No recesso do Legislativo, servidores farão força-tarefa

Publicado em Servidor

Diante das restrições orçamentárias e da urgência de o governo apertar o cinto e fechar as contas, as saídas para conter os gastos têm sido reduzir despesas com a folha de pagamento, restringir concursos públicos, baixar o piso salarial e dificultar a ascensão profissional do funcionalismo, entre outras

A fórmula agradou investidores e mercado financeiro. Aos servidores, em todo o Brasil, causou indignação. Nesse contexto, a corrida para manter direitos e benefícios tomou novo rumo. Se depender dos servidores, esse ano, não vai ter, na prática, recesso parlamentar. A estratégia da maioria das carreiras, da base ou do topo da pirâmide, é não deixar os políticos descansarem no período em que o Poder Legislativo não funciona, entre 17 de julho e 1º de agosto. Uma força-tarefa está em gestação para evitar surpresas desagradáveis em 2019.

Em ano atípico de Copa do Mundo e de mudanças estruturais na administração federal, eles aproveitarão o período para apresentar projetos técnicos e fundamentados e pressionar, ou conscientizar, os concorrentes à reeleição e principalmente os que se candidatam pela primeira vez. “Sempre nos aproximamos do Congresso. Mas esse ano não vai ter trégua. Vamos, como nunca, arregaçar as mangas nesses menos de 90 dias para as eleições”, destacou Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), que representa 80% do funcionalismo. A definição da metodologia específica de acesso, em 2018, aos políticos está sendo alinhava em reuniões com entidades filiadas.

Mas alguns pontos da pauta são unanimidade, como um novo projeto com normas gerais para a negociação coletiva no setor público – o PL 3831/2015, após aprovado pela Câmara, foi totalmente vetado pelo presidente da República no início do ano. Além de instituição de data-base de correção anual da remuneração dos servidores (pela Constituição deveria ser 1º de janeiro) e revogação da Emenda Constitucional 95, que estabeleceu o teto dos gastos e congelou investimentos por 20 anos, segundo Silva. “Estamos também de olho no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO 2019). Pelo texto, o servidor tem zero direito. E vamos continuar exigindo debate mais amplo da reforma da Previdência que certamente entrará na pauta, em 2019”.

Sangue azul

A maior preocupação das carreiras de Estado é com a perda do poder de compra e os impactos negativos desse fator na atração futura de pessoal suficientemente qualificado para atender as exigências do próprio mercado – que torce por redução de gastos – e da população que depende do serviço público. Além da pressão para correção salarial, o período de recesso será também aproveitado para explicar aos agentes dos setores financeiro e produtivo sobre a complexidade do trabalho dessas classes específicas e em que medida se pode melhorar a relação delas com o público externo.

“Se for separar por nível de prioridade, o que tem causado mais aflição é a possibilidade de o governo não honrar a parcela de reajustes em 2019. É um assunto que tem que ser vigiado em tempo integral, antes, durante e depois do recesso”, apontou Florisvaldo Gonçalves, presidente do Sindicato Nacional dos Servidores da Comissão de Valores Mobiliários (SindCVM). Embora o relator da Comissão Mista de Orçamento (CMO), senador Dalírio Beber (PSDB-SC), tenha divulgado que os reajustes salariais programados serão mantidos, grande parte das carreiras não confia totalmente na promessa e não abre mão do contato direto com os parlamentares para expor os riscos.

A reforma administrativa, iniciada durante a gestão de Dyogo Oliveira à frente do Ministério do Planejamento, é outra angústia. “A redução do salário inicial para cerca de R$ 5 mil vai promover a juniorização do serviço público”, segundo Gonçalves. “Quem entra hoje para a CVM é sênior, com faixa etária média de 40 anos, justamente por conta da remuneração. Sem ela, a tendência é de os cargos serem ocupados por recém-formados”, lamentou. Na área de regulação, a preocupação com a compreensão das tarefas técnicas pelos políticos é ainda maior. Desde janeiro, em várias assembleias, foram sendo engendradas estratégias abrangentes para a abordagem de políticos tradicionais, iniciantes e pré-candidatos às eleições 2018.

“Nem os parlamentares mais antigos, nem os presidenciáveis, que poderão vir a dirigir o país, entendem do setor de regulação. Muitas vezes, cometem equívocos por falta de conhecimento. É compreensível que isso aconteça, porque a área é muito técnica.Mas depois de nossa proposta de conscientização, a coisa vem mudando, para a nossa felicidade. Ultimamente, fomos procurados pelas equipes dos pré-candidatos Jair Bolsonaro e Ciro Gomes”, contou Alexnaldo Queiroz de Jesus, presidente do Sindicato Nacional das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências).

O Sinagências defende, ainda, a autonomia financeira das agências. “É importante que cada uma delas tenha um tributo, uma taxa a arrecadar. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), por exemplo, não tem nenhuma. A Agência Nacional de Saúde (ANS) tem sérios problemas de ingerência política, o que causa assimetria de informações e insegurança jurídica. O Brasil precisa de uma atualização do modelo. Por isso, nossa reivindicação não é só por campanha salarial,. Envolve clareza de dados. O recesso é o melhor momento para explicar ao governo e a CMO que é fundamental abrir o diálogo com o servidor e absorver a ideia de que não se trata apenas de números. O país não pode se fechar uma conta de limite e deixar de executar as tarefas que a sociedade precisa”, afirmou.

Outras categorias fazem gestões em separado no Congresso. O Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) tem como meta a regulamentação do bônus de eficiência, um extra de R$ 3 mil mensais além dos salários – e de R$ 1,8 mil para a outra categoria do Fisco, os analistas tributários. De acordo com Cláudio Damasceno, em conversa com o presidente da câmara, deputado Rodrigo Maia, houve o acerto de que a greve da categoria que já dura três anos seria suspensa para que as conversas sobre o assunto avançassem. “Ele fez essa sugestão. E realmente disse que vai conversar com os seus pares. Mas ainda não temos nada conclusivo”, destacou Damasceno. Segundo fontes no Congresso, no entanto, a promessa de Maia foi aproveitar o recesso para diminuir a resistência dos parlamentares que são contra a regulamentação.