Crianças armadas

Publicado em Crônicas

Severino Francisco

Matéria de Pablo Giovanni, publicada no site do Correio, informa que um clube de tiro, localizado em Ponte Alta, no Gama, promove treinamento e torneios da modalidade para crianças e adolescentes, utilizando armas de pressão. Não é preciso recorrer a pesquisas para constatar que o culto às armas é uma campanha desastrosa, que só provoca tragédias.

Eu estava pensando em escrever sobre o fato quando explodiu uma série de notícias que se encadearam como as peças de um quebra-cabeças. Em Taguatinga Norte, uma tragédia se abateu sobre duas famílias. O policial aposentado Marcos Antonio Santos era proprietário de um imóvel, que alugava para os empresários Edson do Carmo e Warlison Rodrigues, pai e filho, donos de uma rede de padarias.

Em razão de um desentendimento sobre o aumento do aluguel, Marcos Antonio matou os dois empresários e, em seguida, se matou em um matagal. É sempre assim, uma pendência fútil, que poderia ser resolvida com uma conversa, se transformou em um acontecimento trágico. Isso acontece em todos os lugares, nas escolas, nos bares, nos campos de futebol ou nas discussões de trânsito.

Estamos importando o que os Estados Unidos têm de pior. A facilidade de acesso às armas enseja uma sociedade de psicopatas, que se diverte matando em série. No sábado, Payton Gendron, um jovem branco de 18 anos, invadiu um supermercado, com um fuzil AR-15 e matou 10 pessoas, em Buffalo (Nova York). Segundo os policiais norte-americanos, o caso seria de terrorismo doméstico provocado por ódio racial. É isso que nós queremos para as nossas crianças e para os nossos adolescentes.

No Brasil, nós temos um campo fértil para a violência, com os problemas provocados pelas desigualdades sociais. Nós temos assistido as nossas crianças e os nossos adolescentes se entregando aos atos mais bárbaros de violência nas escolas. Nesse cenário, é difícil acreditar que as instituições estão funcionando, principalmente, a Câmara dos Deputados, que tem deixado a boiada de despautérios passar com o maior servilismo e a mais inaceitável irresponsabilidade.

A alegação de que é preciso oferecer acesso às armas para os cidadãos se protegerem é falaciosa. Pelo contrário: essa proposta é um atestado da incompetência dos governantes para garantir a segurança pública. Ela é assegurada com policiamento e com cidadania.

Suas excelências devem atentar para o fato de que todos podem ser as primeiras vítimas do acesso indiscriminado às armas: os senhores, os seus filhos, os seus amigos e os colegas dos seus filhos nas escolas. Em vez de se ater a problemas reais, altas autoridades da República estão preocupadas com falsos problemas, como a segurança das urnas eletrônicas, que jamais registraram qualquer irregularidade.

Nossas crianças e nossos adolescentes não precisam de armas; precisam de livros, de escolas de qualidade, de hospitais públicos dignos, de acesso à tecnologia, de alimentação saudável, de emprego, de valores humanistas, de cultura da paz, de acesso à dimensão libertária da arte, de praticar esportes e de mestres que estimulem os seus talentos.

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