadores”. São receitas da Previdência Social àquelas definidas em Lei para cobertura das despesas correntes e de capital da Seguridade Social, provenientes de contribuições e de outras receitas; receitas arrecadadas diretamente pela Previdência Social, oriundas de contribuições de empresas, empregadores domésticos, segurados, inclusive domésticos, e contribuintes individuais; receita patrimonial dos aluguéis, arrendamentos, juros, taxas de ocupação de imóveis, juros de títulos de rendas, dividendos e outras receitas provenientes de aplicações do patrimônio da Entidade; outras tantas que couberem na rubrica de receitas correntes: referentes a serviços administrativos, multas e juros previstos em contrato, atualizações monetárias, indenizações, restituições, receita de dívida ativa e outras; receitas provenientes de alienação ou resgate de bens móveis, bem como alienação de títulos mobiliários, amortização de empréstimos e repasse de capital, e coroando tudo isso os repasses da União- recursos adicionais do Orçamento Fiscal, fixados obrigatoriamente na lei orçamentária.

Ou seja, descabido e insensível aumentar o tempo de contribuição num universo em que a expectativa de vida é tão diferente entre as regiões do país, em um momento em que o mercado não possui estabilidade para arrecadação, seja pela quantidade de desempregados, seja pelo fechamento das empresas, num momento em que não há segurança social para planejarmos a seguridade social; há uma infeliz coincidência entre a necessidade de rever o sistema de seguridade social, a falência do principio atuarial e a tentativa de fazer que essa, e as outras gerações, paguem a conta pelo mau planejamento na aplicação e enriquecimento do dinheiro de quem contribuiu a vida inteira.

*Alexandre Damásio é diretor jurídico da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado de São Paulo- FDCLESP e especialista em Direito Autoral pela Universidade de Brasília e em Direito Público pela ESA-OAB/SP