Negacionismo é burrice

Publicado em Crônicas

 

Severino Francisco

 

Parece que, em face da irresponsabilidade de parte da população com as medidas de proteção contra a pandemia, os governantes responsáveis perderam a paciência. O prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, declarou, em entrevista, que “quem não vacinar é negacionista, idiota e burro”. Na mesma linha, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, esbravejou: “provocar festas e aglomerações que matam os outros é burrice, falta de compaixão e de empatia”.

 

Não sei se esse é o melhor método de persuasão, mas ao menos tem o mérito de colocar o tema em debate. De qualquer maneira, revela responsabilidade e coragem na gestão da pandemia. É uma atitude muito mais digna do que a do governador do Amazonas, que se acovardou com as manifestações desrazoadas contra as medidas de isolamento social. O resultado é o caos e a tragédia do Amazonas.

 

Quem não cometeu alguma desinteligência, atire a primeira pedra. Falo de cátedra, pois incorri em muitas por soberba, ignorância ou vaidade. E acho que essas razões valem para todos.

Mas o que está em jogo durante a pandemia é um fenômeno social e coletivo. Eu tenho a impressão de que este momento que vivemos será lembrado pelos historiadores como o período de um surto de deficit cognitivo do povo brasileiro inédito.

 

Não é inteligente fazer algo que prejudica os nossos interesses. E, no entanto, é isso que vemos a todo momento. Cidadãos apoiam excelências que solapam os seus direitos, são contra a educação, desinvestem na ciência, destroem nossas florestas e não defendem as suas vidas.

 

Como é que alguém pode confiar mais nas fake news de uma excelência que tem um currículo pífio do que em instituições científicas, como é o caso da Fiocruz ou do Instituto Butatan, com mais de 100 anos de credibilidade nacional e internacional? Como ficar do lado do coronavírus e ser contra a vacina, ficar do lado das fake news e ignorar a ciência, ficar do lado da morte e ser contra a vida?

 

O Instituto inglês Ipsos Mori pode nos dar uma pista sobre o que acontece no Brasil. Ele fez uma pesquisa sobre Os perigos da percepção em 32 países. De 2015 a 2018, o Brasil ocupou o topo dos seis primeiros lugares no ranking da ignorância. Esse é um ambiente é altamente favorável à proliferação do vírus das fake news pelas redes sociais.

 

A ignorância inseminada artificialmente viraliza e contamina milhões pelo zap. O negacionismo é a burrice comprovada cientificamente. No caso da pandemia, a recusa da vacina é uma asnice grave, pois causa a própria morte e a dos outros. As grandes corporações virtuais e as instituições da justiça não podem se omitir e deixar que esse delito permaneça um crime sem castigo.

 

Nunca o apelo de Nelson Rodrigues sobre o tema foi tão dramático quanto neste momento. Segundo o nosso profeta do óbvio, nós tivemos um gênio para pensar o sexo, Sigmundo Freud. E, também, um arguto pensador da economia, Marx. No entanto, falta um grande pensador da burrice, falta um filósofo genial que se debruce sobre o tema. Mesmo porque a burrice influi mais em nossa vida do que a economia e do que o sexo.

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