Vacinação de quilombolas, que deveria ser prioritária, caminha a passos lentos

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Apesar de ser considerado grupo prioritário, ritmo de imunização segue aquém do necessário devido a lacunas no Plano de Operacionalização para quilombos. Cerca de 45% da populaçãoestá vacinada com as duas doses

Apesar de considerado grupo prioritário no plano de vacinação contra covid-19, ritmo de imunização de quilombolas segue aquém do necessário, com cerca de 45% da população vacinada com as duas doses. Em termos de comparação, 45% da população geral, acima dos 12 anos – parcela prevista para receber o imunizante -, já recebeu a segunda dose da vacina na data de encerramento deste levantamento. Os indígenas, outro grupo prioritário, por exemplo, já tem 81% da população com duas doses da vacina, segundo informações do governo federal.

Essa morosidade pode ser atribuída a uma série de lacunas no Plano de Operacionalização para vacinação de quilombolas, apresentado pelo governo em março, e pela falta de conhecimento das realidades dos quilombos por parte do Estado – inclusive pela falta de dados populacionais de quilombolas no Brasil, uma vez que ainda não há um Censo Demográfico que considere essa população. Em razão dessa morosidade, em muitos casos quilombolas foram vacinados pela faixa etária, dentro da campanha de vacinação voltada à população em geral.
Essas informações são apresentadas na segunda edição do Vacinômetro Quilombola, organizado pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Terra de Direitos e Ecam Projetos Sociais.

O levantamento mapeou 565 quilombos em 24 estados, totalizando mais de 200 mil quilombolas.
“Apenas 11% dos quilombos contavam estar com a população 100% imunizada. É um número extremamente baixo que sentencia todo um grupo social. De acordo com o levantamento Quilombos em Covid, 299 quilombolas foram a óbito por conta do coronavírus.

Essa é a ponta do iceberg do problema que reflete a falta de políticas públicas, como acesso à saúde e saneamento, que acomete a grande maioria dos quilombos no país”, alerta Katia Penha, coordenadora nacional da Conaq e da rede de levantamento da vacinação quilombola.

Segundo os dados do levantamento, um terço dos quilombos apresentou algum problema referente à vacinação. Entre os principais problemas, 47 quilombos registraram dificuldades na execução da vacinação por motivos de infraestrutura, dificuldade de acesso ao local de vacinação, problemas no levantamento realizado pelo município ou por falta de informações adequadas.

O reconhecimento pelo poder público da identidade quilombola ou do direito à vacinação prioritária foi mapeada em oito quilombos. Em 10 quilombos foram registrados casos de pessoas não quilombolas que tentaram se vacinar pelo grupo prioritário.

“O Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 em comunidades quilombolas, proposto pelo governo, estimou a população quilombola pelos dados do Censo 2010 que não teve um levantamento específico do tema. Os municípios que não estavam identificados nessa lista prévia não receberam vacinas destinadas a esse público prioritário. Nesses casos, as lideranças precisaram acionar o município e o Estado para garantir o fornecimento das vacinas e, com isso, o início do processo de imunização no quilombo atrasou”, explica Katia.

Para ela, ajustes no processo são necessários para garantir a imunização dos quilombolas com a terceira dose, recomendada para imunossuprimidos e pessoas acima de 70 anos, bem como de adolescentes e jovens, incluídos no plano de vacinação.

Inclusão de jovens
A inclusão de quilombolas como grupo prioritário para a imunização contra a Covid-19 é uma das conquistas alcançadas na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 742. Protocolada pela Conaq junto a cinco partidos políticos em setembro de 2020, a ADPF destacou a omissão do governo no combate à pandemia entre os quilombos. Em fevereiro deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou a ação e determinou uma série de medidas.

Agora, a Conaq luta para que jovens quilombolas entre 12 e 17 anos sejam incluídos no grupo prioritário de vacinação. O pedido foi feito em uma nova manifestação da ADPF 742, apresentada no dia 29 de setembro.
Até o momento, a perspectiva é que esse público seja vacinado pela faixa etária, dentro da campanha geral de vacinação.

A Conaq, no entanto, alerta que a vacinação de jovens quilombolas têm especificidades que devem ser consideradas, inclusive a dificuldade de deslocamento daqueles que moram nas comunidades rurais.
Além disso, a Conaq também pede que municípios informem sobre a aplicação das vacinas em quilombolas, e que dados disponibilizados no Painel Vacinômetro SUS Quilombola sejam uniformizados para melhor controle.