Por Adriana Izel e Vinicius Nader
Amor e sorte são dois desejos comuns, especialmente nos dias de hoje. Por isso, não é de se estranhar que justamente seja este — Amor e sorte — o título da série em quatro episódios que a Globo estreia na terça-feira. A atração tem elenco estelar, que inclui Lázaro Ramos, Fernanda Montenegro, Emilio Dantas e Caio Blat, entre outros, e usa como pano de fundo o momento da pandemia que enfrentamos atualmente.
A ideia veio de Jorge Furtado, que estava preocupado em se manter criando mesmo fazendo parte da “arte, que é a mais coletiva de todas, o audiovisual” e “em como manter atores contracenando em segurança.” A solução foi apostar em atores que já estavam isolados juntos, por serem casados ou parentes, e ensiná-los, remotamente, a operar toda a parte técnica — da câmera ao som, passando por fotografia e cenário. “O maior critério foi não ter risco para eles. Só funcionaria os atores fazendo tudo, e a gente estando remoto. O público não vai sentir falta de nada”, garante Furtado, em coletiva de imprensa, realizada on-line, naturalmente.
Dessa forma, nasceram os episódios de Amor e sorte: o primeiro a ser exibido é Gilda e Lúcia, de Antônio Prata, Jorge Furtado, Chico Mattoso e Fernanda Torres, com Fernanda Torres e Fernanda Montenegro; Linha de raciocínio, de Alexandre Machado, com Taís Araújo e Lázaro Ramos, previsto para o dia 15; Territórios, de Adriana Falcão e Jô Abdu, com Fabiula Nascimento e Emilio Dantas, que passará no dia 22; e A beleza salvará o mundo, de Jorge Furtado, Caio Blat e Luísa Arraes, com Caio e Luísa, que encerra a série em 29 de setembro. Em comum, os quatro programas têm a pandemia como pano de fundo e o humor sempre presente.
“O humor pode falar de tudo”, afirma Jorge. “Rir de nós mesmos, até em situações extremas como essa, foi marcante e vai ficar na memória de todos nós pessoal e profissionalmente”, completa Alexandre Machado. Para Adriana Falcão, não foi fácil optar pelo riso: “Não é fácil fazer humor partindo de um momento tão triste, com gente morrendo. É claro que a gente levou leveza ao texto, mas tinha que deixar uma carga de emoção ali. Ter que pensar algo de leve para o casal de personagens me ensina a tentar levar leveza para a vida.”
No único episódio em que o protagonismo não é de casais, Lúcia e Gilda traz Fernanda Montenegro e Fernanda Torres mostrando uma conturbada relação entre mãe e filha, que vai passando por mudanças durante a quarentena. A filha precisa atravessar o oceano de volta ao Brasil para fazer com que a mãe cumpra o isolamento social. Nessa reunião obrigada, elas resolvem questões do passado e experimentam as transformações a partir da convivência.
A premissa da história era mostrar uma mãe que esconde da filha a chegada da vacina para que a convivência delas não chegue ao fim. No entanto, mudou a partir das ideias de Antônio Prata e Chico Mattoso, roteiristas ao lado de Jorge Bispo e Fernanda Torres. Assim, veio a problemática da relação das duas. “A gente tinha essa premissa e ficamos nessa conversa tentando descobrir mais. Sabíamos que tinham feridas abertas nessa relação. E queríamos mostrar como isso nasceu, quais eram os contrastes entre essas duas mulheres”, explica Mattoso.
Montenegro vive a mãe descolada, que foi jovem na década de 1960 e viu a revolução dos costumes, enquanto Torres interpreta a filha mais careta e mais dedicada à vida empresarial. “Era muito difícil levar um episódio inteiro com a primeira ideia, mas eles criaram uma coisa muito boa. Esse conflito entre elas é o que dá caldo para o episódio. São dois mundos antagônicos e que não se falam. Uma desconhece o mundo da outra e nem concorda, mas são obrigadas a conviver através dessa relação de mãe e filha”, comenta Fernanda Torres.
Apesar de ser uma história que poderia seguir pelo drama, a opção foi de caminhar pelo humor. “O humor traz um raciocínio em cima da dor. Isso te leva a uma ação, a sair da toca e da dor. Ir em frente, adiante. Acho que, talvez, no momento, seja isso que esteja faltando. Estamos num momento muito difícil. O humor é mais do que uma defesa, é uma arma sadia”, completa Fernanda Montenegro.
Em Linha de raciocínio, Tábata (Taís Araújo) e Cadu (Lázaro Ramos) vivem um casal que está à flor da pele por causa da pandemia e acaba deixando que isso afete de alguma forma a relação deles. “A personagem é uma montanha-russa de sentimentos e eu estava justamente assim quando gravamos”, conta Taís. Lázaro também se identificou com Cadu, que queria resolver tudo para todo mundo e cuidar dos familiares e dos amigos ao mesmo tempo. A experiência, conta Lázaro, uniu o casal. “Nunca nos conhecemos tão bem. Tanto nossas qualidades quanto nossas fortalezas”, explica.
Para dar conta da parte técnica, a produção enviou à casa dos atores 17 vídeos tutoriais “muito longos e importantíssimos”, segundo Taís, que confessa ter tido dificuldade com as muitas cenas de câmera na mão, devido ao peso do equipamento.
“Minha primeira reação foi topar. Depois, veio a consciência do que seria o trabalho. Eu questionava o prazo: será que vai dar tempo? Chamei por Jesus várias vezes (risos), mas o prazer de estar ali fazendo me alimentava”, completa Lázaro.
A beleza salvará o mundo será o segundo episódio a ir ao ar, mas foi o primeiro pensado por Jorge. “O mote do episódio é que ele é químico e ela, atriz. A ciência e a arte juntas podem salvar o mundo”, explica o autor, referindo-se aos personagens Manoel e Teresa. O casal se conhece, passa um fim de semana junto off-line e, quando acaba, descobre que ele não pode mais sair da casa dela.
“As pessoas estão trancadas em casa e precisam de arte para sobreviver. Ela realmente salva. É o amor e a sorte da série: é a sorte de estarmos, neste momento, ao lado de um amor. Se é ao lado de quem amamos, passamos por isso com mais facilidade. Acredito que as pessoas sozinhas estejam sofrendo mais”, reflete Caio.
Além de tudo o que os atores do projeto Amor e sorte tiveram que fazer, Caio e Luísa assinam o texto de A beleza salvará o mundo, ao lado de Jorge Furtado. “O Jorge mandou pra gente uma história já com começo, meio e fim e a gente foi improvisando e aumentando. Aí devolvíamos para ele e ele dizia o que faltava, fazia mais cenas”, lembra Luísa.
Estar à frente de tanta coisa ao mesmo tempo não foi bem uma novidade para Fabiula Nascimento, que estrela o episódio Territórios ao lado de Emilio Dantas. “Eu vim do teatro e exercitei bastante outras funções. Isso é mais comum no teatro. Lá, a gente joga em todas as posições”, explica a intérprete de Clara.
Na trama, Clara e Francisco são um casal que resolve se separar, mas é impedido por causa do isolamento social. “Foi um momento de a gente aprender mais sobre a gente e também sobre o nosso ofício. Eu sempre fui muito curioso e comecei a entender mais de coisas, como fotografia e direção de arte. Eu até continuaria a trabalhar com fotografia, mas remotamente”, afirma Emilio, aos risos.
A experiência de Amor e sorte acendeu na atriz uma certa vontade de dirigir. “Como o processo é intenso, vieram mais de mil vontades. Eu já até pensei em fazer um documentário sobre meus vizinhos, que são idosos e moram longe da cidade”, conta Fabiula.
Mas a experiência não foi tão fácil como pode parecer. “A gravação foi toda meio no susto, era tudo muito novo. A primeira cena que gravamos foi um choque. A gente não teve muito tempo para compor os personagens. Era muita coisa para fazer — set para montar e desmontar, luz, maquiagem, cenário. Então, os personagens têm muito da gente. O processo nos tornou novos atores, com outras nuances. Era tudo feito de maneira amadora. Mas, no real sentido da palavra, que vem de amar o que está sendo feito”, afirma a atriz.
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