Está na pauta para julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) a ADI 5.355, que trata da inconstitucionalidade do art. 69 da Lei nº 11.440/06, que estabeleceu uma exceção à regra de licença para acompanhamento de cônjuge servidor público federal, quando houver o deslocamento do companheiro para outro local, inclusive no exterior
O artigo impede, na prática, a transferência remunerada de servidor público para acompanhar seu cônjuge no exterior em qualquer órgão ou entidade da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, para o desempenho de atribuições compatíveis, informam especialistas.
Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.355), o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em agosto de 2015, questionou o artigo 69 da Lei 11.440/2006, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores do Serviço Exterior Brasileiro (SEB), que inclui os diplomatas, oficiais de chancelaria e assistentes de chancelaria. O dispositivo acaba com o exercício provisório em unidades administrativas do Ministério das Relações Exteriores (MRE) no exterior para servidor público cônjuge, previsto no parágrafo 2º do artigo 84 da Lei 8.112/1997.
Segundo o advogado Willer Tomaz, do escritório Willer Tomaz Advogados Associados, ciente da necessidade natural de manutenção dos vínculos parentais, a Constituição Federal é clara em proteger a unidade, a coesão e o planejamento da célula familiar, sendo que essa proteção não depende da vontade discricionária e circunstancial do Estado.
“Se o próprio Estado, no seu interesse, envia o agente público para exercer funções em outro país, obviamente o cônjuge ou companheiro, quando ocupante de cargo público, terá o direito de acompanhar o consorte sem prejuízo da remuneração, devendo exercer no exterior outra função compatível com o cargo que ocupa”, informa.
“Aliás, é com base nesse princípio protetivo da instituição família que a Lei n. 8.112/90 defere ao servidor público civil da União, nas mesmas condições, a licença remunerada por motivo de afastamento do cônjuge, sendo forçoso concluir pela inconstitucionalidade do artigo 69 da Lei 11.440/2006, inclusive por violar o princípio constitucional da isonomia”, analisa o advogado.
Fellipe Dias, advogado especialista em direito administrativo e sócio da Dias, Lima e Cruz Advocacia, destaca que há duas modalidades de licença: a não remunerada, que ocorre caso o cônjuge não seja servidor público; e a remunerada, que ocorre caso ambos sejam servidores públicos.
“Nessa segunda opção, a remuneração ocorre com o exercício provisório por parte do cônjuge/companheiro acompanhante, desde que haja atividade compatível com o seu cargo e a ADI está justamente questionando a constitucionalidade de um artigo que vetou a aplicação dessa segunda forma de licença de acompanhamento no que tange a servidores do MRE. Isso significa dizer que, desde que, nos termos da Lei 11.440/06, o servidor público do MRE que tiver cônjuge servidor público, que for deslocado, somente poderá acompanhar seu companheiro por licença não remunerada”, explica Dias.
Para Fellipe Dias, essa situação representa verdadeira quebra de isonomia, estabelecendo somente para uma categoria restrita de servidores públicos um ônus que fere o princípio da segurança jurídica.
“Esse foi inclusive o parecer da PGR, que se manifestou favorável à ADI e, como consequência, pela inconstitucionalidade do art. 69 da Lei 11.440/06. Como estamos falando de implicações financeiras que atingem apenas uma categoria bem específica de servidores públicos, a questão econômico-financeira certamente não será um grande fator a considerar no julgamento da demanda. Acreditamos portanto haver chances reais de o julgamento concluir de forma semelhante ao disposto no parecer da PGR”, reforçou o especialista.
O advogado destaca ainda que, como consequência, a partir desse julgamento, pode ocorrer um número alto de solicitações de servidores do MRE de conversão das licenças não remuneradas em exercício provisório, e um aumento de gastos públicos do MRE com servidores que estejam enquadrados nessa situação.
Foto: Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados