Marina Silva: tropeço na contagem de tempo

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“Hoje, fazem 50 anos da edição do AI-5, o início dos anos mais violentos da ditadura”, postou Marina Silva no Twitter. Seguidores da ex-senadora estranharam a flexão do verbo fazer. Com razão. Ao exprimir fenômeno da natureza ou contagem de tempo, fazer não tem sujeito. É impessoal. Só se conjuga na 3ª pessoa do singular: Faz frio no inverno. Neste verão, faz mais calor que habitualmente. Faz cinco anos que moro aqui. Faz duas horas que cheguei. Hoje, faz 50 anos da edição do AI-5, o início dos anos mais violentos da ditadura.

Outros verbos impessoais

  1. os que indicam fenômenos da natureza (chover, gear, nevar, alvorecer, anoitecer, ventar, trovejar): Choveu a noite toda. Em Santa Catarina, neva no inverno. Em Brasília, amanhece às 5h. A que horas anoitece no deserto do Saara? Troveja quando ocorrem tempestades tropicais.
  2. haver no sentido de existir, ocorrer ou de contagem de tempo: Cheguei há duas horas. A aula começou há pouco. Não houve distúrbios nas últimas eleições. Havia duas pessoas ali sentadas.
  3. ser e estar com referência a tempo: Está frio. É cedo.

Contágio

A impessoalidade é contagiosa. Os auxiliares dos sem-sujeito são também impessoais: Faz duas horas que cheguei aqui. (Deve fazer duas horas que cheguei aqui. Vai fazer duas horas que cheguei aqui.) Houve distúrbios nas manifestações. (Talvez tenha havido distúrbios nas manifestações. Vai haver distúrbios nas manifestações. Pode haver distúrbios nas manifestações. Deve haver distúrbios nas manifestações.)

Olho vivo! Vivíssimo!

O verbo impessoal detesta a solidão. De vez em quando, busca companhia. Arranja um sujeito e se torna pessoal. Resultado: flexiona-se como os demais: Amanheci pra lá de bem-humorada. E vocês, amanheceram bem? Na discussão, choveram impropérios. Nossa alma anoitece com a notícia.