Sinais do céu

Publicado em Crônicas

 

Severino Francisco

 

Há dois anos, fui de carro com minha mulher para fazer umas compras na Asa Norte. Tudo estava tranquilo, mas, de repente, caiu um temporal tão intenso que, mesmo com limpador de para-brisa ligado, era difícil enxergar qualquer coisa a poucos metros de distância. Em um átimo, nos sentimos acuados pela tempestade.

 

Felizmente, aos poucos, tudo foi serenando e seguimos viagem de volta à casa. No entanto, a sensação de desamparo se reaviva com as notícias de temporais que assolam o cerrado. Em muitas cidades do Brasil, a chuva é sinônimo de drama, mas durante muito tempo, não era no Plano Piloto.

 

No entanto, nas últimas décadas, o Plano Piloto também perdeu esse privilégio. Os engenheiros apontam as causas: sistema de escoamento deficiente, ausência de reparos nas tesourinhas, acúmulo de lixo nas bocas de lobo e adensamento das construções com vedação do solo, o que dificulta o escoamento da água. A inundação de garagens na Asa Norte tornou-se uma cena recorrente no período das chuvas.

 

Mas o temporal que se abateu sobre o Plano Piloto na terça-feira teve características diferentes. Fiquei impressionado com as imagens de algumas quadras: parece que havia passado um furacão. As árvores ficaram reviradas, destroçadas e amontoadas. Os ventos alcançaram a velocidade de 70km por hora. Não sou mais tão magro, mas se estivesse na rua, ele me levava.

 

Na 308 Norte, uma árvore tombou sobre o prédio, resvalou e chegou a invadir a janela de um apartamento. No Parque da Cidade, uma tenda para testes sobre a covid-19 se desfigurou com a ferragem toda retorcida. Na 504 Norte, um ficus caiu e levou junto a calçada sobre a qual fincara as raízes. O Corpo de Bombeiros atendeu 52 chamadas sobre ocorrências de quedas de árvores.

 

Foi também um dia em que 1.526 raios riscaram o céu de Brasília. Há vários aspectos a considerar. O meu sogro, o doutor Guarany Cabral de Lavor, foi chefe do Setor de Podas e Erradicação da Novacap. Tratava as plantas com tamanho cuidado que ganhou dos colegas o apelido de “Pai das árvores.”

 

Contudo, ele tinha o realismo de sertanejo cearense: quando uma árvore representava perigo, não tinha dúvidas em ordenar que fosse cortada. Dizia que muitas precisavam ser erradicadas, no entanto, não havia pessoal suficiente para atender a toda a demanda. E, realmente, vimos que muitas árvores estavam com as raízes comprometidas.

 

Em estudo sobre as árvores plantadas nas superquadras do Plano Piloto, elaborado a partir de sua observação, ele alertava que algumas espécies eram inadequadas. Além disso tudo, há o problema das alterações no clima, no regime das chuvas e nos ventos.

 

Agora, especialistas explicaram que a causa seria o resfriamento da superfície das águas do Oceano Pacífico. Isso altera a pressão atmosférica e favorece a incidência de tempestades no Sudeste e no Centro-Oeste. Os cientistas tem alertado que o número de furacões aumentou em vários pontos do planeta nas últimas décadas.

 

A solução de alguns problemas depende da administração de nosso quintal brasiliense. E outra parte envolve políticas ambientais mais amplas. Existe algo a fazer além de rezar? É preciso votar em governantes que tenham compromissos com o meio ambiente. Acho que deveríamos prestar mais atenção, a natureza está nos mandando sinais.

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