Depois de um filme “interativo”, Bandersnatch, a franquia Black mirror chega à quinta temporada. Composta por três episódios, esta temporada foi anunciada como a mais otimista da antologia.
Até que o otimismo está presente em algum nível. Mas não é isso o que mais chama a atenção. É, sim, o fato de que Black mirror perdeu a essência. Nem parece aquela série que nos levava a questionamentos sobre o futuro e sobre a nossa relação com a tecnologia, ora necessária, ora nociva. De protagonista, a tecnologia passou a pano de fundo na série.
De certo, só a independência entre os episódios, o que faz de Black mirror uma antologia, e a irregularidade observada no conjunto da temporada, o que vem acompanhando Black mirror há algum tempo.
Striking vipers
Sem dúvida, o primeiro episódio é o mais fraco da temporada de Black mirror. Aqui, Danny ( Anthony Mackie) é um quarentão que adora relaxar jogando videogame com o amigo de infância Karl (Yahya Abdul-Mateen). Até aí nada demais, a não ser que Danny às vezes deixa o filho de lado para se dedicar ao lazer.
Quando Karl dá de presente a Danny um jogo que simula uma “realidade virtual” é que a discussão à la Black mirror tenta aparecer. O game é uma versão apimentada de um clássico do mundo nerd, Street fighter. Karl escolhe sempre a mesma personagem, uma moça, e Danny também repete o avatar de um rapaz oriental. Mas os golpes são logo substituídos por beijos, amassos e umas cositas más em algumas cenas bem calientes.
A discussão tecnológica logo dá vez a outras questões (tão importantes quanto), como amores líquidos, sexualidade, relacionamentos. Mas não era Black mirror? Pois é!
Smithereens
O segundo episódio é o melhor momento da temporada. O roteiro entrega um bom suspense que tem a tecnologia como pano de fundo, mais próximo do que esperamos de Black mirror. Chris (Andrew Scott) é um motorista de aplicativo atormentado por um fato do passado dele – mais tarde descobriremos o que é.
Estacionado na frente da Smithereens, uma gigante do ramo de aplicativos e plataformas de redes sociais, ele pega passageiros e, num interrogatório disfarçado de conversa agradável, tenta descobrir algo sobre a empresa e entrar em contato com o CEO da empresa.
Quando ele acha que está com a pessoa certa, ele sequestra um estagiário e, armado, exige falar com o tal CEO. O que será que ele quer com o empresário? Seja o que for, vale a vida do rapaz? Juntas, a polícia e a Smithereens usam a tecnologia para tentar dissuadir o homem ou salvar o refém com vida. Depois, de muito suspense e de boas viradas, o roteiro de Smithereens chega ao fim deixando a sensação de dever cumprido.
Rachel Jack e Ashley
Antes mesmo da estreia da temporada, esse era o episódio mais badalado de Black mirror. Isso ela presença da cantora e atriz Miley Cyrus no elenco, Como será que a eterna Hannah Montana se sairia numa produção da densidade da série da Netflix? Bem, densidade já sabemos que não é o forte da temporada.
Miley é (numa autoreferência?) a pop star Ashley O.. Ela canta e encanta uma série de jovens com músicas alegres, que têm letras que mais parecem ter saído de um livro de autoajuda barata. A peruca cor de rosa e a maquiagem alegre escondem uma jovem amargurada e triste, que teima em aparecer nos poucos momentos da vida em que ela está fora dos palcos e longe dos holofotes.
Uma das grandes fãs de Ashley é a jovem Jack (Madison Davenport), que pede ao pai uma boneca que e réplica da cantora. Réplica mesmo: o robô fala, canta, dá conselhos, responde e pensa como o molde. O que era para ser exatamente como o planejado sai do controle e Ashley, Jack e a irmã mais velha da menina, Rachel (Angourie Rice) acabam se envolvendo numa trama recheada de música pop e de um roteiro um tanto quanto raso e previsível.
O apuro visual tanto deste episódio quanto do primeiro merecem destaque, assim como as cenas pós-créditos que explicam a moral da história dessa grande fábula que se tornou Black mirror.
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